Jeremy Browne: “A UE tem de ter cuidado. O mundo não gira à volta de Bruxelas”

O representante especial da City de Londres para os assuntos relacionados com a UE defende que Londres pode continuar a ser o centro financeiro global da Europa, mesmo depois do Brexit.

“Londres ainda tem virtudes que não são fáceis de replicar noutro lugar”, diz Jeremy Browne. Em entrevista ao ECO, o Representante Especial da City de Londres para os assuntos relacionados com a União Europeia defende que a City pode continuar a ser “o centro financeiro global” da Europa, “mesmo depois do Reino Unido ter deixado a União Europeia”.

“Londres é o centro financeiro da Europa não porque um comité em Bruxelas assim o decidiu, aconteceu por razões históricas”, sublinhou. A língua inglesa, uma legislação laboral “mais flexível do que outras grandes economias em toda a Europa”, “a lei inglesa que serve de base a muitos contratos internacionais”, “taxas de imposto razoavelmente competitivas”, mão-de-obra muito especializada, são algumas das vantagens de Londres apontadas por Jeremy Browne, cuja função consiste em promover a indústria britânica de serviços financeiros e profissionais entre os países membros da União Europeia.

O ex-secretário de Estado no Foreign Office coloca Londres a par de outras praças financeiras como Nova Iorque, Hong Kong e Singapura e não Frankfurt, Paris ou Milão e defende que “Londres deve ser vista como um ativo europeu e não como um ativo britânico”.

Jeremy Browne, que esteve em Lisboa no final de maio, deixa nesta entrevista ao ECO antes das eleições um alerta a Bruxelas: “Ter cuidado para não parecer que as suas posições iniciais estão desgarradas da realidade”. Um aviso que surge na sequência dos 100 mil milhões de euros que a União Europeia está a exigir ao Reino Unido pelo Brexit.

O Brexit vai ser, ou já é, um duro golpe para a City?

A maior parte das pessoas na City de Londres queriam que o Reino Unido permanecesse na União Europeia. O consenso era que era melhor para o Reino Unido permanecer no mercado único e na UE. As pessoas ficaram apreensivas com a disrupção que o Brexit causaria. Tudo isso continua a ser verdade, mas vivemos numa democracia. Tivemos um referendo. Ninguém duvida da validade da votação. Mais pessoas votaram pela saída do que pela permanência. Por isso, as empresas têm de se adaptar a essa nova realidade. As empresas na City de Londres estão a pensar como fazer os ajustamentos necessários.

Todos temiam a perda de milhares de postos de trabalho. Continua a acreditar que a perda será assim tão drástica?

Haverá algum ajustamento. Não é realístico pensar que nada mudará. É plausível pensar que milhares de postos de trabalho serão deslocalizados, mas é necessário contextualizar. Trabalham mais pessoas nos serviços financeiros em Londres do que a população total de Frankfurt. Há centenas de milhares de pessoas. É possível que 3%, 4%, 5% de postos de trabalho sejam deslocalizados. Ninguém sabe. Mas isso também significa que 95%, 96% dos postos de trabalho não vão mudar. Também é importante lembrar que nada permanece imutável. Se o Reino Unido tivesse votado pela permanência na UE, a City de Londres permaneceria a mesma durante os próximos dez anos? Não. Há outras grandes forças como a automação, a mudança de natureza do fornecimento de serviços financeiros. Temos 45 mil pessoas a trabalhar em Fintech em Londres. Há dez anos ninguém trabalhava em Fintech em Londres. Vão deslocalizar alguns dos postos de trabalho mais tradicionais? Há bancos a questionar se precisam de ter tantos trabalhadores? Se os precisam de os empregar em Londres ou noutra localização. O que quero dizer é: o Brexit terá consequências e não creio que sejam positivas, mas não devemos exagerar ou fazer e conta que não haveria mudanças neste setor sem o Brexit, porque está sempre em evolução.

O Brexit terá consequências e não creio que sejam positivas, mas não devemos exagerar.

