Ovar, Mealhada, Loulé e Torres Vedras. Quanto custa o Carnaval? Fomos perguntar e ninguém levou a mal
As autarquias investem milhares de euros no Carnaval. Mas o impacto económico na região compensa, dizem. Fomos perguntar quanto custa e quanto rende. Ninguém levou a mal.
Diz o ditado popular que no Carnaval ninguém leva a mal e tal parece aplicar-se tanto nas brincadeiras como nos investimentos. De norte a sul do país, os foliões vestem os seus melhores disfarces e saem à rua para celebrar aquela que é uma época de diversão e de extravagância. E as autarquias esticam orçamentos e investem milhares de euros para tornar isso possível.
“Em Ovar, as pessoas conhecem a importância deste investimento e não criticam”, conta ao ECO Salvador Malheiro, presidente da Câmara Municipal da cidade que tem um dos maiores orçamentos afetos às celebrações desta data. “Ninguém iria compreender era se a Câmara não fizesse uma festa à medida”.
Com quase um mês de celebrações — começam a 20 de janeiro e terminam a 13 de fevereiro –, dois mil figurantes e um milhão de visitantes, são canalizados para este Carnaval 700 mil euros — 240 mil para o apoio às escolas, 300 mil para a logística e 150 mil para a programação. Tudo para se montar uma festa que esgota bilhetes, mas que é “deficitária”, como aponta o autarca, sendo que o retorno é de apenas 300 mil euros. Ainda assim, não é por não ser lucrativa que vai desaparecer. “Vamos continuar a investir para fazer melhor”, remata Salvador Malheiro.
Fazer mais (e melhor) por menos
Entre os maiores carnavais do país, os foliões da Mealhada têm um orçamento mais apertado. Se em 2017, este era de 180 mil euros, o responsável da Associação do Carnaval da Bairrada, sem apontar números, diz que este ano o lema é fazer mais por menos. “Baixámos o orçamento, mas aumentámos a qualidade”, garante Alexandre Oliveira, responsável pela associação. Um terço deste montante é disponibilizado pela autarquia, enquanto o restante vem das vendas de bilheteira, do aluguer de espaços e de patrocínios.
"Baixámos o orçamento, mas aumentámos a qualidade.”
A tradição deste carnaval luso-brasileiro dita que o rei seja sempre uma figura brasileira bem conhecida da televisão. Desta vez, o trono vai ser ocupado pelo ator Vitor Hugo, ladeado pela atriz portuguesa Raquel Loureiro. Juntar-se-ão a estes 800 figurantes e, pelas contas dos organizadores, 25 a 30 mil pessoas para os verem desfilar.
Já em Loulé, a fatura desta festa pode atingir até 300 mil euros de investimento. Sim, investimento, porque a Câmara recusa-se a falar em custos. “Quando falamos nestes valores nunca falamos em custos, falamos em investimentos”, clarifica Carlos Carmo, vereador com o pelouro dos eventos e comunicação. “O investimento que é feito com o dinheiro do erário público tem sempre um lado associado que é o retorno, não para a autarquia, mas para a economia do concelho.”
Com a sátira política, desportiva e social a ser a essência desta festa, este ano, os foliões juntam-se à febre do empreendedorismo e abraçam o Web Summit como o tema principal. Porquê? “Primeiro, porque tudo o que está à nossa volta está ligado à tecnologia. Depois, por toda a polémica que envolveu não o evento propriamente dito, mas os eventos paralelos, nomeadamente o jantar do Panteão”, justifica o autarca.
Nesta festa onde não há rei nem rainha — porque “os reis do Carnaval são os foliões” –, Carlos Carmo convida o rei do empreendedorismo a juntar-se aos 100 mil visitantes esperados. “Se ele quiser estar presente, será muito bem-vindo”, aponta, referindo-se a Paddy Cosgrave, responsável pela maior cimeira de tecnologia e empreendedorismo do mundo.
Mascarar para combater a sazonalidade
No “Carnaval mais português de Portugal”, em Torres Vedras, os 2.200 figurantes têm de se fantasiar de acordo com o tema deste anos, os Mares e Oceanos. Este, que é apontado por muitos como o maior carnaval do país, conta com um pé-de-meia de 680 mil euros, em que 100 mil vêm da autarquia e os resto é gerado pela Promotorres, a associação organizadora.
“Nesta altura, tudo o que está disponível não só na cidade como na proximidade fica esgotado”, garante ao ECO César Costa, responsável pela Promotorres. Aliás, o impacto tornou-se palpável através de uma parceria com o Centro de Investigação Aplicada em Turismo do Instituto Politécnico de Leiria. Um estudo realizado por quatro investigadores durante três anos mediu a atividade económica no concelho e situou o impacto económico entre os 8 e os 9,5 milhões de euros. A organização apontava para um número 2,5 vezes mais baixo.
