“Já hoje temos a Europa a duas velocidades”

Margarida Marques, de partida para Roma onde se celebra o 60º aniversário dos Tratados de Roma, espera que a declaração final dê uma "mensagem positiva relativamente ao futuro" da União Europeia.

A Europa a duas velocidades já é uma realidade. Por isso, Portugal prefere que a União Europeia possa continuar a dar pequenos passos, através das cooperações reforçadas, do que ficar paralisada nas suas decisões, explica a secretária de Estado dos Assuntos Europeus em entrevista ao ECO. É com esta convicção que Portugal parte para Roma para celebrar, este sábado, as bodas de diamante dos Tratados de Roma.

O que é que Portugal espera da declaração de Roma?

Esta cimeira a 27, é uma cimeira especial na medida em que tem uma dupla função: comemorar o passado e dar aos cidadãos uma mensagem positiva relativamente ao futuro. O texto de declaração tem de corresponder a esta expectativas designadamente à Europa social, ao papel da UE no mundo, mas também no que diz respeito a uma Europa próspera e sustentável que promova o crescimento e a criação de emprego. Outra dimensão importante é relativa à segurança da Europa e se possam mover livremente. E as quatro correspondem às expectativas dos cidadãos que esperam que a Europa crie condições para que sintam segurança física, no emprego e proteção social.

Esta cimeira surge após os atentados de Londres que vieram reavivar medos e receios.

Temos a noção de que é necessário prevenir o terrorismo, evitar e conseguir controlar os ataques terroristas na Europa. Situação que não me parece que esteja abandonar. É importante a cooperação entre serviços de informação dos Estados membros. Há a noção de que a luta contra o terrorismo só se faz em conjunto. Um Estado membro um isolamento não o consegue.

Há a noção de que a luta contra o terrorismo só se faz em conjunto. Um Estado membro um isolamento não o consegue.

Margarida Marques

Secretária de Estado dos Assuntos Europeus

Mas essa luta em conjunto é possível num momento em que o Reino Unido está a acionar o artigo 50?

O artigo 50 vai ser acionado dia 29. É interessante verificar que Theresa May, no seu discurso, deu alguma informação sobre aquelas que serão as áreas de cooperação futura com a UE. E uma das que identifica é a luta contra o terrorismo.

E como levar a cabo essa luta, numa Europa do Brexit e de risco de aumento do populismo?

O Reino Unido tem uma função estratégica e os todos os Estados Membros fizeram um esforço para que o Reino Unido continuasse a ser membro da União. O Reino Unido assim não o entendeu. Mas não podemos valorizar apenas a dimensão económica. A relação com o Reino Unido é importante em todos os seus aspetos, nomeadamente geoestratégicos, ao nível da defesa e da segurança externa. Theresa May também continua a identificar essas áreas. Mas outra questão que importa sublinhar é a da mobilidade das pessoas: os cidadãos da UE devem manter todos os direitos e condições de mobilidade no Reino Unido.

Por isso pergunto, o Reino Unido vai usar essa importância geoestratégica como moeda de troca para servir os seus interesses mais ofensivos?

Vai haver uma negociação. É uma negociação: cada um usa os seus argumentos para fazer prevalecer a sua posição. Gostaria ainda de destacar a ideia de que há um preço a pagar por parte do Reino Unido. O preço é o Reino Unido colocar-se nesta posição. É a saída da União Europeia, deixar de poder participar nas decisões políticas. Interessa ao Reino Unido e à UE que a relação seja forte, mas não pode ser uma situação nova em que Londres, como país terceiro, esteja numa posição melhor do que estava.

O preço é o Reino Unido colocar-se nesta posição. É a saída da União Europeia, deixar de poder participar nas decisões políticas. Interessa ao Reino Unido e à UE que a relação seja forte, mas não pode ser uma situação nova em que Londres, como país terceiro, esteja numa posição melhor do que estava.

Margarida Marques

Secretária de Estado dos Assuntos Europeus

O primeiro-ministro defendeu a ideia de uma Europa a duas velocidades. É uma ideia perigosa, já que Portugal não está no pelotão da frente?

O primeiro-ministro disse que não podemos ficar parados e que preferia que a UE evoluísse mas a várias velocidades. É uma situação que já hoje temos. Dois casos concretos: Schengen e euro. São exemplos de cooperações reforçadas nas quais a Europa evolui a várias velocidades. Não significa abandonar os países. Ou seja, sempre que um país esteja em condições de entrar deve aderir e não pode ser ignorado.

E não há um risco ainda maior de divisão da Europa?

Não vai acontecer, é uma coisa que já vem do passado. As bases jurídicas do Tratado permitem essas duas velocidades. Além de Schengen e do euro existem outros casos de cooperação reforçada como em matéria de tutela das crianças em caso de divórcio, procuradoria europeia, etc. Já se recorre às duas velocidades. A questão que se coloca hoje é que, perante a constatação de que há uma certa paralisia, uma não-decisão em certos domínios é necessário recorrer mais às cooperações reforçadas para poder dar pequenos passos. Os pequenos passos pelos quais a União Europeia é conhecida e que a têm feito avançar.

Já se recorre às duas velocidades. Perante a constatação de que há uma certa paralisia, uma não-decisão em certos domínios é necessário recorrer mais às cooperações reforçadas para poder dar pequenos passos.

Margarida Marques

Secretária de Estado dos Assuntos Europeus

Depois do anúncio de um défice de 2,1% em 2016 é certo que Portugal vai conseguir sair do Procedimento por Défices Excessivos?

O senhor ministro das Finanças deu toda informação sobre essa questão.

Mas vamos sair? Mário Centeno não o confirmou?

Esse é um processo técnico. Há regras e a Comissão Europeia vai seguir essas regras.

Mas além de técnico o processo também é político. Bruxelas está inclina em ignorar o facto de a capitalização da Caixa inverter a a tendência descendente do défice?

Há sempre uma decisão politica e as instituições europeias são políticas. Mas há um conjunto de regras que temos de seguir.

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