Jeremy Browne
Muitos dos trabalhadores do setor financeiro não são britânicos. Outra consequência do Brexit será os trabalhadores europeus sentirem que não estão seguros ou que não são bem-vindos?

Espero que não. É perfeitamente legítimo que um país decida que não quer fazer parte da UE, mas que ainda assim tenha uma atitude amigável e acolhedora relativamente aos estrangeiros. Tem razão, a City de Londres é altamente internacional. Cerca de um terço das pessoas na City não são britânicas. Um pouco menos de metade desse terço são cidadãos dos países da UE. Há muitos americanos, japoneses, entre outros, que nunca fizeram parte da UE. Vamos continuar a ser um centro global para a economia europeia. Espero e acredito que vamos atrair pessoas empreendedoras e interessantes e inovadoras de Portugal e de outros países. É basicamente isso que Londres oferece à economia europeia, ao continente europeu. Londres é a verdadeira plataforma global e muitas empresas em Londres não são especificamente britânicas. Na realidade, muito poucas servem simplesmente o mercado interno do Reino Unido. Londres está altamente internacionalizada, muito mais do que os outros centros financeiros na Europa, que são muito mais pequenos. Continua a ser vantajoso para as empresas de toda a Europa, que queiram aceder ao mercado global, ter essa oportunidade em Londres.

Há muitos rumores de bancos que querem deixar a City. Quais têm já um pé fora?

A maior parte dos bancos têm a sua presença dominante na Europa, em Londres. Mas não exclusivamente. Frequentemente já têm escritórios mais pequenos, por exemplo em Frankfurt. É bem possível que haja alguns ajustamentos e a colocação de mais pessoas em centros como Frankfurt ou Dublin. Há todas estas cidades diferentes que defendem ser uma boa localização.

Qual seria uma boa localização?

Não há consenso na City sobre qual é a melhor alternativa. Há vantagens e desvantagens em todas as opções. Mas não ouvi nenhuma empresa dizer que ia deslocalizar a totalidade da sua força de trabalho. Creio que vão querer manter o seu principal escritório no continente europeu em Londres. Mas, dependendo da natureza da sua atividade, podem querer ter uma presença mais significativa no mercado único, quando o Reino Unido deixar de fazer parte. Como disse muitos já têm escritórios importantes na UE, por isso poderá bastar mudar o estatuto legal das operações nesse país, sem ser necessário alugar muitos mais andares num novo edifício. Será um ajustamento e não uma mudança significativa e continuarão a considerar o centro das suas operações europeias em Londres mesmo quando o Reino Unido deixar de fazer parte da UE.

Qual será o centro financeiro que vai beneficiar mais com o Brexit?

Não sei. A vantagem de Frankfurt é o facto de a Alemanha ser a maior economia europeia, o centro de muitas das decisões europeias. Por ouro lado, é uma cidade bastante pequena. Um dos atrativos de estar em Londres é fazer parte de uma cidade hub mais ampla e não apenas ao nível dos serviços financeiros, mas em muitas outras áreas, de interesse e relevância global. Desse ponto de vista, Paris é superior a Frankfurt. Paris e Frankfurt têm regras laborais mais restritivas do que, digamos a Irlanda, e têm impostos sobre as empresas mais elevados. Na Irlanda também se fala inglês e tem o mesmo fuso horário de Londres. Mas por outro lado, é uma economia muito mais pequena e periférica do ponto de vista geográfico.

Não há solução perfeita.

Não há solução perfeita. A escala e a interação de Londres, pessoas diferentes com aptidões diferentes é superior à que se pode encontrar em qualquer outro centro. Os pares de Londres são Nova Iorque, Hong Kong, Singapura não é Milão, Dublin, Luxemburgo ou Madrid. Correndo o risco de soar arrogante, a alternativa de Londres não ser o centro financeiro global da Europa é a Europa não ter um centro financeiro global. Não creio que, de repente, haja uma nova Londres em qualquer outro sítio.

