Já se pode pagar por um Twitter melhor

O paradigma de utilização das redes sociais em troca da exploração dos dados pessoais pode estar a mudar, graças à possibilidade de subscrever o Twitter.

Em 2020, escrevi aqui um artigo chamado “E se o Twitter for pago?”. Um ano menos três dias depois, aí está a primeira versão do Twitter pago. Chama-se Blue, estreou para já apenas na Austrália e no Canadá e custa perto de € 2.5.

Por enquanto, permite essencialmente três funcionalidades: uma janela de 30 segundos que permite aos utilizadores editar o tweet que acabaram de enviar, a criação de pastas para organizar os tweets marcados e a leitura facilitada de longas trocas de mensagens. A empresa promete alargar o serviço a outras regiões e acrescentar funcionalidades, o que deverá acontecer depois de um período de testes e algumas iterações nas áreas onde já funciona.

Ao mesmo tempo, a empresa tem vindo a investir noutros produtos – que poderão ou não vir a ser incluídos nesta opção de subscrição. Só no último ano já comprou: a Squad, uma aplicação de vídeo social; a Revue, para entrar no negócio das newsletters por email; a Scroll, que cobra uma assinatura para dar aos utilizadores a experiência de consumo de notícias sem anúncios. E isto para além de ter criado um serviço de áudio que compete com o Clubhouse e de continuar a explorar opções para concorrer com o TikTok e o Snapchat.

Em termos operacionais, a opção é sensata: a subscrição permite ao Twitter diversificar fontes de rendimento, ganhar relevância no crescente mercado de personalização dos produtos e tornar-se no ecossistema de referência dos utilizadores que valorizam informação. Um serviço pago tende a aumentar a qualidade para todos os utilizadores – e se a opção se alargar para outros serviços poderá ajudar a mudar o paradigma do modelo de negócio de toda a internet. E uma assinatura conjunta de um serviço de Twitter (feed de informação de utilizadores) mais o Scroll (notícias de referência sem anúncios) e a Revue (newsletters de qualidade e personalizadas) pode criar um serviço absolutamente único e de qualidade que algumas pessoas poderão estar interessadas em pagar bem para aceder. Tudo isto tenderá a ser menos dependente da viralidade e das emoções, tirando espaço à cultura de ódio que ainda domina a gestão de conteúdos na internet.

Claro que ainda é cedo e não são estas funcionalidades agora anunciadas que irão mudar o quadro das redes sociais. O que torna esta opção interessante é a mudança da relação contratual entre o utilizador e a plataforma. Um utilizador pagante (de forma explícita) tem mais poder na relação que estabelece com o seu fornecedor, que se dará ao trabalho de tentar manter as subscrições porque elas são financeiramente relevantes. E por isso poderá exigir maior proteção na recolha e utilização dos seus dados pessoais. Por outro lado, o potencial de exigência aumenta: quando a rede for vítima de hacking (como já foi), os seus utilizadores pagantes terão o direito de exigir compensação financeira pelo assalto aos seus dados e pela perda de serviço. E a melhor consequência de todas poderá ser permitir aos utilizadores começar a perceber que todas as redes sociais se fazem pagar pelos serviços – algumas são explícitas na utilização dos preços, mas outras continuam a explorar os utilizadores incautos sem os informar devidamente.

Claro que isto cria também um problema de desigualdade: quem não pode pagar para aceder ao serviço premium tem menos influência e é menos capaz de influenciar os destinos da aplicação; Quando o somatório destas aplicações equivale ao espaço público, temos um problema – porque a ausência de vozes implica uma redução da diversidade e isso será sempre uma perda de valor.

Ler mais: Enquanto planeia os próximos passos da reconversão do Twitter, o seu CEO Jack Dorsey bem pode aproveitar para ler o Breaking the Social Media Prism. Este livro lançado no mês passado foca-se em soluções para o problema da excessiva polarização de opinões e como tornar o espaço público digital mais apelativo para todos.

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