Défice estrutural: Bruxelas disponível para rever regras
A Comissão Europeia está disponível para melhorar a metodologia dos indicadores estruturais. Aqueles de que os ministros dependem para saber se aplicam mais, ou menos, austeridade aos países.
A Comissão Europeia está disponível para rever as regras de cálculo do défice estrutural, sabe o ECO. O debate decorre em Bruxelas desde que oito países questionaram abertamente a metodologia, em março, e foi recuperado agora pelos ministros das Finanças de alguns países, no âmbito da apresentação dos planos orçamentais para 2017. Mário Centeno foi um deles.
Há meses que os peritos em contas públicas da Comissão Europeia e os dos 28 Estados-membros debatem em torno de um parafuso: qual é a melhor forma de estimar o PIB potencial? Mas acontece que este debate teórico e esotérico é, afinal, em torno do parafuso que faz toda a diferença no mecanismo da tomada de decisões que interferem diretamente com o dia-a-dia das famílias e das empresas europeias.
É deste indicador, não observável e apenas latente, que depende o apuramento do saldo estrutural (no caso português, um défice) e do esforço que se considera que o país está a fazer para equilibrar as contas. Ora, se o indicador disser que o esforço é curto, ou os contribuintes são chamados a pagar mais impostos, ou as despesas públicas sofrem um corte.
Ao que o ECO apurou, a Comissão está disponível para melhorar a forma de estimar estes indicadores, na sequência das queixas que têm sido formalmente apresentadas pelos países sobre a metodologia que está, ainda, em vigor. A pressão para mudar as regras aumentou ainda mais depois de ter sido revelado o acordo escondido entre Bruxelas e França para contornar as normas comunitárias orçamentais.
O drama de Portugal e dos outros sete. Ou serão já dez?
Portugal é um destes países descontentes com as regras: em março, juntamente com Itália, Espanha, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Eslovénia e Eslováquia assinou uma carta onde colocava em causa a racionalidade da metodologia em vigor. Os oito países reconheciam que a discussão deveria ser feita de forma mais ampla e aprofundada, mas pediram, desde logo, uma pequena alteração ao método de cálculo: que as projeções passassem a ser feitas na base de um horizonte de quatro anos, coincidente com o do Programa de Estabilidade, em vez de apenas dois anos.
Foi esta mesma questão — o horizonte temporal considerado para estimar o PIB potencial — que voltou a separar o ministro das Finanças português, Mário Centeno, da Comissão Europeia, no âmbito do esboço orçamental para 2017. Depois de uma carta de Pierre Moscovici e Valdis Dombrovskis com um pedido de esclarecimentos a Centeno, e da resposta do governante português, o assunto está a ser analisado.
Espera-se que a Comissão emita uma opinião formal a 16 deste mês, mas Pierre Moscovici, comissário para os assuntos Económicos e Financeiros, já adiantou que o OE2017 português está “conforme” as regras e que se tratará apenas de aferir se está “em risco de incumprimento” ou apenas “parcialmente conforme”.
Mas Portugal, e os outros sete países, parecem estar a ganhar apoiantes na luta contra a metodologia dos indicadores estruturais. Nas respostas do Chipre e da Finlândia aos pedidos de esclarecimento enviados pela Comissão no âmbito dos esboços orçamentais, os governos destes dois países também colocam em causa o cálculo dos indicadores estruturais que está a ser feito pela Comissão.
"Seria muito estranho que o Chipre, um top-performer a nível orçamental nos últimos anos, fosse penalizado pelos seus resultados aparentemente melhor do que o esperado, por causa de um cálculo enviesado do output gap.”
“Seria muito estranho que o Chipre, um top-performer a nível orçamental nos últimos anos, fosse penalizado pelos seus resultados aparentemente melhor do que o esperado, por causa de um cálculo enviesado do output gap“, lê-se na carta enviada pelo ministro das Finanças do Chipre, Harris Georgiades.
Já a Finlândia pede que os custos de curto prazo das reformas estruturais, bem como do investimento, não sejam contabilizados para efeitos do cumprimento das metas orçamentais, explicando que estas medidas aumentam o potencial de crescimento da economia, apesar de poderem penalizar os saldos no imediato.
A manifestação de descontentamento para com as regras feita em março pelos oito países esteve na base de um mandato atribuído à Comissão, mais tarde, em abril, para um debate aprofundado com os peritos das autoridades nacionais. O objetivo é encontrar formas de melhorar as regras.
Confrontada pelo ECO, fonte oficial da Comissão Europeia confirmou que, “no seguimento do mandato atribuído pelos ministro das Finanças na reunião informal do Ecofin, em abril, os peritos técnicos dos 28 Estados-membros e da Comissão continuam a explorar formas possíveis de melhorar a estimação do PIB potencial para todos os Estados-membros”. A mesma fonte adiantou que “o trabalho está em curso”, mas frisou que as regras que estão a ser atualmente aplicadas “foram aceites de comum acordo por todos os Estados-membros, nada menos do que para garantir que são todos tratados da mesma forma”.
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