Quem são os grandes devedores incumpridores da banca? É o que o Parlamento quer saber
- Alberto Teixeira e Leonor Mateus Ferreira
- 4 Janeiro 2019
PSD, CDS, BE e PCP querem obrigar Banco de Portugal a divulgar a lista de maiores créditos em incumprimento dos bancos ajudados pelo Estado. Proposta é discutida esta sexta-feira pelos deputados.
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- Alberto Teixeira e Leonor Mateus Ferreira
- 4 Janeiro 2019
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Por que é que os partidos querem novas regras de transparência bancária?
A divulgação das listas dos grandes devedores incumpridores à banca volta a estar na ordem do dia. Depois de o Parlamento ter aprovado, em maio, vários projetos de lei que abrem a porta a que seja levantado o sigilo bancário, os diplomas chegam esta sexta-feira à discussão na especialidade, já com algumas alterações.
Os deputados da Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa vão debater uma proposta conjunta do PSD, CDS, Bloco de Esquerda e PCP que poderá levar à divulgação da lista de clientes com créditos em incumprimento superiores a cinco milhões de euros, junto de instituições de crédito que tenham sido alvo de medidas de intervenção corretiva, de resolução, nacionalização ou liquidação através de fundos públicos.
Por um lado, as comissões parlamentares de inquérito poderão ganhar acesso a informação que até agora estava protegida, para que não aconteça o mesmo que aconteceu em relação à Caixa Geral de Depósitos. Por outro, o Banco de Portugal poderá passar a divulgar quem são os maiores caloteiros dos bancos intervencionados pelo Estado. O objetivo é aumentar a transparência financeira em casos de bancos que recebem ajudas públicas, mas há diferenças nas perspetivas dos partidos sobre o assunto.
Tanto os bancos como o regulador também já se pronunciaram. Em termos políticos, há ainda uma outra leitura importante: caso o PS se oponha, poderá ser a primeira maioria negativa de 2019.
Proxima Pergunta: O que está em causa na proposta conjunta de PSD, CDS, BE e PCP?
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O que está em causa na proposta conjunta de PSD, CDS, BE e PCP?
A proposta conjunta tem por base os projetos do CDS, BE e PCP já aprovados na generalidade em meados do ano passado e tem sobretudo dois objetivos:
- Assegurar o acesso a informação sobre os créditos em incumprimento por parte das comissões parlamentares de inquérito da Assembleia da República e
- Estabelecer um novo regime de transparência sobre os grandes créditos de instituições que receberam apoio financeiro público.
Quanto ao primeiro objetivo, os partidos querem evitar o que sucedeu quando os deputados da comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos (que recebeu uma injeção de 3,9 mil milhões em dinheiros públicos em 2017) foram impedidos de ter acesso à lista de devedores incumpridores do banco público, que alegou sigilo bancário para não divulgar os seus créditos problemáticos.
No que toca ao segundo ponto, prevê-se um mecanismo de transparência sobre os grandes créditos de instituições que receberam recursos públicos e que vai obrigar o Banco de Portugal à publicação de quatro relatórios. Dois relatórios vão ter informação pública aberta, sendo publicados no site do supervisor: um com os principais dados da injeção de fundos públicos e outro com dados agregados e anonimizados, com a lista das chamadas “Grandes Posições Financeiras” sem o nome dos credores. As grandes posições financeiras correspondem os créditos em incumprimento ou reestruturados no valor de mais de 5 milhões de euros, desde que igual ou superior a 1% do montante de fundos públicos injetados.
Os outros dois relatórios que o Banco de Portugal terá de elaborar contemplam “Informação Relevante” e reservada, para conhecimento do Parlamento, contendo dados sobre os valores dos créditos, garantias, responsáveis pela concessão, gestão ou reestruturação, entre outras. Um relatório terá de ser feito sempre que ocorra uma injeção de capital num banco com recurso a dinheiros públicos. O outro tem um cariz extraordinário, contendo as operações de crédito dos bancos “ajudados” pelo Estado nos últimos 12 anos.
Proxima Pergunta: O que divide os partidos?
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O que divide os partidos?
