Menezes Leitão: “Nenhum outro candidato tem a minha experiência”

O atual bastonário dos Advogados é recandidato ao cargo nas eleições deste mês. Esta abre o ciclo de entrevistas individuais que a Advocatus vai publicar nas próximas semanas aos sete candidatos.

O atual bastonário dos Advogados, Luís Menezes Leitão, é recandidato ao cargo nas eleições que se realizam no final deste mês. Esta mesma entrevista abre o ciclo de entrevistas individuais que a Advocatus vai publicar nas próximas semanas aos sete candidatos, por esta ordem: Luís Menezes Leitão, Paulo Valério, Fernanda de Almeida Pinheiro, Varela de Matos, António Jaime Martins, Rui da Silva Leal e Paulo Pimenta. A ordem de publicação das entrevistas foi decidida por sorteio.

Qual é, para si, a principal função da Ordem dos Advogados?

As funções da Ordem dos Advogados estão perfeitamente definidas no art. 3º do nosso Estatuto, sendo que essa disposição coloca em primeiro lugar na alínea a): “Defender o Estado de Direito e os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e colaborar na administração da justiça”. A lei define essa como a principal função da Ordem dos Advogados e esta nunca abdicará de a exercer, em defesa dos cidadãos e da nossa Justiça.

Qual é o seu dever, perante os advogados?

O meu dever, perante os Advogados, resulta igualmente do art. 3º e) do nosso Estatuto: Representar a profissão de advogado e defender os interesses, direitos, prerrogativas e imunidades dos seus membros, denunciando perante as instâncias nacionais e internacionais os atos que atentem contra aqueles. É isso o que temos vindo a fazer, representando os Advogados e defendendo os seus interesses, direitos, prerrogativas e imunidades, sempre que se verifique qualquer ato que os ponha em causa. Tivemos ocasião, especialmente durante a pandemia, de exigir ao poder político o respeito pelo patrocínio judiciário, mesmo perante medidas que claramente atentavam contra o mesmo, de forma até inconstitucional.

O que é que o diferencia dos restantes candidatos?

A experiência de vários anos ao serviço da Ordem dos Advogados, primeiro três anos como Vice-Presidente do Conselho Regional de Lisboa, mais tarde seis anos como Presidente do Conselho Superior e agora três anos como Bastonário. Nenhum outro candidato tem esta experiência, a qual me permite conhecer perfeitamente todas as realidades existentes na advocacia e quais os problemas e dificuldades com que se deparam os Advogados. Por isso, nesta altura tão complexa para o país e para a advocacia, julgo que não é altura de arriscar e dividir, mas sim a de unir e consolidar, sendo a nossa candidatura da Lista J a única que é verdadeiramente independente e por isso está em condições que continuar a defender os Advogados. Na verdade, em relação às outras listas, o que vemos é antes um grande alinhamento com o poder político, o que as leva a apresentar propostas contrárias aos interesses da advocacia, como a transformação do atual sistema de acesso ao direito num sistema de defensoria pública, o que levaria à funcionalização da advocacia e à expulsão do sistema de mais de 11.000 advogados.

Acha que são candidatos a mais?

Qualquer Advogado que tenha dez anos de profissão e consiga recolher 500 assinaturas dos Colegas tem o direito de se candidatar a Bastonário, de acordo com os arts. 11º e 12º do nosso Estatuto. Cabe depois aos Colegas fazer livremente a escolha entre os candidatos que se apresentem, seja qual for o seu número. Não me compete, por isso, pronunciar-me sobre se nesta eleição há excesso ou falta de candidatos. Na eleição anterior, em que fui vencedor, tive cinco opositores, dois dos quais agora se voltaram a apresentar, e na atual tenho seis, o que não é muito diferente.

O que conseguiu mudar na OA nos últimos três anos?