A alternativa de Londres não ser o centro financeiro global da Europa é a Europa não ter um centro financeiro global. Não creio que, de repente, haja uma nova Londres em qualquer outro sítio.

Jeremy Browne

O que estou a tentar dizer é que haverá ajustamentos cruciais, talvez mais postos de trabalho em Frankfurt. É do interesse não só do Reino Unido mas da UE, e da Europa como um todo, que continuemos a ter centro financeiro de padrões globais no nosso continente que esteja disponível para as empresas europeias. E esse centro poderá continuar a ser Londres mesmo depois do Reino Unido ter deixado a UE. No entretanto, não parece haver uma alternativa viável que possa fornecer o mesmo tipo de serviços, com o mesmo nível de competências de Londres. Há um argumento pragmático para os europeus: ver Londres como um ativo europeu e não como um ativo britânico, que beneficia a Europa como um todo mesmo que o Reino Unido não esteja na UE.

Tudo vai depender da forma como as negociações são levadas a cabo?

Não iria tão longe. Creio que alguns dos atrativos fundamentais de Londres, vão persistir.

Mesmo num cenário de um 'hard Brexit'?

A relação do Reino Unido com a UE é algo importante a ter em conta quando se trata de as empresas estarem em Londres. Mas não é a única: a língua inglesa, a lei inglesa — base para muito contratos internacionais –, a aplicação consistente da lei, são aspetos vistos por muitas empresas, de todo o mundo, como algo importante. Sentem que têm um sistema legal imparcial e fiável que dá as bases para toda a atividade. Além disso, temos uma legislação laboral mais flexível do que outras grandes economias em toda a Europa, taxas de imposto razoavelmente competitivas (tanto ao nível das empresas como do IRS), e o facto de Londres ser, na minha opinião, a única cidade hub verdadeiramente global. Se precisar de recrutar alguém verdadeiramente especializado, por seis meses, em setores invulgares, um sub-nicho, provavelmente não vou conseguir encontrar essa pessoa no Luxemburgo, ou em Frankfurt. Mas uma consultora de recursos humanos pode encontrar cinco pessoas adequadas em Londres, até ao final da semana. É um mercado maior e mais sofisticado. Se em todo o mundo pedir para lhe nomearem as cinco cidades mais importantes, muitas nomearão Londres, mas não sei se nomearam mais alguma cidade europeia.

Muitas das pessoas que trabalham em Londres não são naturais do Reino Unido. E se os termos da negociação ditarem uma saída do mercado único?

Está a aflorar duas questões. Vai depender do que quer dizer “sair do mercado único”. Vamos querer ter a relação mais próxima que conseguirmos com a UE e com o mercado único, compatível com o Reino Unido não estar na UE. Porque esse foi o resultado do referendo. Poderá ser um acordo de parceria ou uma relação complementar e não abertamente concorrencial. É importante continuar a atrair pessoas talentosas de toda a UE e de todo o mundo. Mas sim, se as pessoas sentirem que Londres tem um ambiente hostil e que as pessoas inovadoras e empreendedoras não querem ir, ou forem impedidas de ir, para Londres, mesmo que tenham todos os motivos para lá estar, isso seria uma perda para Londres. Somos muito claros quando falamos com o Governo britânico: reconhecemos que o Governo queira mudar o atual sistema de liberdade de movimentos, mas devemos continuar a fazer isso de uma forma amplamente liberal e que permita aos cidadãos da UE trabalhar e contribuir positivamente para o que está a acontecer em Londres.

É possível que a UE use estas negociações como uma espécie de vingança pelo facto de o grande centro financeiro da UE ser em Londres e não na zona euro?

