Não é só Sines. Lisboa deve receber novos centros de dados, diz responsável da Schneider Electric

A Schneider Electric prevê, com base nos contactos que tem tido com parceiros em Portugal, que sejam instalados em Lisboa centros de dados de até 18 megawatts dentro de um ano.

A Schneider Electric tem-se dedicado a ajudar a melhorar a eficiência de centros de dados, um pouco por todo o continente. O vice-presidente da Divisão de Secure Power da Schneider Electric para a região da Europa, Médio Oriente e África, Rob McKernan, vê Portugal como um destino atrativo para a instalação de centros de dados, em linha com outras grandes referências europeias, e assinala que o interesse não se cinge a Sines: Lisboa também deverá crescer nesta indústria, no horizonte de um ano.

Em entrevista ao Eco/Capital Verde, a propósito de uma visita ao centro de dados que a Schneider ajudou a desenvolver com a Wortmann, em Hannover, na Alemanha, o mesmo responsável indica que se assiste atualmente a uma “explosão” de centros de dados um pouco por todas as indústrias, com uma particularidade: cada vez mais os clientes procuram centros eficientes energeticamente e que recorram a energias renováveis para sustentarem a respetiva atividade.

Quais as indústrias que estão a demonstrar maior interesse em armazenar os respetivos dados em centros de dados?

Diria que todas as indústrias têm algum nível de migração para a cloud. Mas ainda assim há muitas indústrias que guardam os seus dados nas suas instalações ao mesmo tempo que constroem centros de dados. As mais intensivas em dados serão a indústria automóvel, o segmento financeiro e está-se a ver cada vez mais o setor de confeção, porque os dados da atividade são muito úteis para a melhoria de processos. Por isso estamos a assistir a cada vez mais dados a serem recolhidos e com a necessidade de serem processados. Há agora uma espécie de explosão em todos os setores, o que é interessante.

Portugal está especialmente bem posicionado para atrair interesse na área dos centros de dados?

Sim. Historicamente, a Europa esteve mais concentrada em cidades como Frankfurt, Paris, Londres ou Amesterdão, para servirem como grandes cidades no processamento de dados. Mas pensamos que Portugal está, na verdade, muito bem posicionado. E estamos a começar a ver investimento em toda a Península Ibérica, especificamente em Portugal. Começámos a ver esse interesse há cerca de 12 a 18 meses.

E porquê? Há algumas razões. A primeira é a localização. Muita da transmissão de dados requer cabos largos que passam por debaixo de água, e Portugal tem uma posição privilegiada para comunicar com África e os Estados Unidos. Se não houver conectividade, não se pode tornar um país num grande centro de dados.

A segunda razão é a penetração de renováveis, em torno dos 50%. Portugal é um dos líderes na Europa do sul no que diz respeito às energias renováveis, então torna-se uma localização mais eficiente para construir centros de dados.

Em terceiro e último lugar, no país está a crescer uma força de trabalho muito instruída tecnicamente. Então têm boa conectividade, boa independência energética, eficiência energética e trabalhadores técnicos. Para nós, estes são os fatores essenciais para construir um bom mercado de centros de dados.

Uma das variáveis que ajuda à eficiência energética de um centro de dados é estar num país frio, que permite o consumo de menos energia para arrefecer os equipamentos. Portugal não é um país frio. Isso é um grande problema, ou pode vir a ser?

É um fator, mas não o único. Se fossemos a um extremo, estaríamos apenas a construir centros de dados na Finlândia e na Sibéria. Sim, pode ajudar na eficiência ser-se um país frio, mas se se estiver a ir buscar energia ao sol, vento e outras renováveis, isso poderá ser mais relevante.

Aqui em Portugal ouvimos sobretudo falar de centros de dados em Sines. Considera que esta é a única área em Portugal com grande potencial para receber estes centros?

Certamente será a número um, com o Start Campus. Mas também estamos a começar a ver outras empresas a iniciarem atividade em Lisboa. Não no centro, mas sim nas áreas circundantes. Estamos a trabalhar com alguns clientes para começar esses projetos. Então, veremos Lisboa também como um sítio atrativo para instalar centros de dados.

O que estão a desenvolver em Lisboa?

O que estamos a fazer é assegurarmo-nos de que, se um país ou determinada área vai tornar-se mais atrativa para investir, como é o caso de Portugal, temos recursos no país. Em Portugal, instruímos os nossos parceiros e empresas terceiras sobre práticas sustentáveis nos centros de dados, e tentamos assegurar que temos um ecossistema que consiga apoiar a construção. Desde que surgiu o projeto do Start Campus, temos vindo a fazer isto.