Os dois primeiros anos do nosso mandato foram marcados pela pandemia, o que dificultou imenso a execução do nosso programa. Chegámos a ter todos os funcionários em teletrabalho, com o edifício da Ordem encerrado, em que apenas eu e outro membro do Conselho Geral lá íamos. Mas nunca os serviços da Ordem deixaram de funcionar ao serviço dos Colegas. A seguir tivemos a guerra na Ucrânia, o que nos obrigou a montar uma gigantesca operação de advogados “pro Bono” para apoio aos refugiados ucranianos. Conseguimos apesar disso preparar os Advogados para o novo mundo digital, com a implementação uma ferramenta de comunicação eletrónica entre os Colegas. Fizemos o lançamento da AppOA, que inicia o escritório digital de bolso, e acabámos de montar uma ferramenta de localização dos Advogados. No SADT garantimos o pagamento regular das remunerações, acabando com a suspensão de pagamentos que existia em janeiro. Exigimos o cumprimento da lei que determinava a atualização das remunerações de acordo com a inflação, que nunca tinha sido cumprida, o que vai ser muito importante agora com a inflação a disparar. E terminámos com a inscrição no SADT de pessoas vindas do estrangeiro, sem qualquer experiência da advocacia em Portugal. Na CPAS garantimos a manutenção dos descontos ao indexante contributivo, contra a proposta da CPAS que o pretendia eliminar. Temos por isso muito orgulho de tudo o que realizámos neste mandato, apesar de ter sido um dos mais difíceis da história da Ordem.

O voto nas eleições é obrigatório. Mas sabemos bem que há uma grande fatia de advogados que não vota. Como pode melhorar, desta vez, o apelo ao voto?

Estamos convencidos de que desta vez haverá uma muito maior participação, uma vez que passou a ser reconhecida pelos Colegas a importância da Ordem para defesa dos Advogados, o que levou a que precisamente tenham surgido iniciativas legislativas no Parlamento destinadas a enfraquecer o papel das Ordens em geral e da Ordem dos Advogados em particular. Apelamos aos Colegas a uma grande votação na nossa Lista J em ordem a reforçar a legitimidade deste Conselho Geral para defender a Ordem dos Advogados perante os ataques do poder político.

As palavras-chave da sua campanha são “Solidez, determinação, confiança”. Porquê a escolha destas palavras?

Estamos neste momento numa altura de combate pela defesa da Ordem dos Advogados, da advocacia e da profissão de Advogado. Conforme já referimos, entendemos que não é a altura de arriscar e dividir, mas sim de unir e consolidar. Por isso a nossa proposta aos Colegas é a de Solidez na luta, Determinação na ação e Confiança por parte dos Advogados. Se os Colegas nos reiterarem a sua confiança, prometemos continuar o combate que temos realizado no último mandato sempre Em Defesa da Advocacia.

O diretor nacional da PJ acusou a advocacia de exercer “terrorismo judiciário”. Como encarou estas declarações?

Já disse publicamente que considero essas declarações muito graves, ofensivas e inaceitáveis. Assistirmos em Portugal a um Diretor de uma polícia acusar advogados de terrorismo por exercerem os direitos que a lei lhes confere em defesa dos seus constituintes parece uma situação típica de um Estado totalitário e ditatorial, não do Estado de Direito Democrático que deve existir no nosso país. Por isso já apelámos publicamente a que o Primeiro-Ministro e a Ministra da Justiça tomem posição sobre estas gravíssimas declarações. Da nossa parte, e uma vez que o Diretor da PJ é Advogado com a inscrição suspensa, e por isso mesmo sujeito à jurisdição disciplinar da Ordem, já solicitámos aos órgãos disciplinares competentes que avaliem a relevância disciplinar dessas declarações.

Estamos convencidos de que desta vez haverá uma muito maior participação, uma vez que passou a ser reconhecida pelos Colegas a importância da Ordem para defesa dos Advogados, o que levou a que precisamente tenham surgido iniciativas legislativas no Parlamento destinadas a enfraquecer o papel das Ordens em geral e da Ordem dos Advogados em particular”.

Estamos perante um ataque sem precedentes à advocacia portuguesa? No geral, e não só pelo diretor da PJ.