Espero que isso não aconteça. Mas é um risco. Não usaria a palavra vingança. É muito forte. De certa forma, a UE tem de fazer uma escolha. A primeira é reconhecer que haverá alguns ajustamentos a fazer resultantes do Brexit. A relação entre o Reino Unido e a UE não será idêntica, mas isso é uma realidade e as pessoas vão ter de o aceitar. Mas Londres ainda tem virtudes que não são fáceis de replicar noutro lugar. Londres vai continuar a ser um ativo pan-europeu, mesmo como Reino Unido fora da UE. E considerar um ponto positivo que Londres seja um ativo nosso e não um ativo britânico. Essa será a abordagem mais conciliatória. E espero que venha a ser essa a abordagem dominante na UE.

Mas há outra abordagem.

É justo reconhecer que há uma alternativa na qual as pessoas adotam um ponto de vista mais agressivo e rancoroso relativamente ao Reino Unido por sair da UE e por ter um centro financeiro bem-sucedido e tentem prejudicar para além dos ajustamentos normais que resultem do Brexit. A minha mensagem é: isso não vai prejudicar apenas o Reino Unido, será também um ato de autopunição.

Os comentários de Pierre Moscovicci e Jean-Claude Juncker em relação ao Reino Unido são sinais de alerta a que Londres deveria estar atenta?

A resposta rápida é não. De facto, até me faz preocupar ligeiramente em sentido contrário. Este é um tipo de gesto vazio, de declarações que se afastam da substância. Quando assumi estas funções, há cerca de um ano e meio, ocasionalmente, pedia desculpa por ter reuniões em inglês, por ser ligeiramente indelicado, por exemplo, vir a Portugal e partir do princípio que as conversas seriam na minha língua e não na vossa, tendo em conta que a conversa decorria em Portugal. Mas deixei de o fazer, não por uma questão de delicadeza, porque toda a gente olhava para mim como se fosse estúpido, porque todos partiam do princípio que a conversa seria em inglês e acham estranho o facto de sequer mencionar o assunto. O inglês é a língua de negócios e do comércio internacional não porque um comité em Bruxelas assim o decidiu. A UE tem de ter cuidado. O mundo não gira à volta de Bruxelas. Algumas pessoas em Bruxelas podem ter essa sensação. Mas menos de 7% da população mundial vive na Europa, nem sequer na UE – na Europa. Portanto, quando o Reino Unido sair será uma percentagem ainda mais pequena da UE. Temos de ser um continente global a olhar para o exterior. E a ideia de que substituir a língua inglesa pela francesa para aumentar a interação da UE com a América do Norte, a América Latina ou a Ásia seria sintomático de uma UE muito defensiva e a olhar para dentro e que não percebe que vivemos num mercado competitivo.

A UE tem de ter cuidado. O mundo não gira à volta de Bruxelas. Algumas pessoas em Bruxelas podem ter essa sensação. Mas menos de 7% da população mundial vive na Europa, nem sequer na UE.

Jeremy Browne
Quando diz que se estão a desviar da substância, obrigar o Reino Unido a pagar 100 mil milhões de euros para sair é a substância?

Não falo pelo Governo britânico, mas a UE tem de ter cuidado com o valor de 100 mil milhões. É uma quantia de dinheiro extremamente avultada. Não é dinheiro grátis para os contribuintes britânicos. Não é possível encontrar um único eleitor no Reino Unido a quem se diga que tem 100 mil milhões de euros para gastar que não queira esse dinheiro gasto a melhorar as nossas escolas, o sistema nacional de saúde, a cuidar dos idosos ou em medidas contra o terrorismo. Nem um único dirá que quer dar tudo de uma só vez à UE. Ficaria espantado se encontrasse uma pessoa que fosse.

Mas quando votaram a favor da saída do Brexit sabiam que iam ter de pagar.

