Que polémica é esta sobre a proibição da publicidade de obras?
- Marta Moitinho Oliveira
- 24 Março 2019
Uma nota da CNE lançou uma polémica sobre quem pode e quando pode uma entidade pública fazer publicidade da obra feita. A lei é de 2015, mas estas são as primeiras eleições em que se aplica.
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O que diz a lei que proíbe a publicitação de obras até às eleições?
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E o que diz a CNE?
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No entendimento da CNE que proibições existem?
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Esta proibição relaciona-se com as europeias mas aplica-se às autarquias?
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E o Governo também está proibido de anunciar obra durante este período?
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Mas isto significa que o Governo não poderá fazer inaugurações?
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Há alguma sanção para quem não cumpre a lei?
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E o Parlamento vai fazer alguma coisa perante tanta contestação à lei?
Que polémica é esta sobre a proibição da publicidade de obras?
- Marta Moitinho Oliveira
- 24 Março 2019
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O que diz a lei que proíbe a publicitação de obras até às eleições?
O Parlamento aprovou em 2015 a Lei 72-A que foi publicada em Diário da República a 23 de julho. No capítulo III da lei, os deputados fizeram um conjunto de normas sobre como fazer propaganda eleitoral através de meios de publicidade comercial. No artigo 10.º ficou definido que “a partir da publicação do decreto que marque a data da eleição ou do referendo é proibida a propaganda política feita direta ou indiretamente através dos meios de publicidade comercial”. O número 4 do mesmo artigo refere-se especificamente à publicidade institucional. Ou seja, à publicidade feita pelas entidades públicas. Naquele período (desde a marcação até à realização das eleições) “é proibida a publicidade institucional por parte dos órgãos do Estado e da Administração Pública de atos, programas, obras ou serviços, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública“.
Proxima Pergunta: E o que diz a CNE?
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E o que diz a CNE?
A 26 de fevereiro, foi publicado em Diário da República o decreto presidencial que marca as eleições europeias para 26 de maio. Este ato desencadeou a publicação de uma nota informativa por parte da CNE, onde o organismo faz a leitura daquela restrição criada pela lei de 2015. Não só a nota explica que a restrição sobre a publicitação de atos das entidades públicas começa a partir da data da publicação do decreto presidencial como explica de forma pormenorizada o que as entidades não podem fazer.
Proxima Pergunta: No entendimento da CNE que proibições existem?
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No entendimento da CNE que proibições existem?
Na nota interpretativa que publicou no site, a CNE dá vários exemplos de publicidade que as entidades públicas não podem fazer. “São proibidas expressões que representam verdadeiros slogans publicitários, indo, pois, muito além da simples obrigação de informação requerida (por ex., “Mais de 80% do concelho com saneamento” ou “#ACELERA VILA REAL”)” é um dos exemplos dados pela CNE, a entidade competente para acompanhar os processos eleitorais. “No mesmo sentido mensagens que refletem uma atitude proativa da instituição na promoção da qualidade de vida dos habitantes (como por ex. “Continuam a decorrer a bom ritmo as obras de instalação de redes de saneamento básico” ou “o futuro será certamente melhor, mais limpo e melhor para todos em matéria ambiental”)” é outro dos casos mencionados pela CNE. Também “a divulgação de tomadas de posição pela entidade pública, ainda que aprovadas por unanimidade dos eleitos de todos os partidos políticos com assento nessa entidade, in casu, a câmara municipal (por exemplo, a cedência de um terreno para aí se construir uma obra ou a requalificação de determinada escola)” está proibida, já que “tais mensagens assumem conteúdo programático e consubstanciam o exercício da atividade camarária no âmbito do seu programa, extravasando o mero cariz informativo”, argumenta a CNE.
Proxima Pergunta: Esta proibição relaciona-se com as europeias mas aplica-se às autarquias?
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Esta proibição relaciona-se com as europeias mas aplica-se às autarquias?