Também em Ovar, a festa “do povo vareiro para o povo vareiro” leva os hotéis a registarem uma taxa de ocupação de 100% e os turistas a procurarem alojamento nos concelhos vizinhos. “Tentamos fazer com que a festa vá além do fim de semana para que as pessoas queiram ficar mais tempo“, explica Salvador Malheiro. Tudo isto se traduz num impacto de 4 milhões de euros para a região, em números “conservadores”, caracteriza o autarca.
Para os louletanos, o Carnaval significa bem mais que números, visto que permite quebrar com a sazonalidade típica do Algarve. “Se estimamos que nos visitem milhares de pessoas, elas têm de comer, dormir, fazer as suas compras na cidade e isso traz um grande retorno económico para o concelho”, enumera Carlos Carmo. “Isso é uma vertente muito importante, principalmente numa época do ano que tradicionalmente não é uma altura de grande afluência a nível do turismo.”
"As receitas são repartidas em duas partes: metade é entregue aos grupos de animação que colaboram connosco e outra metade é entregue a várias IPSS do concelho.”
E ainda que as receitas da festa sejam para a autarquia, o dinheiro volta à população de uma forma solidária. “As receitas são repartidas em duas partes: metade é entregue aos grupos de animação que colaboram connosco e outra metade é entregue a várias IPSS do concelho“, acrescenta ainda o vereador da Câmara de Loulé, afirmando que no ano passado procederam assim com 65 mil euros. “Quanto mais for a receita, mais podemos reinvestir.”
A afluência de pessoas para o interior do país e a oportunidade de mostrar o que de melhor se faz aí e é também um dos grandes motivos pelos quais a Mealhada investe tanto dinheiro neste evento. “Traz muita gente e tem impacto no comércio local. O feedback que recebemos dos proprietários tem sido muito bom”, esclarece Alexandre Oliveira, afirmando que esta tendência se observa mais na restauração que na hotelaria.
O presidente da Câmara confirma: “Tem muita importância a nível da restauração, mas as pessoas não vêm para os hotéis”, diz Rui Marqueiro, autarca da Mealhada. “Mas como somos a capital do leitão, as pessoas aproveitam para provar nos restaurantes ou compram um e vão comer para o parque da cidade”.
"Tentamos fazer com que a festa vá além do fim de semana para que as pessoas queiram ficar mais tempo.”
Ainda assim, o sucesso das celebrações e o retorno económico está dependente de algo que ninguém consegue controlar, as condições climatéricas. “Quando o tempo está bom, a Câmara dá 60 mil euros à associação”, aponta Rui Marqueiro. “Quando o tempo está mau temos de ajudar mais.”
O Carnaval também está no centro das decisões
Para além de condicionar as contas e resultados das autarquias, as celebrações desta quadra tão exuberante condicionam também as decisões e os investimentos feitos pelas autarquias para que as condições para os foliões se divertirem sejam cada vez melhores.
“São mais de duas mil pessoas a trabalhar no Carnaval com muita dedicação e esforço; então temos vindo a apostar nas condições de trabalho”, conta Salvador Malheiro, autarca de Ovar. “Investimos cerca de 1,5 milhões de euros para construir a Aldeia do Carnaval que é um conjunto de pavilhões onde as escolas e os grupos se podem juntar para trabalhar e ultrapassar todos os desafios.”
"Investimos cerca de 1,5 milhões de euros para construir a Aldeia do Carnaval que é um conjunto de pavilhões onde as escolas e os grupos se podem juntar para trabalhar e ultrapassar todos os desafios.”
Na ideia do autarca está ainda a construção de uma infraestrutura que permita a saída do corso, mesmo quando as condições climatéricas não estão de feição. “Deve-se pensar a sério numa solução para não estarmos sempre dependentes do tempo”, aponta, considerando que o evento já tem a dimensão suficiente para que se invista numa infraestrutura coberta ou semicoberta. “A autarquia não pode investir sozinha, mas vamos tentar aceder a fundos comunitários e do Turismo do Centro para tal.”
Já no caso da Mealhada, havia um sambódromo, mas por decisão coletiva, o Carnaval voltou às ruas. “O Carnaval esteve durante 16 anos deslocado do centro, num sambódromo que tinha coisas boas e coisas más”, considera Alexandre Oliveira. “Eu e a minha equipa avançámos para as eleições da associação com a bandeira de o trazer de volta para o centro da cidade porque era o que 95% das pessoas queria.” E ganharam.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Ovar, Mealhada, Loulé e Torres Vedras. Quanto custa o Carnaval? Fomos perguntar e ninguém levou a mal
{{ noCommentsLabel }}