Claro que sim. Quer a Lei das Associações Públicas Profissionais, quer as declarações do Diretor da Polícia Judiciária se inserem claramente numa estratégia de ataque à advocacia portuguesa, à Ordem dos Advogados, ao patrocínio judiciário que a nossa Constituição garante, e consequentemente ao Estado de Direito. O CCBE, o organismo que coordena as Ordens dos Advogados em toda a Europa já nos manifestou preocupação com o que se está a passar em Portugal. Em qualquer caso, é função da Ordem dos Advogados defender o Estado de Direito e a mesma não vacilará na sua defesa.

Se tivesse de eleger uma medida do seu programa como a com mais rasgo, qual seria?

A reforma dos Tribunais Administrativos e Fiscais, com base nas propostas que o Grupo de Trabalho constituído na Ordem dos Advogados já apresentou à Ministra da Justiça. O colapso que se verifica na nossa Justiça Administrativa e Fiscal contribui para o arbítrio do Estado em prejuízo dos direitos dos cidadãos e é a Ordem dos Advogados que está a tomar a iniciativa de terminar com essa gravíssima situação.

Luís Menezes Leitão, bastonário da Ordem dos Advogados, em entrevista ao ECO/Advocatus - 07JAN20
Luís Menezes Leitão, bastonário da Ordem dos AdvogadosHugo Amaral/ECO

Desde Marinho e Pinto que a ‘elite’ da advocacia diz que a OA perdeu prestígio. Concorda?

Não. Em primeiro lugar sou o Bastonário de todos os Advogados e para mim todos são iguais e a todos represento da mesma forma, pelo que não admito a existência de qualquer “elite” na Advocacia. Em segundo lugar tenho muito respeito por todos os meus antecessores, que mereceram a confiança dos Colegas que os elegeram, e sempre os souberam representar e à Ordem dos Advogados de forma digna e adequada. Na nossa lista J nunca existirá qualquer tentativa de desunir os Advogados, ao contrário do que outros candidatos andam a fazer.

Alguns dos seus oponentes criticam a falta de transparência da OA. Como se defende, perante estas acusações?

Alguns dos meus oponentes criticam-me desde antes da minha tomada de posse, pelo que não me impressionam quaisquer críticas vindas dos mesmos. A Ordem está sujeita às regras da contratação pública e presta contas aos Advogados regularmente nas suas assembleias gerais, em que todos os Colegas participam e podem aceder à documentação necessária para a sua decisão. Temos por isso uma absoluta transparência em relação à gestão da Ordem dos Advogados.

Quantas vezes se reuniu com a senhora MJ da Justiça – esta e a anterior – durante o seu mandato?

Com a anterior devo ter reunido uma dezena de vezes, embora algumas tenham sido por videoconferência em virtude dos constrangimentos resultantes da pandemia. Com a atual já reuni duas vezes, tendo sido a última na sede da Ordem, o que muito apreciámos, pois pensamos ter sido a primeira vez em muitos anos que uma Ministra da Justiça se deslocou à Ordem dos Advogados para esse efeito.

Se for reeleito, o que levará logo à discussão com a senhora Ministra da Justiça?

A reforma das remunerações do SADT, uma vez que defendemos a consagração da regra do pagamento por ato, em lugar do pagamento por processo, como agora está a ser realizado o que gera serviços não remunerados e a demora no pagamento nas remunerações. Já apresentámos uma proposta nesse sentido aos grupos parlamentares e ao Governo e queremos que seja adotada.

A ação disciplinar é bem feita atualmente? Ou ainda há muito corporativismo?

Com a experiência de seis anos como Presidente do Conselho Superior da Ordem posso garantir que a ação disciplinar na Ordem dos Advogados é bem executada e que não há qualquer corporativismo. Basta consultar os relatórios dos órgãos disciplinares para se ver as sanções que são regularmente aplicadas aos Advogados que prevaricam.

O sistema de acesso ao direito é o calcanhar de Aquiles do Estado, na área da Justiça?