Não há precedente para esta questão. O Reino Unido tem sido um contribuinte líquido da UE todos os anos. Há algumas pessoas na política britânica interessadas em saber quanto é que a UE nos deve a nós. Não percebemos como é que podemos dar mais dinheiro a uma organização todos os anos do que aquele que retiramos e no final dever-lhes muito dinheiro. Devemos ser honestos nesta conversa. Creio que o Governo britânico vai chegar à conclusão de que existem algumas obrigações contratuais, qual a sua força legal é uma outra questão. Mas devem sentir que existe um certo nível de obrigação para resolver algumas das questões mais prementes. Não falo pelo Governo britânico, limito-me a observar, mas não creio que será totalmente inflexível e dogmático dizendo que pagam zero. Mas preocupa-me um pouco porque o valor de 100 mil milhões é tão grande que, na mente de muitos britânicos, descredibiliza a argumentação da UE. Há o perigo de, a partir de determinado ponto, o número deixar de ser uma posição negocial inicial impressionante para o fazer parecer fantástico e alheado da realidade. Creio que a UE tem de ter um bocadinho de cuidado para não parecer que as suas posições iniciais estão desgarradas da realidade e são apenas punitivas para o Reino Unido em vez de procurar uma solução negocial genuína.

A UE tem de ter um bocadinho de cuidado para não parecer que as suas posições iniciais estão desgarradas da realidade e são apenas punitivas para o Reino Unido em vez de procurar uma solução negocial genuína.

Jeremy Browne
As negociações têm muito a ver com a negociação de contratos, tratados, leis... questões legais. Dois anos serão suficientes para levar a cabo essas negociações tão complexas?

Temos o intervalo temporal até março de 2019 para negociar os termos da saída. Estou bastante confiante, mas não 100% confiante, que isso vai acontecer. As duas questões que são obviamente mais difíceis são os termos dos direitos dos cidadãos de ambos os lados depois de março de 2019 e o dinheiro, mas espero que possam ser solucionadas. Há depois uma conversa distinta sobre a relação futura da UE a 27 e o Reino Unido. A City de Londres partilha a visão do Governo britânico de que quanto mais cedo de iniciar a conversa sobre a relação futura melhor. A posição da UE que agora é percetível, que é amplamente aceite: devemos começar a conversa sobre os termos da saída e quando forem feitos progressos suficientes devemos começar a conversa sobre a relação futura. Espero que possamos ter essa segunda parte o mais cedo possível, porque muita gente me diz que vai demorar e será bastante complicado. Introduzir muitos atrasos nisso significa que vai demorar ainda mais a chegar a uma conclusão.

Qual a visão do Governo britânico?

A visão do Governo britânico é a de que devemos concluir as negociações sobre a relação futura até março de 2019. Devo dizer que ainda não conheci ninguém no resto da UE que acredite que isso é fazível. Creio que é válido que se não tivermos concluído um acordo final em março de 2019, pelo menos tenhamos o esboço de como será, porque a ideia é sairmos da UE em março de 2019 e, no dia seguinte, adotarmos o futuro acordo comercial entre a UE e o Reino Unido. Se esse acordo futuro não estiver pronto para ser adotado, a não ser que tudo desmorone, temos de implementar uma espécie de acordo intercalar entre 2019 e até ao momento em que esse novo acordo possa estar concluído.

Se esse acordo futuro não estiver pronto para ser adotado, a não ser que tudo desmorone, temos de implementar uma espécie de acordo intercalar entre 2019 e até ao momento em que esse novo acordo possa estar concluído.

Jeremy Browne

Esse acordo intercalar pode durar cerca de dois anos. É útil quando se entra nessa ponte [um jogo de palavras entre bridge agreement (acordo intercalar) e bridge (ponte)] saber o que existe do outro lado da ponte e também saber qual o comprimento da ponte. Se nessa fase soubermos que temos a arquitetura base do acordo futuro, mas temos de trabalhar os detalhes que serão implementados ao longo dos 18 meses ou dois anos, ou até dois anos e meio, então consigo ver uma metodologia de como isso pode funcionar. Então a relação futura será adotada em 2021 no final desse processo. Ainda estamos muito longe disso. Se pensarmos de forma lógica de como é que isto poderá funcionar na prática, consigo ver como vamos ultrapassar a questão, mas há muitos pontos de rutura no caminho. Mas esperamos alcançar o acordo comercial mais abrangente que a UE tem com qualquer país do mundo.

