O que pode fazer o Governo durante a crise energética? Subir preços dos combustíveis e até limitar uso de viaturas particulares

O Executivo acaba de usar a carta mais valiosa do baralho contra os motoristas, tendo declarado situação de crise energética. O que implica esse medida? O ECO explica.

Face à iminente greve dos motoristas de matérias perigosas, o Executivo de António Costa declarou a situação de emergência energética. Esta medida é a carta mais poderosa do baralho do Governo e exige a implementação de uma série de medidas excecionais, que podem mesmo ir mais longe do que as adotadas em abril. Em cima da mesa, poderá estar a limitação do uso de viaturas particulares, o racionamento de combustíveis e até mesmo a subida das tarifas e dos preços da energia.

Depois de várias reuniões sem sucesso, os motoristas decidiram manter a paralisação que agendaram para dia 12 de agosto e cuja duração ainda está por determinar. Face a este movimento reivindicativo, são esperadas perturbações não só no abastecimento dos postos de combustíveis, mas também no que diz respeito, por exemplo, aos supermercados.

É essa expectativa que levou o Executivo a declarar a situação de alerta energético, medida que pode ser acionada a partir do momento em que haja “uma previsão de circunstâncias que possam provocar” uma crise, nomeadamente com previsíveis dificuldades no “aprovisionamento ou na distribuição de energia que tornem necessária a aplicação de medidas excecionais destinadas a garantir os abastecimentos energéticos essenciais à defesa, ao funcionamento do Estado e dos setores prioritários da economia e à satisfação das necessidades fundamentais da população”.

Mas o que implica esta declaração de alerta energético? Em abril, o Governo usou esta ferramenta para implementar quatro grandes medidas de caráter excecional, citando então a alínea c) do nº1 do artigo 14.º da Lei de Bases da Proteção Civil.

  • “Elevação do grau de prontidão e resposta operacional” das forças de segurança e da Proteção Civil, nomeadamente através do reforço dos meios para operações de patrulhamento e escolta, que permitam garantir as operações de abastecimento de combustíveis. Foram também reforçados os meios de segurança de pessoas e bens. De acordo com o ministro do Ambiente, o mesmo deverá acontecer a partir desta segunda-feira.
  • Convocação dos trabalhadores tanto do setor público como do privado que tenham carta de veículos pesados com averbamento de todas as classes de ADR (transporte de matérias perigosas) e dos demais agentes da Proteção Civil habilitados para a condução de veículos pesados. De notar que, além desta medida extraordinária, o Executivo decidiu formar 500 agentes das forças de segurança e das Forças Armadas com carta de pesados para operarem viaturas de transporte de matérias perigosas, caso se concretize a paralisação em questão e os serviços mínimos não sejam cumpridos.
  • Convocação das empresas e dos trabalhadores dos setores públicos e privados que “estejam habilitados a apoiar as operações de abastecimento dos combustíveis” que se considerem necessárias, caso a paralisação dos motoristas se venha mesmo a concretizar.
  • Reconhecimento de crise energética, acautelando, assim, de imediato os níveis mínimos nos postos de abastecimento. Tal medida serve para garantir o abastecimento de serviços essenciais, nomeadamente no que diz respeito ao combustível necessário para as forças e serviços de segurança, assim como para as emergências médicas, proteção e socorro.
  • Em linha com o ponto anterior e ao abrigo decreto-lei nº114/2001, o Governo também definiu, em abril, uma Rede de Emergência de Postos de Abastecimento (REPA), bem como as entidades prioritárias (forças e serviços de segurança, emergências médicas, proteção e socorro) autorizadas a abastecer nesses postos. Desta feita, a REPA conta com 374 postos destacados: 54 para uso exclusivo dessas viaturas prioritárias e 320 que também podem ser usados pelo público em geral (com um volume máximo de abastecimento de 15 litros por viatura).

Além destas medidas, o Executivo pode agora vir a ativar outros procedimentos previstos para situações de crise energética, ao abrigo desse mesmo decreto-lei nº114/2001, e que vão mais longe, ainda que se a sua aplicação deva ser orientada “pelo respeito dos princípios da necessidade, proporcionalidade e adequação aos fins visados”:

  • Ao nível da redução da procura de energia, está prevista a promoção de campanhas informativas através dos meios de comunicação social, a distribuição de folhetos informativos e explicativos, a fixação de cartazes em locais públicos e a ação direta de agentes do Estado para levar os consumidores a, voluntariamente, pouparem energia.
  • No mesmo âmbito, mas ao nível das medidas compulsivas, a lei permite ao Governo estabelecer restrições ao uso de veículos motorizados particulares (nomeadamente proibindo a circulação destas viaturas, penalizando o uso de viaturas particulares em subocupação e reduzindo os limites máximos de velocidade), restrições aos percurso em vazio ou em subocupação de transportes públicos e comerciais, restrições ao uso de equipamentos que consumam energia.
  • Está ainda prevista a “substituição do consumo de um produto deficitário pelo consumo de outra forma energética mais abundante”.
  • Já ao nível da poupança efetiva de energia, o Executivo tem poder para introduzir horários diferenciados e limitar mesmo as emissões de televisão e o funcionamento de espetáculos.
  • Está também prevista a possibilidade de agravar as tarifas e os preços da energia.
  • Do lado da oferta, a lei prevê o reforço da produção de bens energéticos deficitários e de fontes energéticas alternativas.
  • Quanto à distribuição, o Governo pode impor sistemas de racionamento, determinar os períodos de encerramentos dos postos e limitar as quantidades globais de combustíveis introduzidas no mercado.

A avançar a paralisação marcada para segunda-feira, estará em causa a segunda greve levada a cabo pelos motoristas de matérias perigosas no espaço de quatro meses.

Em abril, estes trabalhadores pararam em luta por aumentos salariais, tendo deixado os postos de abastecimento praticamente sem combustível. Os motoristas e os patrões acabaram por chegar a acordo para a progressão salarial, com início em janeiro do próximo ano, mas a 15 de julho, os sindicatos decidiram marcar uma nova greve, acusando os patrões de não cumprir esses termos. Várias reuniões depois, as partes não conseguiram chegar a um consenso, mantendo os motoristas a greve da próxima semana.

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