Yes we did: oito anos de Obama na Casa Branca
Hoje foi a última vez que Barack Obama acordou no número 1.600 da Avenida Pensilvânia. Hoje é o dia em que entrega o seu legado a Donald Trump. E qual é esse?
Foi no dia 20 de janeiro de 2009 — há exatamente oito anos — que Barack Hussein Obama se tornou no primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos da América. Com uma campanha alicerçada na esperança e na renovação, conseguiu surpreender tudo e todos, derrotando dois pesos pesados da política americana: Hillary Clinton e John McCain.
Começou como underdog, o candidato com menos probabilidade de ganhar por ter menos experiência, e acabou por subir ao púlpito no capitólio, onde afirmou que chegava de “queixas insignificantes e falsas promessas, de recriminações e dogmas ultrapassados que estrangularam a nossa política durante demasiado tempo”. A mudança era possível e ia começar.
"Chegou a hora de reafirmar o nosso espírito persistente, de escolher a nossa melhor história, de perseguir aquele prémio precioso, aquela ideia nobre passada de geração em geração: a promessa divina de que todos são iguais, que todos são livres e que todos merecem uma hipótese de perseguir a sua noção de felicidade plena.”
Antes de avançar, resolver
Herdou um país aos pedaços, destruído pelo rebentar da bolha do imobiliário que levou à queda de grandes banco como o Lehman Brothers. Era esperado que outros, como o Merrill Lynch e o Bank of America, se seguissem, mas o pior foi evitado. Entretanto, a crise financeira alastrava pelo mundo como uma epidemia.
O tecido socioeconómico estava ainda pior: quem tinha contraído créditos à habitação deixou de conseguir pagar o que devia, a inflação subiu, levando os preços a máximos, a procura de bens e serviços diminuiu, os negócios pararam de contratar e começaram a dispensar trabalhadores. Resumindo, uma bola de neve catastrófica.
O trabalho de recuperação começou a ser feito ainda por Bush, na altura em que o país entrou em recessão. Um mês após chegar à Casa Branca a administração Obama implementou um pacote de estímulos à economia com medidas instantâneas e abrangentes
Este colete salva-vidas ficou conhecido como American Recovery and Reinvestment Act (ARRA) e contava com alívios fiscais, incentivos ao investimento privado, programas de ajuda aos lesados e investimento em infraestruturas públicas. Entre os anos de 2009 e 2012, o ARRA permitiu um impulso fiscal de 700 mil milhões de dólares
Por outro lado, a Reserva Federal tomou a iniciativa de utilizar a ferramenta clássica de estabilização monetária: a redução das taxas de juro de referência para mínimos históricos — que se mantiveram aí até dezembro de 2015.
Depois da população, os mercados
Wall Street tinha sofrido um abalo fortíssimo. Entre 2008 e 2009, o indíce S&P 500 negociou em mínimos desde a terça-feira negra de 1929. Era preciso garantir que algo assim não voltava a acontecer.
Foi assim que surgiu a lei Dodd-Frank, considerada a maior luta de Obama pela restruturação financeira. “Eu não me candidatei à presidência para ajudar uma data de banqueiros gulosos”, afirmou este quando a lei foi proposta.
A Dodd–Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act prevê a construção de um sistema financeiro mais transparente e responsável, que previne que as instituições fiquem “too big to fail” — demasiado grandes para falir, numa tradução literal –, que os contribuintes tenham de financiar os resgates e que sejam levadas a cabo práticas financeiras abusivas e periogosas.
Por outro lado, esta lei aumentou também a supervisão financeira devido ao surgimento de várias agências que estão em constante contacto com as instituições de mais risco, restringindo investimentos e impedindo empréstimos predatórios.
O setor automóvel, um dos setores mais importantes da indústria americana também precisou de um abanão, com os dois maiores fabricantes nacionais, a General Motors e a Chrysler, a precisarem de intervenção estatal. O processo de restruturação incluiu a declaração de bancarrota por parte das duas empresas.
Por fim, a intervenção estatal também se estendeu à banca através do Troubled Asset Relief Program, que providenciou 700 mil milhões de dólares para estabilizar instituições financeiras em risco, como o AIG. No total, foram 700 os bancos a receberem apoios.
Saúde para todos
Muitos tentaram, todos falharam. Inúmeros presidentes, entre eles Teddy Roosevelt, Franklin Roosevelt, Jimmy Carter e Bill Clinton, quiseram tornar a saúde um direito comum e estender o acesso aos cuidados de saúde àqueles que não conseguiam pagar por um seguro. Chegou a vez de Obama e conseguiu — pelo menos por agora.
O Affordable Care Act ou Obamacare, como é habitualmente chamado, tornou-se no maior sistema de saúde a trabalhar na América, tendo providenciado cuidados de saúde de qualidade para mais de 22 milhões de americanos e reduzido os custos de muitas famílias em milhares de euros. Além disso, a dinâmica do programa afetou também médicos, hospitais e empresas de farmacêutica que passaram a ter mais trabalho.
Obama e o retrato final
Obama sai da Casa Branca e deixa um país com um Produto Interno Bruto de 18 biliões de dólares, em relação aos 14,7 biliões que encontrou. Ultrapassou a crise de 2008, que deixou o PIB de 2009 em 14.4 biliões, mas deixa também uma dívida de 19,9 biliões de dólares — cerca de 107% do PIB.
Relativamente ao emprego, os Estados Unidos da América contam hoje com uma taxa de desemprego de 4,7%, menor do que a que se registava em 2008 — 5% — e bem menor do que o pico que atingiu na recessão, de 10%.
Obama sai também com a banca aparentemente saudável. Os três maiores bancos americanos fecharam positivamente o ano passado, sendo que o JP Morgan registou 24,7 mil milhões em lucros — face aos 5,6 mil milhões em 2008 –, o Bank of America 17,9 mil milhões — contra 4 mil milhões em 2008 — e o Citigroup 14,9 — 27,6 mil milhões de dólares em prejuízos que contabilizou em 2008.
O que ficou por fazer?
Os avanços nestes oito anos foram bastantes, mas ainda ficaram muitos problemas por resolver. O primeiro, e um dos mais preocupantes em termos sociais, é o da desigualdade que tem estado a crescer. Segundo a World Wealth & Income Database, 38,9% da riqueza total do país está nas mãos dos 1% da população mais rica.
Além disso, e embora tenha conseguido diminuir a taxa de desemprego, a administração de Obama não conseguiu aumentar a percentagem de população ativa: 17% dos homens em idade ativa não estão em exercício, enquanto nas mulheres esta percentagem é de 25%.
Legado económico ou inspiracional
Todas as metas atingidas pela administração de Obama podem ser alvo de debate. O crescimento é notável, mas à custa de quê? Até que ponto os americanos vivem em melhores condições? A verdade objetiva é que este foi um líder que conseguiu resgatar um país de uma crise profunda, da qual muitos países ainda estão a tentar recuperar. Os seus feitos na área social e dos direitos humanos não têm par. É um presidente que vai ficar na memória de todos.
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