O norte-americano Robert G. Eccles acredita que, para se fechar um novo valor de financiamento climático anual, é preciso olhar para soluções como pôr um preço no carbono ou melhorar o licenciamento.
No último dia da “COP das Finanças”, espera-se um acordo sobre o financiamento climático a nível global. Robert Eccles, professor na universidade de Oxford, e cujo trabalho se tem debruçado sobre como os mercados de capitais podem contribuir para uma sociedade sustentável, falou em entrevista ao Capital Verde sobre algumas das soluções que podem servir para desbloquear fundos adequados à ação climática.
Após duas semanas da 29.ª Conferência do Clima (COP29), ainda não se vislumbra um acordo quando aos grandes números que irão suportar a transição verde. O desafio é acordar qual será o valor a angariar anualmente a partir de 2025, e quem irá contribuir para o novo “bolo”, sendo que desde 2020 que a fasquia está nos 100 mil milhões de dólares e o fardo recai sobre os chamados países desenvolvidos.
Quando questionado qual o valor mais adequado para o futuro, numa altura em que os apelos vão dos 100 mil milhões ao bilião, Robert Eccles afasta estimativas e passa à estratégia: “Não sei qual a resposta, mas escolham um número qualquer, a questão é esta: de onde virá?” e “onde vai ser despendido”, em termos de negócios e geografias?
“Se pudesse agitar uma varinha mágica, colocava um preço global no carbono“, aponta o professor, que esteve em Portugal esta semana com keynote speaker de uma conferência do Financial Times. Seja através de um imposto ou da constituição de mercados de carbono, o que torna esta opção mais atrativa são as consequências diretas na economia: “quando se coloca um preço numa externalidade, vê-se uma tradução direta naquilo que são as implicações financeiras” para uma empresa, argumenta, por oposição, por exemplo, às exigências de reporte de sustentabilidade. Esse, “é apenas um passo”.
Na ótica de Eccles, não será o setor financeiro a impulsionar a mudança: “não pode liderar a transição energética e passar à frente da economia real“, até porque “podes dizer, como gestor de fundos, que serás neutro em carbono em 2050 e limpar o teu portefólio, mas os poluidores ainda existem. Não descarbonizaste a economia, descarbonizaste o teu portefólio”.
Não é fã da política de desinvestimento pois considera que “pôr toda esta pressão sobre as empresas ocidentais de petróleo e gás ignora a realidade geopolítica de onde o petróleo e gás são originários” — são empresas estatais como a Saudi Aramco, Sinopec, China Petroleum e Rosneft que possuem a maior fatia das reservas de petróleo e gás no mundo. “Não há forma de colocar pressão sobre elas” através dos mercados financeiros, e o petróleo e gás vão continuar a ser necessários durante alguns anos, expõe.
Nesse sentido, acredita que o contributo do mundo financeiro estará mesmo do lado do investimento. Com uma ressalva: “se se vai trazer o capital privado, o capital privado precisa de retorno”, sublinha Eccler. Com isto, quer dizer que os privados não estarão dispostos a aceitar um retorno abaixo do mercado, tendo também em conta obrigações fiduciárias a que alguns dos grandes fundos estão sujeitos. Assim, “Precisamos de financiamento híbrido [blended finance]”, defende.
No seu entender, “é necessário muito mais financiamento” de entidades como o Banco Europeu de Investimento, o Banco Mundial e o Banco Asiático de Desenvolvimento. A ideia é que o setor público avance com fundos de forma a assumir parte do risco e permitindo desta forma que o capital privado entre no investimento com retornos mais em linha com o mercado.
Em paralelo, há fundos focados no clima que estão a olhar ainda para outro problema, o chamado “vale da morte”: empresas que precisam de financiamento depois da fase de capital de risco antes de poderem lançar-se nos mercados. “Penso que esse é um papel que pode ser desempenhado por fundos de investimento”, afirma.
Por fim, há uma outra questão, não tão típica da COP, que Eccler considera relevante levantar: nos Estados Unidos “o capital está lá. Se ao menos o licenciamento também lá estivesse”, lamenta, argumentando que um licenciamento mais rápido e eficiente traria mais capital para a área das energias renováveis.
“As boas notícias são todas as oportunidades de negócio ótimas que há” na área do clima, contrabalança. Realça por exemplo o potencial do investimento em infraestruturas facilitadoras da transição, que serão do agrado dos investidores, já que estes apreciam investimentos de longo prazo, com pagamentos estáveis.
Reporte pode dar empurrão
As exigências de reporte na Europa, presentes na Diretiva sobre o Relato de Sustentabilidade (CSRD, na sigla em inglês), são “relativamente complicadas” para as empresas, que “precisam de tempo para colocar os seus processos em ordem, para conseguirem ter os dados”. Do outro lado da equação, “os investidores precisam de tempo para aprender como tratar os dados”.
O impacto que estas exigências vão ter no que diz respeito ao financiamento climático — se irão, ou não, incentivá-lo — é “a grande questão” que Robert Eccles espera ver esclarecida em breve: vão ser precisos cerca de “cinco anos para ver se mexe com a alocação de capital”, estima.
No entretanto, considera que “tem de se fazer trabalho para encontrar uma base global“, sendo que “há muitos caminhos possíveis”. Em paralelo com a CSRD existem duas outras grandes referências do reporte de sustentabilidade, a Global Reporting Initiative (GRI) e o ISSB — International Sustainability Standards Board. “Estas entidades comunicam”, garante, partilhando a expectativa de que exista um entendimento para evitar que as empresas reportem de acordo com cada um destes guias, em exercícios separados.
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Do preço global no carbono e financiamento híbrido ao licenciamento. As “chaves” para fechar a COP29
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