Após o Reino Unido e a União Europeia terem chegado a um acordo em relação ao período de transição, a embaixadora sublinha os esforços feitos e a estabilidade alcançada.
A cinco meses de terminar a sua presença diplomática em Portugal, a embaixadora britânica em território nacional, Kirsty Hayes, falou ao ECO e fez um resumo destes quatro anos de diplomacia, comentou o acordo alcançado esta semana, que trará mais estabilidade aos cidadãos e empresas, e deixou ainda um alerta: Portugal tem de participar ativamente neste processo, para não ver a sua balança comercial afetada.
O que é que leva desta presença diplomática em Portugal?Tem sido uma altura extraordinária tanto para o Reino Unido, depois do nosso referendo, um momento tão histórico, quer para Portugal. É óbvio para mim que Portugal tem mudado muito durante o meu tempo aqui. Quando cheguei a economia passava por dificuldades e o ambiente no país era triste, até um pouco pessimista acerca do futuro. Hoje em dia é bem diferente, há um sentimento de grande otimismo, a economia está a crescer, ainda com alguns desafios, e o turismo está a crescer. Sobretudo, as pessoas parecem muito mais positivas e otimistas em relação ao futuro. Também eu estou muito otimista, porque é um país fantástico com um povo muito trabalhador e muito criativo.
A presença das empresas britânicas em Portugal também reflete esse otimismo?Absolutamente. Temos várias empresas representadas aqui em Portugal, grandes empresas e marcas mundiais, mas também temos pequenas empresas, especialmente na área das startups e da tecnologia. Há um movimento, tanto em Lisboa, como no Porto e em Braga, muito acolhedor para as empresas pequenas e há tantas explicações. Por exemplo, a relação entre Lisboa e Londres é muito simbiótica, há competição entre cidades, mas também há um sentido de que Londres está a ajudar Lisboa e vice-versa.
Os números de 2017 do INE apontam para uma diminuição dos turistas britânicos em Portugal. Estão a perder interesse?É pequena. É preciso lembrarmo-nos que o crescimento do turismo tem sido muito dramático nos últimos três anos, experienciámos uma taxa de crescimento de dois dígitos e no ano passado recebemos mais de três milhões de turistas. Houve uma pequena diminuição recentemente, talvez por causa das taxas de câmbios entre a libra e o euro. Mas Portugal continua a ser um país barato em comparação com outros países na Zona Euro, muito seguro, com um clima e pessoas fantásticas, comida e vinho muito bons.
E esta diminuição do peso britânico não se pode espelhar também ao investimento?"Quando cheguei a economia passava por dificuldades e o ambiente no país era triste, até um pouco pessimista acerca do futuro. Hoje em dia é bem diferente.”
Não, penso que não. Portugal continua a ser muito atrativo. É um lugar barato, com pessoas fantásticas, com um nível de inglês fantástico comparando com a maioria dos países da Zona Euro. E estamos a ver cada vez mais investidores britânicos que têm interesse em investir aqui.
A União Europeia e e Reino Unido chegaram a acordo sobre período de transição, fazendo desta uma saída gradual. O que é que isto significa?As equipas de negociadores do Reino Unido e da União Europeia conseguiram completar mais uma etapa muito importante no processo do Brexit, que dará às nossas empresas e aos nossos cidadãos tempo para introduzirem os novos mecanismos necessários, à medida que os termos da nossa futura parceria vão sendo clarificados.
O acordo agora alcançado resulta de um intenso trabalho de negociação ao longo de várias semanas, mas tal como em dezembro, para chegar a este ponto foi necessário fazer concessões de ambos os lados. Ainda assim, o acordo que conseguimos vai proteger a nossa cooperação económica e na área da segurança, tendo o Reino Unido conseguido cumprir vários dos seus objetivos.
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E quais são os desafios que se seguem e que vão afetar diretamente Portugal?"O acordo que conseguimos vai proteger a nossa cooperação económica e na área da segurança, tendo o Reino Unido conseguido cumprir vários dos seus objetivos.”
O acesso aos nossos mercados respetivos não vai sofrer alterações até 31 de dezembro de 2020, o que significa que os cidadãos e as empresas de Portugal e do Reino Unido poderão fazer planos para a sua vida após a nossa saída da União Europeia, com confiança.
Em relação às negociações propriamente ditas, é importante que as empresas se preparem para um novo mundo. Mas é especialmente importante para as empresas portuguesas, porque Portugal exporta muito mais para o Reino Unido do que o contrário, quase o dobro. Então é essencial que Portugal adote uma posição ativa dentro das negociações ao nível dos 27.
Em relação aos portugueses que estão no Reino Unido, é seguro dizer que não vão haver implicações em termos de direitos?Em termos de comunidade já residente no Reino Unido e os que cheguem até ao ponto da nossa saída, em março do próximo ano, estes poderão continuar a viver, a trabalhar, a receber os benefícios. Vai ser uma situação de continuidade.
E para os que quiserem entrar depois?"Os portugueses são pessoas incríveis e vamos continuar a receber os que possam ter um contributo positivo na nossa economia e na nossa vida em geral.”
É mais difícil definir a situação destas. A primeira-ministra May deixou já claro que vamos continuar a querer atrair os melhores e os mais talentosos. Temos beneficiado imenso com o contributo da comunidade portuguesa no Reino Unido, e claro que é muito bem-vinda. Mas vão haver diferenças, porque o movimento das pessoas foi um dos temas principais durante a campanha para o referendo. Para muitos britânicos é importante que o Reino Unido tenha controlo das fronteiras, mas isto não significa fechar as fronteiras. Os portugueses são pessoas incríveis e vamos continuar a receber os que possam ter um contributo positivo na nossa economia e na nossa vida em geral.
Para as empresas portuguesas, as oportunidades que encontram no Reino Unido continuam a ser as mesmas?É interessante que depois do referendo temos continuado a receber muitos investimentos e muito interesse para o futuro. Já falei com os maiores investidores portugueses e, no geral, não estão muito preocupados com esta situação. Há muitos fatores atraentes no Reino Unidos, a nossa estrutura de apoio, o nosso sistema regulatório claro e bem definido, o nosso sistema judicial e os nossos impostos baixos e previsíveis. Continuamos a ser o segundo destino mais importante para investimento estrangeiro, depois dos Estados Unidos. Mesmo assim, queremos ter clareza acerca do nosso acordo com a União Europeia para dar mais certezas às empresas.
Há umas semanas a The Economist escrevia que May não era uma 'dead woman walking', mas sim uma 'dead woman standing still'. O Governo britânico está estável ou chegou a um beco sem saída?É claro que o Brexit é um tema muito polémico, mas temos feito bons progressos. O Governo continua empenhado em conseguir um acordo positivo com a União Europeia mas também em reunir o país depois desta mudança, que é histórica. Mas realmente, olhando para o mundo em geral, não acho que o Governo britânico pareça especialmente instável. Temos uma grande tradição de estabilidade política e os nossos parceiros poderão continuar a contar com isso.
A conversa com a embaixadora Kirsty Hayes aconteceu à margem da primeira edição das EMB Talks, um evento organizado pela Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa.
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Kirsty Hayes: “Os cidadãos e as empresas portuguesas poderão fazer planos para a vida depois do Brexit”
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