Financiamento para o desenvolvimento: o que está ‘na mesa’ da conferência da ONU

- Ana Batalha Oliveira
- 10:05
A quarta Conferência de Financiamento para o Desenvolvimento das Nações Unidas decorre esta semana em Sevilha. Conheça os objetivos e o que estará em discussão.
Financiamento para o desenvolvimento: o que está ‘na mesa’ da conferência da ONU

- Ana Batalha Oliveira
- 10:05
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Quais os objetivos da quarta Conferência de Financiamento para o Desenvolvimento das Nações Unidas?
A quarta Conferência de Financiamento para o Desenvolvimento das Nações Unidas (FFD4, na sigla em inglês) acontece dez anos depois da terceira, que decorreu em 2015, na Etiópia. Foi nesta ocasião que foram definidos os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS).
O objetivo para esta edição é repensar a arquitetura de financiamento para o desenvolvimento, alicerçando este esforço na agenda para o desenvolvimento definida há dez anos na Etiópia.
Nesta sede, está prevista a adoção do chamado Compromisso de Sevilha, que deverá servir como guia para o financiamento do desenvolvimento na próxima década. É, no entanto, tal como tem sido regra nas conferências multilaterais da ONU, um documento não vinculativo, representando apenas um compromisso.
Proxima Pergunta: Quais são as perspetivas atuais para o financiamento do desenvolvimento?
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Quais são as perspetivas atuais para o financiamento do desenvolvimento?
De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, os apoios concedidos para o desenvolvimento, a nível global, caíram 9% em 2024, e em 2025 a quebra pode voltar a repetir-se, ou na mesma medida, ou atingindo-se uma redução de até 17%, o que traria os volumes de auxílio para um intervalo entre os 170 mil milhões de dólares e os 186 mil milhões.
A contribuir para a redução estão cortes nos apoios por parte dos Estados Unidos, Reino Unido, França e Alemanha, que recuaram em simultâneo nesta frente pela primeira vez em 30 anos. Os Estados Unidos abandonaram, inclusivamente, as negociações, retirando-se do Compromisso de Sevilha. Até 2027, a OCDE projeta um corte adicional de 10 a 18% nas ajudas ao desenvolvimento, afetando sobretudo os países em desenvolvimento e da África subsariana.
Os Estados-membros da União Europeia fornecem cerca de 42% da ajuda global ao desenvolvimento, tendo esta totalizado 95,9 mil milhões de euros em 2023, de acordo com Ursula von der Leyen, ao mesmo tempo que aponta mais de 300 mil milhões de dólares em dívida que foi reestruturada ou cancelada pelos países do bloco.
Proxima Pergunta: E quais as necessidades?
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E quais as necessidades?
Um total de quatro biliões de dólares (3,4 biliões de euros) são necessários anualmente para colmatar o défice do financiamento e atingir os objetivos de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas, alertou, num discurso esta manhã, o presidente do Conselho Europeu, António Costa.
Proxima Pergunta: Quais as principais medidas previstas no Compromisso de Sevilha?
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Quais as principais medidas previstas no Compromisso de Sevilha?
O documento identifica oito áreas de ação.
Em primeiro lugar, olha aos recursos públicos domésticos. Quer-se mobilizar mais destes recursos, já que se nota uma estagnação nas receitas fiscais colhidas por países em desenvolvimento, ao mesmo tempo que se assegura o seu uso eficiente, “fortalecendo os sistemas fiscais” e “promovendo a respetiva progressividade”. Ao mesmo tempo, esperam-se “medidas robustas para prevenir e combater a evasão fiscal, fluxos financeiros ilícitos e corrupção”.
Em segundo lugar, o compromisso quer promover atividade económica privada, investimento e inovação, reconhecendo a necessidade de quadros regulatórios e incentivos ao investimento privado. O financiamento híbrido, que combina diferentes fontes de financiamento, como capital público, privado e filantrópico, é referido como uma das soluções a implementar. De seguida, é realçado o papel da cooperação internacional, sublinhando-se a importância de ajuda financeira internacional. Em quarto lugar, o documento defende que sejam tomadas medidas para assegurar a capacidade dos países em desenvolvimento participarem do comércio internacional, numa altura em que restrições ao comércio, nomeadamente tarifas aduaneiras “estão a crescer” — tendo sido uma parte relevante da política da nova administração dos Estados Unidos.
A sustentabilidade da dívida é referida em quinto lugar, já que “os desafios da dívida soberana são um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento” e muitos países têm encargos elevados com a mesma. Um grupo de trabalho deverá trabalhar o tema e apresentar propostas de ação neste campo até 2027.
A arquitetura financeira internacional deverá ser revisitada no sentido de alargar a voz e representatividade dos países em desenvolvimento nas instituições económicas e financeiras, de forma a dar resposta às necessidades destes países. Em sétimo lugar, e reconhecendo que o desenvolvimento tecnológico exacerba a desigualdade entre as economias mais e menos desenvolvidas, quer-se reforçar o apoio internacional à instalação de inovação nos países em desenvolvimento.
Por fim, o documento refere que estatísticas e dados de “alta qualidade, atempados e fiáveis” são “essenciais” para avançar com a agenda para o desenvolvimento sustentável. No texto, lê-se por exemplo que o indicador “produto interno bruto” não é suficiente para captar a realidade destes países, e apela-se a que sejam acompanhados os progressos daqui em diante.