Mudar prazo das obrigações de retalho? “Estamos a considerar”

Próximas emissões de Obrigações do Tesouro de Rendimento Variável podem ir além da maturidade de cinco anos, adianta Cristina Casalinho, revelando que "os bancos têm algumas ideias" para novos prazos.

Terminada a quinta emissão de Obrigações do Tesouro de Rendimento Variável (OTRV), Cristina Casalinho revela que as próximas emissões de dívida vocacionadas para as famílias e particulares podem vir a apresentar maturidades além dos cinco anos que têm sido habituais. “Os bancos têm algumas ideias” para novos prazos, diz a presidente do IGCP. Adianta que não vai baixar taxas dos certificados do Tesouro, mas abre a porta a um mecanismo de revisão automática dos juros deste produto.

Considera 10% da dívida pública nas mãos do retalho adequado. Estamos perto desse peso. Isso vai ter implicações ao nível dos produtos de poupança que o Estado oferece?

Não achamos que vá ter qualquer implicação. Mas o facto de o peso que consideramos adequado ser 10% não quer dizer que não aumente o stock. Parece ser um patamar aceitável, sobretudo se confrontarmos Portugal com outros países. Portugal é um dos países onde estes instrumentos ponderam mais. Se pensarmos que eles ponderam mais em países com sistemas financeiros menos desenvolvidos, diria que é mais saudável se as poupanças forem canalizadas para produtos do Tesouro via, por exemplo, seguradoras, fundos de pensões ou fundos imobiliários. É uma maneira mais saudável de financiamento do Estado do que diretamente através deste tipo de produtos.

Porquê?

Porque são produtos mais transparentes, os produtos de mercado são sempre produtos mais transparentes. Não é que a nossa emissão seja uma emissão opaca porque sabemos qual é a taxa, as fichas técnicas são completamente acessíveis por toda a gente. Mas quando temos de caracterizar os instrumentos de financiamento do Estado, os mais ilustres, os considerados de melhor qualidade, os que caracterizam um maior nível de desenvolvimento de um Estado e de uma indústria financeira são os produtos transacionáveis. Nesse sentido, queremos estar mais próximos do que são as melhores práticas ou do que é um grau de desenvolvimento mais elevado.

Mas não precisa de mudar as condições atuais para manter os 10%?

Não, não precisamos de mudar as condições atuais. Se bem que sempre privilegiamos que as condições de remuneração destes instrumentos fossem próximas das remunerações de mercado, que houvesse algum equilíbrio entre a remuneração destes instrumentos com as remunerações de mercado, tendo consciência de que estes produtos têm especificidades e têm níveis de liquidez distintos. Por exemplo, os Certificados do Tesouro Poupança Mais (CTPM) têm níveis de liquidez muito satisfatórios, no sentido em que qualquer pessoa, sob pena de perder os juros corridos, pode pedir um resgate sem outros custos. E há outro aspeto: a nível de gestão do instrumento, que são baratos para o subscritor. O IGCP não cobra comissões de subscrição do produto. São um produto barato para o subscritor, mas para o emitente não é.

E qual é o mais barato para o emitente?

A nível de emissão, as obrigações do Tesouro (OT) são o produto mais barato que temos. Também é uma das razões pelas quais é o produto mais desenvolvido em termos de cadeia de evolução, é o produto do topo da evolução. Por isso é que toda a gente quer emitir, porque é o mais baratinho.

O IGCP baixou a taxa de juro dos CTPM em janeiro de 2015. Tendo em conta o ambiente de juros baixos, pondera baixar novamente a taxa?

Não. O que temos vindo a dizer é que nós gostamos que a remuneração seja o mais próxima de mercado, e gostaríamos que houvesse um mecanismo de atualização mais regular das taxas. Até há pouco tempo, as taxas dos CTPM eram muito próximas das taxas das OT a cinco anos. Só agora mais recentemente é que, com a grande compressão de spreads, é que isso deixou de acontecer, mas até há pouco tempo tinham remunerações muito próximas.

O mecanismo é algo automático?

Gostaríamos que fosse mais ou menos automático, como um mecanismo de revisão semestral ou trimestral ou até anual.

Esse mecanismo tem de partir de quem?

Do IGCP, mas a decisão será sempre do Ministério das Finanças.

Mas já apresentaram essa proposta?

Não.

Ponderam apresentar?

Quando houve uma alteração da taxa em 2015, não houve uma proposta formal por parte do IGCP nesse sentido, mas houve a indicação de que consideramos positivo haver uma evolução nessa direção.

Baixar taxas dos CTPM? Não. O que temos vindo a dizer é que nós gostamos que a remuneração seja o mais próxima de mercado, e gostaríamos que houvesse um mecanismo de atualização mais regular das taxas. (…) Gostaríamos que fosse mais ou menos automático, como um mecanismo de revisão semestral ou trimestral ou até anual.