Mas há investimentos na calha para centros de dados em Lisboa? Quais?

Estamos a prever entre 8 a 15 megawatts [de capacidade instalada] dentro de um ano, e depois aumentará. Quando há investimento em centros de dados numa área, e no ecossistema que os sustenta, começa-se a ver um efeito de digitalização. Assistiu-se a isso em várias cidades, como é o caso de Zurique, há uns anos. Agora, está a acontecer em Atenas e Varsóvia. E estamos a começar a ver acontecer o mesmo em cidades da Península Ibérica, como Lisboa e Madrid. Então estamos muito entusiasmados acerca de ambos os países.

Então prevê que dentro de um ano, em Lisboa, sejam instalados centros de dados com 5 a 18 MW de capacidade…

…e irá crescer exponencialmente a partir daí.

Quanto? Digamos, por exemplo, até 2025?

Isso é difícil de prever. Mas deverá existir crescimento consistente na região por pelo menos 3 a 5 anos, baseando-me na experiência de outras cidades. Parece que Portugal passará pelo mesmo processo que cidades como Zurique e Copenhaga, começando, obviamente, em grande, com Sines.

Então o crescimento que prevê para Portugal é mais ou menos o mesmo que para outras cidades europeias. Não as supera.

Até agora, diria que está em linha com outras cidades. Mas é isso [essa evolução] que será mais interessante. Se o Governo incentivar mais investimento, e existir uma rede estável de renováveis, pode andar ainda mais rápido, especialmente por causa da localização.

Então, veremos que territórios mais prosperarão depois de iniciado o movimento também por cá. Para já, o Start Campus, em Sines, tem grandes dimensões [495 MW]. Não esgota a capacidade do país para receber centros de dados?

É enorme. Mas os megawatts do Start Campus ainda são de pequenas dimensões em comparação com o que se vê na cidade de Frankfurt, e há muitos outros. Em Frankfurt e Amesterdão temos centros quatro a cinco vezes maiores. [O Start Campus] não tem dimensões assim tão relevantes, mas gostamos do projeto dada a eficiência energética do mesmo. É um dos melhores. Mas, diretamente à questão: a disponibilidade de energia no país não é uma preocupação de momento [no que diz respeito à construção de centros de dados].

A crise energética não será uma dificuldade relevante para os centros de dados no curto a médio prazo, porque podem não ser tidos como prioritários para o uso de energia?

A maioria das empresas com centros de dados estão a trabalhar com as autoridades nacionais para ajudar. Os centros são usados principalmente durante o dia, quando as pessoas estão a trabalhar. Por isso podem ser fornecedores de energia durante a noite. Os operadores de centros de dados estão a trabalhar com as empresas energéticas nesse sentido. Assim sendo, não estou demasiado preocupado com este assunto, mas podem de facto haver dificuldades se alguns países tiverem um inverno realmente frio, mas não são uma maioria.

No pior cenário, os centros de dados teriam de parar por longos períodos de tempo?

Horas. Podem parar por exemplo em 50% durante a noite, há diferentes estratégias possíveis. Mas claro, os operadores dos centros não querem ir por aí, e estão a trabalhar com os governos tanto quanto podem para ajudar a controlar os picos de uso de energia. De qualquer forma, não seriam completamente interrompidos, porque temos parte da economia dependente deles. Não seria possível, por exemplo, encomendar comida online, coisas deste género. Aquilo para o qual precisamos dos centros de dados é quase tão importante como ter eletricidade no geral.

Mencionou, na intervenção desta manhã, que há centros de dados que não recorrem de todo a energia renovável. É este o cenário mais comum?

Na Europa, o mais comum seria uma percentagem baixa de renováveis, não zero. Nos Estados Unidos, ou a este, é muito mais comum existirem centros sem recurso a renováveis. Diesel, carvão… combustíveis fósseis no geral.

Há um melhor retorno do investimento quando o centro usa energia renovável ou os combustíveis fósseis ganham esta batalha?

Depende de onde se estiver e do acesso que se tem a cada tipo de energia. Mas já não vejo ninguém a fazer uma decisão dessa forma, “vou usar carvão porque é mais barato”. Porque não é muito mais barato, se o for sequer, e provém por exemplo da Rússia, pelo que há estes outros fatores a ter em consideração. E os clientes dos centros de dados estão a fazer estas questões. Quando querem propostas, perguntam pela eficiência energética, e favorecerão cada vez mais aqueles que usem renováveis.

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