Não. Sabemos que há propostas de outras listas, como a Lista A e a Lista C, que querem destruir o SADT para o substituir por um sistema de defensor público, o que implicaria expulsar do sistema 11.000 advogados para os substituir por alguns advogados funcionários do Estado. O nosso sistema é dos melhores do mundo e garante de forma adequada os direitos dos cidadãos. Pode ser naturalmente melhorado e a Ordem está empenhada na sua mudança, designadamente na alteração da estrutura das remunerações, conforme a proposta que já apresentámos ao Governo e aos Grupos Parlamentares.

A Ordem está sujeita às regras da contratação pública e presta contas aos Advogados regularmente nas suas assembleias gerais, em que todos os Colegas participam e podem aceder à documentação necessária para a sua decisão. Temos por isso uma absoluta transparência em relação à gestão da Ordem dos Advogados”.

Há quem diga que foi omisso na questão da CPAS, nomeadamente por não insistir com o Parlamento na execução dos resultados do referendo. Concorda?

Quem diz isso ignora o que diz o art. 170º da Constituição, que limita a iniciativa legislativa aos Deputados, ao Governo, e no caso das regiões autónomas, às assembleias regionais. O Conselho Geral da Ordem dos Advogados apresentou a proposta de lei ao Parlamento, em conformidade com o resultado do referendo, e fomos informados pelo Presidente do Parlamento que a mesma tinha sido distribuída aos Grupos Parlamentares e aos deputados não inscritos. A partir daí cabe aos mesmos decidir se apresentam ou não um projeto de lei no sentido proposto pelo referendo, não podendo a Ordem dos Advogados obrigá-los a fazê-lo. Verificámos que houve uma deputada não inscrita que apresentou um projeto de lei a consagrar o resultado do referendo, só que o mesmo foi rejeitado pelos demais deputados. A partir daí ficou claro que não há qualquer apoio parlamentar para consagrar o resultado do referendo, ao contrário do que tinha sido prometido pelos seus promotores durante a campanha. Como o mandato parlamentar é livre, a Ordem dos Advogados também não pode obrigar os deputados a votarem uma solução que eles consideram dever ser rejeitada.

Uma eventual integração da CPAS na Segurança Social vai ser o que vai levar à discussão do poder político, caso seja reeleito. Porque desistiu da opção entre CPAS e SS?

A única coisa que o Parlamento aprovou foi a realização de estudos para a integração da CPAS na segurança social, pelo que não sabemos o que desses estudos resultará e o que irá ser decidido. Se for decidida a integração, procuraremos assegurar que os direitos dos atuais contribuintes e dos atuais e futuros pensionistas são salvaguardados. Isto porque a segurança social pode exigir a aplicação total das suas regras, o que implicaria pôr em causa o montante atual das pensões e até a idade a partir da qual são pagas. Por isso é que temos que estar muito atentos para que os direitos dos Advogados não venham a ser lesados por esta iniciativa. Quanto ao sistema de “opt out”, já se viu que nenhum deputado o defende nesta legislatura, uma vez que a autora do projeto de lei que o instituía já nem sequer está no Parlamento. É por isso manifesto que o mesmo não tem condições para ser adotado, pelo menos nos próximos quatro anos, que é o tempo que dura esta legislatura.

Os advogados inscritos no SADT não ganham mal demais para o senhor bastonário querer implementar a sua exclusividade nesse mesmo sistema?

Está a haver alguma confusão nesta pergunta. Nunca defendemos qualquer exclusividade no SADT, que pretendemos que continue a ser assegurado pelos advogados, exatamente como até aqui. Essa é a proposta das listas A e C que defendem o sistema do defensor público, propondo a contratação dos advogados por concurso público limitado a alguns, que ficariam a trabalhar em exclusividade. Da nossa parte repudiamos totalmente esse sistema do defensor público, sendo a Lista J a única lista que garante a manutenção de um SADT aberto e inclusivo, acessível a todos os Advogados que nele queiram trabalhar.

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