É oficial: Portugal já não produz eletricidade a partir de carvão
Este sábado foi o primeiro dia de produção de eletricidade em Portugal sem recurso à queima de carvão. A Central do Pego, que era a segunda maior poluidora do país, esgotou o stock de material.
Portugal deixou definitivamente de usar carvão na produção de eletricidade, desde sexta-feira, graças ao fim dessa atividade pela Central Termoelétrica do Pego, anunciaram o ministro do Ambiente e a associação ambientalista ZERO, que espera que o futuro não passe agora por queimar biomassa. Matos Fernandes garante que já há investimentos em carteira para a transição energética e promete que vai abrir novos avisos de fundos comunitários até ao fim do mês.
“O futuro da central do Pego não deve passar por queimar biomassa, opção ineficiente que põe em causa objetivos mais ambiciosos de mitigação das alterações climáticas”, considerou a organização ambientalista, em comunicado.
Sábado foi o primeiro dia de produção de eletricidade sem recurso à queima de carvão, depois de a Central do Pego ter esgotado o stock de carvão que tinha, apesar de estar licenciada para funcionar até 30 de novembro.
Para a ZERO, “esta data histórica em que se deixa de utilizar em Portugal o combustível mais poluidor em termos de emissões de gases com efeito de estufa causadoras das alterações climáticas, antecipando um objetivo que estava inicialmente traçado para 2030, não deixa de ser um alerta para a necessidade de planear antecipadamente e assegurar uma transição energética justa para o país rumo à neutralidade carbónica em 2050 ou desejavelmente antes”.
Para os ambientalistas, é fundamental garantir o enquadramento dos trabalhadores direta e indiretamente afetados e promover soluções que não ponham em causa os ganhos ambientais conseguidos.
Deixar de usar carvão na produção de eletricidade é um elemento crucial da descarbonização, tema que ganhou destaque e causou polémica na conferência do clima (COP26), que terminou no passado fim de semana, com alguns países a recusarem-se a acabar com o uso deste combustível.
A central a carvão do Pego, que era responsável por 4% das emissões do país, foi a instalação com o segundo maior peso nas emissões de dióxido de carbono em Portugal na última década, a seguir à Central Termoelétrica de Sines, cujo encerramento ocorreu em janeiro deste ano.
Em termos absolutos, a média anual de emissões de gases com efeito de estufa (GEE) pela central do Pego entre 2008 e 2019 foi de 4,7 milhões de toneladas de dióxido de carbono.
Com a retirada agora consumada das duas centrais a carvão, “Portugal deverá registar uma enorme quebra de emissões de carbono, dado que o recurso a centrais de ciclo combinado a gás natural, caminho temporário para uma solução 100% baseada em fontes renováveis, se traduz em emissões de pouco mais de um terço por cada unidade de eletricidade produzida em comparação com o carvão”, assinala a ZERO.
Apesar dos equipamentos de despoluição instalados, a central a carvão do Pego era também uma fonte significativa de emissão de diversos poluentes, como os óxidos de azoto, dióxido de enxofre, partículas e metais pesados, cujas quantidades lançadas para a atmosfera em Portugal sofrerão uma redução importante.
O fim da atividade desta central suscita agora a questão das alternativas, sendo o recurso à queima de biomassa uma das soluções preconizadas, mas que a ZERO alerta não ser “sustentável”. “Trata-se de uma solução ineficiente e contraditória com os objetivos de retenção do carbono na floresta e no solo e não se traduz numa significativa mais-valia face a outras soluções de mitigação climática”, afirma.
A associação defende que a concessão do ponto de ligação da Central do Pego deverá ter em consideração apenas projetos que resultem da “utilização de fontes de energia verdadeiramente renováveis e que de forma alguma se coloque a possibilidade de recurso a biomassa, tendo em consideração que esta não é, nem será de forma alguma renovável”.
Os ambientalistas alertam ainda para a escassez de biomassa residual florestal em território nacional, atendendo a que num raio de intervenção de 80 quilómetros são já inúmeras as centrais de biomassa e indústrias florestais que competem pela matéria florestal residual.
Acresce ainda que o espírito da proposta recente da Comissão Europeia, de julho de 2021, que faz parte do pacote “Preparados para os 55”, é de que “a partir de 31 de dezembro de 2026, (…) os Estados-membros não podem conceder apoio à produção de eletricidade a partir de biomassa florestal em instalações exclusivamente elétricas”.
Nessa medida, a ZERO questiona como está e como vai ser aplicado o Fundo para a Transição Justa nas centrais de Sines e Pego e na refinaria de Matosinhos, e defende um plano que fortaleça a vitalidade económica e social das regiões afetadas, promovido pelas empresas envolvidas em colaboração com trabalhadores, autarquias locais, organizações não-governamentais e outras entidades competentes.
“Sem diálogo, concertação social e criação de soluções alternativas atempadas, não estamos de forma alguma a fazer uma transição energética justa”, considera a associação, alertando desconhecer, no caso da central de Sines, “o uso de qualquer verba do Fundo para a Transição Justa até agora”.
Projetos de investimento para a transição
Esta manhã, em declarações à RTP3, o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, anunciou que até 30 de novembro vão ser lançados novos avisos de fundos comunitários para apoiar projetos de investimento relacionados com a transição climática.
“Entre projetos para fabricar eletrolisadores, projetos para produzir pequenos camiões elétricos, de propulsão de hidrogénio verde, são vários os que existem para ali”, concretizou o governante. Sobre os empregos perdidos, algo que será discutido esta semana numa reunião no Ministério, Matos Fernandes assegura “todas as condições para a transição destes trabalhadores”.
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