A Liga e os seus próximos desafios

  • João Fonseca
  • 29 Maio 2019

Planeamento, competitividade e digitalização para perspetivar os próximos quatro anos de Liga. Eleições são a 12 de junho.

Com o término da Liga é tempo do natural balanço mas, mais do que isso, é tempo de refletir e pensar no que pode ou deve ser melhorado.

Mais do que isso, e perspetivando o novo ciclo de quatro anos, também tendo em vista as próximas eleições marcadas para o dia 12 de junho, a Liga tem pela frente um vasto número de desafios. O próximo presidente dificilmente poderá pôr de parte três pilares que considero essenciais para o desenvolvimento do futebol português:

  • Planeamento
  • Competitividade
  • Fan Experience/Digitalização

Planeamento

Uma instituição que se quer na vanguarda da organização e do profissionalismo deve planear a época antecipadamente, obviamente em articulação com o calendário internacional da FIFA e respetiva Federação nacional. De acordo com o último UEFA Benchmark Report, campeonatos como a Premier League ou a Bundesliga decorrem em menos semanas do que a Liga Portuguesa, dando a atletas mais tempo para descansar e a clubes mais tempo para planear. Mais, não pode continuar a ser possível a calendarização de jogos com menos de uma semana de antecedência, como acontece amiúde em Portugal. Se queremos um futebol com mais adeptos nos estádios e com as equipas a apresentarem-se no topo da sua competência, devemos definir a calendarização com a maior antecedência possível. E, mais uma vez, bons exemplos não faltam. Veja-se os casos da La Liga ou da Premier League que a publicam com meses de antecedência. Se a Federação Portuguesa de Futebol tem por norma publicar o calendário desportivo nacional cerca de três meses antes da época começar, qual o motivo para não ser dada a treinadores, jogadores e adeptos a indicação de quando vão jogar e a que horas? Chamem os operadores televisivos, Sport TV e Benfica TV, chamem os clubes, sentem-se a mesa e decidam. Todos vamos sair a ganhar.

Competitividade

Mais uma época e mais um campeonato bipolarizado. A competitividade na Liga Portuguesa tende a diminuir ano após ano. Este é um tópico em que não existe um total controlo da situação por parte da Liga e onde os prize money das competições europeias têm contribuído decisivamente para o desnivelamento dos campeonatos nacionais por essa Europa fora. No entanto mais pode e deve ser feito na promoção da competitividade interna. Por um lado, e no contexto do futebol europeu, dos 55 países que habitam na esfera da UEFA, apenas Portugal e Chipre não apresentam os direitos de TV centralizados. Este dado só por si devia dar que pensar. Outro dado que impressiona diz respeito à distribuição das receitas televisivas e ao rácio entre clubes, em cada uma das ligas europeias. Ainda segundo o último estudo da UEFA, o clube que mais recebe em Portugal obtém um valor 15,4 vezes superior do que o clube que recebe menos. A título comparativo saliente-se que o diferencial médio europeu situa-se nas 2,4 vezes, sendo que ligas como a Premier League ou a La Liga têm um diferencial de 1,3 ou 3,1, respetivamente, entre primeiro e último. A adicionar a este negro panorama, nos últimos 10 anos a tendência europeia foi de diminuição (a média europeia reduziu de 3,1 para 2,4 vezes) enquanto, em Portugal, o fosso entre clubes mais do que duplicou de 7,1 para 15,4. Os dados são como o algodão, não enganam.

Por outro lado, um maior controlo do número de atletas com contrato profissional por cada Sociedade Desportiva (SAD) deve ser, no mínimo, estudado. Esta medida levaria a uma mais justa distribuição de recursos financeiros e desportivos pois um clube que tenha 80/90 jogadores sob contrato profissional não consegue oferecer a todos eles condições ótimas de desenvolvimento. A implementação desta medida poderia levar não só a um mais rápido desenvolvimento dos jovens jogadores mas, também, a um aumento do fluxo monetário entre clubes nacionais que hoje em dia é praticamente inexistente. Um jogador com potencial pode não ser interessante para um grande aos 20 anos mas pode sê-lo aos 24 depois, de ter tido espaço competitivo para crescer, juntando a isto a natural compensação financeira ao clube que o desenvolveu entretanto.

Fan Experience/Digitalização

O adepto no centro do futebol. Neste novo mundo global e, nomeadamente nas gerações Z e millennials, o futebol já não e a coisa mais importante do mundo. Eles (nós) têm a Netflix, o Youtube ou o Facebook. E devemos, antes de mais, perceber que o futebol está, mais do que nunca, a competir com estas e outras plataformas. É pois imperioso oferecer um bom serviço aos adeptos para que eles estejam dispostos a disponibilizar-nos uma parte do seu tempo. Por acaso, lembram-se do último jogo em que seguiram os 90 minutos sem comentar as incidências com os amigos no Whatsapp ou a rever jogadas no iPhone? Pois.

Assim, como em relação aos direitos televisivos, a Liga deve ser capaz de marcar a agenda, agregar as necessidades dos clubes profissionais e de criar ferramentas globais para servir os adeptos.

Deixo três ideias:

“Passe Personalizado”, porque não cria a Liga pacotes personalizados com preços atrativos para quem comprar antecipadamente? Exemplos seriam o “Norte Pass”, dando acesso ao adepto a todos os jogos realizados acima de Coimbra; o “Sunday Pass”, dando acesso a todos os jogos realizados ao domingo. A adicionar a isto, acordos com a CP e/ou Metro de modo a facilitar o transporte dos adeptos seriam naturalmente uma forma de melhorar e elevar o valor do produto oferecido.

“Loja Central”, porque não desenvolve e disponibiliza a Liga uma plataforma centralizada que seja o ponto de encontro para todos os adeptos que queiram comprar bilhetes ou merchandising de qualquer clube das ligas profissionais? Isto seria especialmente benéfico para os clubes pequenos que teriam mais tráfego numa plataforma centralizada, ao invés da sua própria no seu site. Numa lógica onde a receita adicional seria partilhada, todos sairiam a ganhar.

“Estadio Cheio”, porque não disponibiliza a Liga aos clubes uma ferramenta que analisa e prevê a afluência aos estádios, aproveitando para antecipar e contrariar a tendência de modo a aumentar as assistências? Por exemplo, se é expectável que o adepto X não vá ao estádio no jogo Y, porque não oferecer-lhe a possibilidade de ter 20% desconto na loja do clube nesse fim de semana? Estamos em 2019. As ferramentas existem, só é preciso que haja vontade.

Claro que estas medidas implicam que o futebol em Portugal seja pensado de forma coletiva. Vamos a isso?

  • João Fonseca

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