Cristina Casalinho

Presidente do IGCP

Porque não surgiu essa evolução?

Na altura, não passou de uma conversa sobre esse assunto. Entretanto, com a evolução das taxas de juro, deixou de justificar uma urgência relativamente a esse aspeto. Como tivemos mais prioridades a que dar resposta, colocámos essa discussão de lado.

E agora?

Ainda não pensámos no assunto. Mas não sentimos urgência em mudar, e sobretudo não sentimos urgência por uma razão: e se o Banco Central Europeu (BCE) alterar a política de taxa de juro? E se o BCE for mais agressivo? Enquanto não houver um mecanismo automático de revisão de taxa, temos de ser mais cautelosos. Imaginando que vamos rever agora, e que o BCE em setembro ou janeiro diz que afinal vai ser muito mais célere no abandono das medidas não ortodoxas… Ficamos um bocadinho colocados em cheque. Já demoramos tanto tempo, agora podemos demorar mais algum tempo.

E estão à espera desse passo…

Acho que é importante termos uma maior clareza da evolução das taxas de juro, e neste momento não é absolutamente evidente para nós qual vai ser a evolução. Até porque quer nas taxas em termos absolutos, quer em termos de prémio, se eventualmente chegarmos ao ponto de obtermos a notação de investimento…

Em relação às OTRV, o IGCP prevê mais alguma emissão destas obrigações para o retalho?

Já superamos o nosso objetivo para este ano, pelo menos do que tinha sido inscrito no orçamento: 1,5 mil milhões de contributo de aforro, sendo cerca de um milhar de milhão de certificados de Aforro (CA) e CTPM e 500 milhões de OTRV. Já superamos em ambos os casos o nosso objetivo.

Estão confortáveis…

Sim… Enquanto os CTPM ou os CA são um instrumento em que o IGCP é soberano na decisão, na OTRV resulta de uma parceria. O IGCP utiliza o canal de distribuição e depende dos bons ofícios dos bancos, no sentido de nos alugarem a rede de distribuição. Tem de haver um encontro de vontades. Enquanto nos CA e CTPM temos encontro de vontades entre nós, emitentes e aforristas, no caso da OTRV há mais um parceiro que tem uma palavra a dizer.

Mas da vossa parte já não há essa procura?

Da nossa parte há sempre procura, no sentido em que um dos nossos objetivos é novamente diversificar os instrumentos de financiamento, em primeiro lugar, e depois ampliar a base de investidores.

Se houver vontade do lado dos vossos parceiros, estão disponíveis a fazer mais uma este ano…

A ver vamos. Estamos disponíveis em continuar a usar este instrumento. Se é este ano, se é para o ano, é difícil comprometermo-nos com prazos.

Admite prazos diferentes nas OTRV além dos cinco anos?

É uma hipótese que estamos a considerar. Quer dizer, terá necessariamente de ser equacionada de entre as opções. Há bancos que têm algumas ideias sobre isso.

Podemos saber prazos?

Não, até porque não há nada de concreto.

As OTRV têm sempre oferecido um prémio face ao mercado.

Tendemos a ajustar aos preços do mercado.

Mas isso acontece por causa das elevadas comissões que os bancos cobram?

Não. Nós achámos que era um produto novo e que deveríamos privilegiar os investidores. O prémio tem sido muitíssimo marginal. Nesta OTRV, sim, o prémio é maior, mas nas outras não era relevante. Se tivéssemos um spread do mercado, estaríamos a pensar em taxas muito próximas e, dependendo dos dias, abaixo dos 100 pontos. Passar uma emissão de 190 pontos para 90 ou 100, era um spread de quase metade. Há uma abordagem gradual. Mais uma vez, foi uma decisão conjunta, resultou tudo num consenso que foi gerado.

Nós achámos a OTRV que era um produto novo e que deveríamos privilegiar os investidores. O prémio tem sido muitíssimo marginal. Nesta OTRV, sim, o prémio é maior, mas nas outras não era relevante.

Cristina Casalinho

Presidente do IGCP

Em relação aos CTT. O acordo com IGCP terminou recentemente…

Sim, mas houve um novo contrato assinado. Havia dois contratos, um para os CA e outro para os Certificados de Tesouro (CT). Os de CA expirou em junho ou julho, e outro contrato foi assinado. Os CTPM tinham um contrato que expirou em outubro, mas também já foi renovado.

Há a possibilidade de o Banco CTT vir a vender OTRV?

Nunca abordamos esse tema com os CTT. O que temos vindo a fazer é, havendo alguma manifestação de interesse por parte dos bancos, nós acolhermos essa manifestação. Mas o primeiro passo normalmente é dado pelos bancos. Apenas em casos muito particulares é que não será.

  • Margarida Peixoto
  • Grande Repórter
  • Paula Nunes
  • Fotojornalista

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