Apesar de ser uma proposta conjunta, onde sobressai um entendimento global entre PSD, CDS, BE e PCP relativamente a matérias de transparência bancária (contra aquilo que é a posição do PS), há pontos de divergência entre esquerda e direita. E por isso esta proposta não está ainda fechada, podendo os partidos apresentar alterações até à próxima segunda-feira.
Uma divergência importante emerge no que toca ao relatório extraordinário sobre as operações de crédito dos últimos 12 anos. Enquanto PSD e CDS querem incluir neste relatório os bancos que ainda não devolveram a ajuda pública, BE e PCP querem englobar todos os bancos que recorreram a fundos públicos desde 2007.
Esta diferença tem significado: enquanto a visão dos primeiros excluem BPI e BCP, dois bancos que recorreram à linha de capitalização do Estado durante a crise mas já devolveram todo o dinheiro que pediram emprestado (através das chamadas obrigações de capital contingente), os segundos querem incluir todas as instituições intervencionadas pelo Estado: BPN, Banif, Novo Banco, CDG e… BPI e BCP.
Proxima Pergunta: O que dizem o PS e o Governo?
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O que dizem o PS e o Governo?
Na altura em que começou o debate, o PS cingiu-se a uma proposta para acabar com o sigilo bancário para depósitos superiores a 50 mil euros (dados que seriam enviados para o Fisco). Sobre os devedores em incumprimento nos bancos intervencionados pelo Estado, não se pronunciou. No entanto, o partido ficou de fora do documento conjunto e a posição socialista não é conhecida. Caso se oponha, a proposta poderá ser aprovada de qualquer forma (na tal maioria negativa).
O Governo já se mostrou favorável à hipótese. “O que é importante em relação à questão do sigilo bancário é perceber o equilíbrio na divulgação de informação, no caso de bancos que receberam ajuda do Estado por estarem em situação financeira difícil e por isso ser necessário escrutínio das situações que geraram fragilidade no passado”, afirmou Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças, numa conferência em maio do ano passado.
Proxima Pergunta: Qual a posição do Banco de Portugal e APB?
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Qual a posição do Banco de Portugal e APB?
Tanto os bancos como o regulador se mostraram contra as novas regras. O parecer do Banco de Portugal sobre as propostas, enviado ao Parlamento no verão passado, aponta para uma série de entraves e obstáculos. Ainda na Comissão Parlamentar de Inquérito à Caixa Geral de Depósitos, o governador Carlos Costa criticou a hipótese de “haver tratamento diferenciado em função da propriedade da instituição: ser pública ou privada” e acrescentou que “espírito do legislador nunca foi o de colocar [uma lista de devedores] na praça pública”.
Já a Associação Portuguesa de Bancos defende que as novas regras desconsideram os fundamentos que “enformam o regime do segredo bancário” pelo que “sacrificam, de forma desproporcional e excessiva, os interesses dos clientes na preservação da confidencialidade da sua informação bancária, a confiança em que assenta a relação bancária e a estabilidade do setor financeiro, bem como o respeito pelos dados pessoais de clientes bancários e colaboradores de instituições financeiras”, de acordo com o parecer enviado ao Parlamento.
Face a estas questões, a proposta conjunta refere que a regra de transparência se sobrepõe ao sigilo bancário e de supervisão, sinalizadas pelos bancos e pelo regulador, respetivamente. Prevê também regras de tratamento da informação que for recebida pelo Parlamento, definindo regras de acesso e utilização de dados sensíveis. Ainda assim, caberá ao Parlamento ou à comissão de inquérito a palavra final sobre a divulgação pública desta informação.
Proxima Pergunta: Quando é que a proposta é votada?
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Quando é que a proposta é votada?
Esta sexta-feira os deputados da COFMA discutem a proposta conjunta na especialidade, com os partidos a poderem apresentar alterações até à próxima segunda-feira. Depois, na próxima quarta-feira, a proposta é votada nesta comissão. E só na sexta-feira da próxima semana é que acontece a votação final global no plenário da Assembleia da República.
Depois de promulgação por parte do Presidente da República, a lei entrará em vigor no dia a seguir à sua publicação em Diário da República.