François Hollande tinha os mercados financeiros como o inimigo de França. Emmanuel Macron parece ser muito mais pró europeu. A Alemanha vai ter eleições em setembro. Como é que estas duas alterações vão influenciar as negociações do Brexit?

A psicologia dos alemães ou dos franceses é uma consideração claramente irrelevante. Mas estaria ligeiramente cauteloso em relação a algo: os franceses defendem há mais de 20 anos ser hostis ao que chamam os serviços financeiros anglo saxónicos. Não estou certo que se possa, no dia seguinte, virar as costas a tudo e dizer que se acredita exatamente no contrário. Não sou um comentador de política francesa, mas a ideia de que França se vai tornar a casa natural do pessoal dos serviços financeiros é uma interpretação excessiva da visão de Macron. Recorde-se que tanto a Alemanha como França são a favor de um imposto sobre as transações financeiras. Não vim aqui dizer que Londres é melhor em tudo. O desempenho da Alemanha ao nível da engenharia de motores é bastante impressionante. Países diferentes têm atributos diferentes. Londres é centro financeiro da Europa não porque um comité em Bruxelas assim o decidiu, aconteceu por razões históricas, de mercado e políticas, muitas das quais ainda são fundamentais e ainda se aplicam depois do Reino Unido deixar a UE.

Londres é centro financeiro da Europa não porque um comité em Bruxelas assim o decidiu, aconteceu por razões históricas, de mercado e políticas, muitas das quais ainda são fundamentais e ainda se aplicam depois do Reino Unido deixar a UE.

Jeremy Browne

Vemos Londres como um ativo partilhado e serei sempre orgulhoso de o continente ter desenvolvido um centro financeiro de qualidade mundial. Não é um ativo britânico tacanho, mas sim um ativo europeu que queremos proteger e preservar e creio que é do interesse da União Europeia que sejamos bem-sucedidos a fazê-lo.

Um fracasso é uma perda da UE ou do Reino Unido?

Há potencial para uma disrupção e que as pessoas sejam diminuídas de ambos os lados. A minha visão é procuramos ativamente resultados. Espero que haja uma minimalização pragmática. O Reino Unido é um país europeu. Creio que é importante ter relações amigáveis e cordiais com os países que têm modos de pensar semelhantes. Quando o Reino Unido entrou, a atual UE era um terço da economia mundial. Agora que sai é um sexto. Creio que existe um desafio para a Europa, como um todo, pensar como pode ser um concorrente relevante a nível mundial. A ideia de que se possa satisfazer a prejudicar um outro país seria prejudicar os cidadãos de toda a UE. Espero que os políticos não dececionem os seus cidadãos ao enveredarem por esse caminho e procurem um acolhimento inteligente do Reino Unido de modo a ser benéfico para ambos os lados da discussão.

Espero que os políticos não dececionem os seus cidadãos ao enveredarem por esse caminho e procurem um acolhimento inteligente do Reino Unido de modo a ser benéfico para ambos os lados da discussão.

Jeremy Browne
E não há retorno?

A resposta rápida é não. A longa é a de que nada na vida é definitivo. Muita gente não concorda com a decisão, mas antes do referendo foi-nos dito que esta era uma oportunidade — muitos dirão que foi um referendo desinformado — mas o público sabia que tinha de tomar uma grande decisão e que o resultado seria respeitado e implementado. Theresa May não pensa que possa virar as costas ao resultado do referendo. Em toda a Europa há uma grande questão sobre a confiança nas instituições — um hiato entre o Governo e os governados, pessoas a sentirem-se alienadas pela política tradicional, cujos políticos não representam verdadeiramente os seus interesses. Se quer convidar as pessoas a acreditarem que o seu cinismo é justificado então convide-as a votar numa questão como esta e depois, quando descobre que não gosta do resultado, ignore o resultado. As experiências da UE em ignorar a opinião publica e esconder os problemas, em vez de os resolver, não são totalmente felizes.

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