Sim. Assim que foi conhecida a nota da CNE, a Câmara Municipal de Vila Verde decidiu adiar a cerimónia de inauguração de uma avenida. A leitura da CNE mereceu uma enorme contestação. Fernando Medina, presidente da maior autarquia do país, considerou a lei uma “aberração” e pediu a intervenção do Parlamento. Também a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) está contra: considera que a CNE está a “desvirtuar” a lei e pediu uma reunião com urgência ao Presidente da República. O líder dos autarcas tentou mostrar como a lei está a ser mal interpretada. Para isso, deu dois exemplos do que as câmaras não podem fazer, com a interpretação dada pela CNE. “Uma empresa municipal dedicada a atividades culturais ficaria inibida de anunciar ou informar os munícipes da realização de um evento cultural e socialmente relevante para o município” e “outra situação exemplar refere-se à execução de fundos comunitários, designadamente no âmbito da regeneração urbana, cuja publicitação das obras respetivas (obrigatória legalmente) parece ficar também impedida por esta interpretação da CNE.”
Proxima Pergunta: E o Governo também está proibido de anunciar obra durante este período?
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E o Governo também está proibido de anunciar obra durante este período?
Sim. É pelo menos essa a leitura da CNE. “Em conformidade com o fundamento subjacente à norma legal, o n.º 4 do mencionado artigo 10.º abrange qualquer órgão do Estado e da Administração Pública, ou seja, engloba os órgãos de soberania, das regiões autónomas, do poder local, eletivos ou não, dos correspondentes níveis de administração, incluindo as respetivas empresas, e demais pessoas coletivas públicas”, diz a nota do CNE. O Governo diz que tomou nota da interpretação feita pela CNE, mas uma fonte do Executivo citada pelo Jornal de Negócios indica que a nota da CNE deve ser “depurada”.
Proxima Pergunta: Mas isto significa que o Governo não poderá fazer inaugurações?
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Mas isto significa que o Governo não poderá fazer inaugurações?
Não. Significa que não pode fazer publicidade à obra. Ou seja, o Governo pode fazer inaugurações, mas não pode ter, por exemplo, um cartaz a fazer propaganda àquela obra. Numa segunda nota, a CNE explicou que as inaugurações ficam de fora da proibição. Ou seja, câmaras e Governo vão poder inaugurar obras. O que não podem é fazer publicidade. “A CNE esclarece, mantendo o conteúdo da Nota Informativa, que os órgãos do Estado e da Administração Pública não estão, no desenvolvimento das suas atividades, impedidos quanto: à realização ou participação em eventos (conferências, assinaturas de protocolos ou inaugurações) e à realização de entrevistas, discursos ou a resposta a meios de comunicação social).”
Proxima Pergunta: Há alguma sanção para quem não cumpre a lei?
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Há alguma sanção para quem não cumpre a lei?
No artigo 12.º, a lei prevê as sanções a aplicar. “Quem promover ou encomendar, bem como a empresa que fizer propaganda comercial em violação do disposto no artigo 10.º é punido com coima de 15.000 euros a 75.000 euros.” Esta coima é agravada em um terço nos seus limites mínimo e máximo em caso de reincidência, determina a lei.
Proxima Pergunta: E o Parlamento vai fazer alguma coisa perante tanta contestação à lei?
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E o Parlamento vai fazer alguma coisa perante tanta contestação à lei?
Sim. O PS já entregou um projeto para alterar a lei. No texto constará uma redução do prazo de proibição. Atualmente, a proibição é válida entre a publicação do decreto presidencial com a marcação da data das eleições até ao dia em que ocorre a ida às urnas. O PS quer que este prazo seja encurtado passando a proibição a valer a partir do momento em que os partidos apresentam as listas dos candidatos às eleições. Além disso, o PS quer que a proibição de aplique aos órgãos cujos titulares estejam sujeitos a eleição e não a todos. Os socialistas querem ainda que a atividade corrente dos serviços, com as ações informativas em curso ou de realização periódica ou sazonal não sejam afetadas por esta proibição. Falta saber como os restantes partidos votarão o projeto. Se forem aprovadas, estas novas regras só entrarão em vigor a 1 de janeiro de 2020 para os órgãos que vão a eleições este ano (Parlamento Europeu, Assembleia da República e Governo Regional da Madeira).