Indústria automóvel enganou automobilistas portugueses em 1,6 mil milhões desde 2000
O estudo indica uma manipulação que abrangeu toda a indústria automóvel e que custou aos condutores europeus um extra de 149,6 mil milhões de euros nos últimos 18 anos.
A indústria automóvel enganou os automobilistas portugueses em 1,6 mil milhões de euros desde 2000, manipulando o real consumo dos veículos, segundo um estudo da Federação Europeia de Transportes e Ambiente (T&E) divulgado esta terça-feira.
O estudo, à escala europeia, indica uma manipulação que abrangeu toda a indústria automóvel e que custou aos condutores europeus um extra de 149,6 mil milhões de euros nos últimos 18 anos.
Só no ano passado, por causa dessa manipulação, os portugueses gastaram mais 264 milhões de euros em combustível extra. Vista à escala europeia, a manipulação ascendeu a um gasto extra de 23,4 mil milhões de euros, quase tanto quanto os portugueses tinham gastado no ano anterior em alimentação.
A federação tem como objetivo promover a nível da União Europeia (UE), mas também do resto do mundo, uma política sustentável de transportes, minimizando impactos nocivos para o meio ambiente e para a saúde e maximizando a eficiência dos recursos. É apoiada por 58 organizações de 26 países da Europa, incluindo as ambientalistas portuguesas ZERO e Quercus.
Nesta manipulação, de acordo com o estudo, os mais lesados foram os automobilistas alemães, com 36 mil milhões de euros desperdiçados desde 2000, seguidos dos britânicos (24,1 mil milhões), dos franceses (20,5 mil milhões), dos italianos (16,4 mil milhões) e dos espanhóis (12 mil milhões).
O que foi pago a mais pelos condutores portugueses desde 2000, 1,6 mil milhões de euros, é superior aos gastos totais das famílias portuguesas durante um ano em educação, nota a organização ambientalista ZERO.
A organização salienta que na leitura dos números, mais baixos, tem de se ter em conta que as emissões totais do transporte rodoviário de Portugal representam só cerca de 1,8% do setor na UE em 2016, e que o número de automóveis novos com grandes diferenças entre o que se diz que consomem e a realidade é menor em Portugal.
A T&E diz também que a diferença entre o desempenho de combustível no teste e na realidade passou de 09% em 2000 para 42% em 2016, principalmente porque fabricantes automóveis manipulam testes de laboratório, mas também por causa de novas tecnologias incorporadas, como o start-stop (o motor desliga quando o carro está parado), cujas economias de combustível são maiores em laboratório do que em estrada.
A manipulação dos testes de CO2 (dióxido de carbono), notam a ZERO e a Quercus, citando o estudo, tem também custos ambientais elevados. Desde 2000 levou à emissão de mais 264 milhões de toneladas, o equivalente às emissões anuais da Holanda e às emissões de Portugal num período de quatro anos.
Francisco Ferreira, presidente da Associação ZERO diz, citado num comunicado, que é fundamental “haver um enorme esforço de transparência e credibilização dos dados das emissões e metas do setor automóvel, responsável em Portugal por praticamente um quarto do total das emissões de gases com efeito de estufa”, para que se possa de facto chegar a 2050 com neutralidade carbónica (não produzir mais do que a natureza pode absorver).
A Quercus, também em comunicado, apela aos ministros do Ambiente e aos eurodeputados para que impeçam a indústria automóvel de continuar “a defraudar as regras”
E diz que a proposta da Comissão Europeia para reduzir as emissões de CO2 dos veículos ligeiros de passageiros e comerciais, depois de 2020, “é inadequada” e traduz-se “numa nova autorização para que a indústria automóvel mantenha o sistema de jogo”.
Greg Archer, da T&F, diz: “A afirmação pelos fabricantes automóveis de que fizeram um enorme progresso na melhoria do consumo de combustível é uma farsa. Apesar das regulamentações para reduzir as emissões, não houve melhoria real nas emissões de CO2 nos últimos cinco anos e apenas uma melhoria de 10% desde 2000”.
O estudo nota que quer a UE quer a indústria automóvel garantem que o novo teste de homologação para consumos e emissões, já em vigor (o WLTP – Worldwide Harmonised Light Vehicles Test Procedure), vai corrigir problemas, mas contrapõe que há estudos, um deles de uma instituição da própria Comissão Europeia, que dizem que o WLTP apenas introduz novas lacunas.
E alerta para a existência de medidas que podiam de forma eficaz prevenir as artimanhas da indústria automóvel, evitando 108 milhões de toneladas de CO2 equivalente até 2030, e poupando aos automobilistas 54 mil milhões de euros na fatura de combustível.
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