Compras de Portugal ao Reino Unido caíram 86% depois do Brexit

Os dados mostram uma queda abrupta das trocas comerciais entre o Reino Unido e a União Europeia no primeiro mês em que se aplicou a nova relação comercial. Em Portugal esse impacto foi ainda maior.

De um mês para o outro, o Reino Unido saiu do mercado único europeu e da união aduaneira, deixando de beneficiar do livre comércio de bens que beneficiava quando estava na União Europeia. Apesar de se ter evitado tarifas e quotas, há novas barreiras comerciais que estão a condicionar as trocas comerciais entre o Reino Unido e os países europeus, incluindo Portugal. Os dados de janeiro, o primeiro mês com as novas regras, começam a mostrar esse impacto.

Os número dos comércio internacional de bens de Portugal em janeiro mostram, sem dúvida, uma quebra acentuada da relação comercial com o Reino Unido, mais nas importações do que nas exportações. A compra de bens britânicos caiu 86% em termos homólogos ao passo que a venda de bens portugueses ao Reino Unido caiu 13,5%. Ambas as variações ficam acima dos valores registados no total das exportações (-9,8%) e importações (-17,2%) em janeiro de 2021, face a janeiro de 2020.

Esta foi a maior queda mensal das importações com origem do Reino Unido desde que o Instituto Nacional de Estatística (INE) tem registos e, na prática, significa que Portugal comprou menos 161 milhões de euros de bens britânicos face ao mesmo mês do ano passado (período ainda anterior à pandemia). No caso das exportações nacionais a queda foi de 40 milhões de euros.

Focando nas importações, todo o tipo de bens sofreu uma quebra, sem exceções, mas há algumas categorias com maior peso como é o caso dos produtos minerais, os químicos, o material de transporte (carros, por exemplo) e máquinas e aparelhos. Nestas quatro principais categorias de bens que Portugal comprava ao Reino Unido, a quebra foi superior a 80%.

Esta queda sem precedentes ocorreu de forma semelhante nos restantes países europeus. O Eurostat já divulgou os dados do comércio internacional de bens relativo a janeiro de 2021 e estes mostram uma redução das importações da UE com origem no Reino Unido de 59,5%, abaixo da registada em Portugal, passando de 15,8 mil milhões de euros em janeiro de 2020 para 6,4 mil milhões de euros em janeiro de 2021. As exportações europeias para o Reino Unido desceram 27,4%.

Também é possível ver os números pela perspetiva do Reino Unido. De acordo com o gabinete de estatísticas britânico, as exportações do Reino Unido para a União Europeia (que na ótica do Eurostat são as importações com origem no Reino Unido) caíram 40,7% em janeiro, a maior queda mensal de que há registo. As importações do Reino Unido (exportações da UE para território britânico) encolheram 28,8%. Em média, a queda foi metade da registada para Portugal.

Janeiro de 2021 marca um ponto de viragem com o fim do período de transição do Brexit e a entrada em vigor, após um acordo de última hora, de uma nova relação comercial entre o Reino Unido e a União Europeia. O país liderado por Boris Johnson deixou de fazer parte do mercado único e da união aduaneira e, apesar de não ter sido alvo de tarifas ou quotas, os bens britânicos (e os bens europeus quando vão para o Reino Unido) passaram a ter novas barreiras burocráticas e de controlo, o que levou a um aumento dos custos para empresas e autoridades nacionais e europeias.

Mas este não é o único fator a ter em conta na interpretação destes dados. Desde logo, há impactos estatísticos da saída com o gabinete de estatísticas britânico a explicar que mudou a fonte de informação. E, também por isso, diz que para se entender os impactos da saída da União Europeia não se pode analisar apenas os “movimentos dos dados do comércio de apenas um mês”, sendo necessário fazer uma “análise ao longo de período de tempo mais longo”.

Além disso, tanto Portugal como o Reino Unido começaram um confinamento severo em janeiro, o que terá influenciado as trocas comerciais entre os dois países. Acresce que não é de excluir o adiamento por parte das empresas de compras ao Reino Unido por dificuldades burocráticas ou processuais num momento inicial em que as regras mudam, com esse efeito a atenuar-se nos próximos meses.

Esse receio terá também levado muitas empresas a antecipar encomendas em dezembro, acumulando stocks para evitar possíveis problemas de abastecimento nos primeiros dias de aplicação do novo acordo comercial. Outro fator a ter em conta é o controlo efetuado no Canal da Mancha no final de dezembro por causa da nova variante britânica, o que também criou disrupções no comércio entre o Reino Unido e a UE com filas enormes de espera.

Do lado do Reino Unido, como relata este artigo do The Guardian, as empresas continuam a queixar-se da confusão e dos atrasos com o Governo britânico a falhar no recrutamento de 30 mil despachantes aduaneiros necessários para esta nova realidade. O ministro responsável pela relação com a UE, Lord Frost, explicou que houve uma “combinação única de fatores” que levou “inevitavelmente a números invulgares em janeiro”, mas garantiu que esse efeito irá começar a dissipar-se. A expectativa é que estas disrupções continuem pelo menos até ao verão.

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