“Quando a TAP for detida por uma grande multinacional não vai crescer”

Michael O'Leary, CEO da Ryanair, diz que seria ilegal a ANA começar a cobrar taxas mais altas aos passageiros do Humberto Delgado para pagar um aeroporto que só abrirá dentro de 15 anos.

Fiel ao seu estilo fleumático, o CEO da Ryanair deixa fortes críticas à intenção da ANA de financiar o novo aeroporto de Lisboa com o aumento das taxas aeroportuárias já a partir de 2026. Michael O’Leary diz também que a privatização da TAP é inevitável, mas que quando for adquirida pela IAG, Lufthansa ou Air France-KLM deixará de crescer.

A ANA terá de consultar as maiores companhias aéreas do aeroporto de Lisboa sobre o seu projeto para a nova infraestrutura no Campo de Tiro de Alcochete. O que é que a Ryanair vai responder?

Acho que é uma resposta de duas palavras, sendo que a primeira começa com F e a segunda é “off”. E tenho quase a certeza de que essa será a resposta unânime de todas as companhias aéreas. Na verdade, isso viola a legislação da UE. Um aeroporto regulado não pode cobrar aos clientes ou consumidores por uma infraestrutura que promete fornecer só daqui a 15 anos. Portanto, é ilegal.

A Ryanair vai contestar nos tribunais?

Acho que nem sequer teremos essa hipótese. Acho que o Governo português também está contra isso. A ANA pertence à Vinci. A Vinci é um monopólio francês muito rico. Tem dinheiro para investir em aeroportos no Reino Unido e na América Latina, etc. Se querem desenvolver Alcochete, que paguem por Alcochete. Mas só podem cobrar aos passageiros de Alcochete quando o aeroporto abrir, em 2040 ou 2050.

As taxas serão pagas pelos passageiros que utilizarem Alcochete. Não podem ser pagas pelos passageiros que usam Faro, Porto ou Portela.

Acredita então que existe uma alternativa para financiar o projeto sem aumentar as taxas para os passageiros?

As taxas serão pagas pelos passageiros que utilizarem Alcochete. Não podem ser pagas pelos passageiros que usam Faro, Porto ou Portela.

Ainda estão à espera que o Governo responda ao plano apresentado no ano passado para duplicar o número de passageiros da Ryanair em Portugal?

Estamos à espera que o governo nos responda sobre o nosso plano. Apresentámos um plano para duplicar o tráfego de 13 para 27 milhões de passageiros. Acreditamos que podemos concretizá-lo nos próximos cinco anos. Se aumentarmos a capacidade da Portela e a ANA reduzir as suas elevadas taxas aeroportuárias, há muito potencial de crescimento. Mas continuamos à espera da resposta do governo.

Mas existem contactos?

Ainda estamos a falar com o Governo e a encorajá-lo. A ANA disse ao Governo que não há nada que possa fazer na Portela e que Alcochete é muito difícil e vai demorar mais tempo e ser mais caro do que esperava e por isso são necessários aumentos agora para Alcochete em 2040. Precisamos de mais concorrência aqui [Lisboa]. Em Faro, no Porto e na Madeira mostrámos que somos capazes de entregar crescimento, mas não conseguimos em Lisboa porque há uma restrição artificial à capacidade.

Mas ANA tem um investimento planeado para a Portela, que também passará por um aumento de capacidade.

Não têm de fazer nenhum investimento na Portela, só têm de refazer a capacidade. O terminal consegue processar mais passageiros. Duas coisas mudaram nos últimos dez anos: os passageiros viajam com muito menos malas, por causa das taxas sobre as bagagens, e fazem o check-in online. Já não se veem balcões com grandes filas nos aeroportos. A capacidade dos terminais, com investimentos mínimos, está a aumentar 40% e 50%. Se o fizessem na Portela a capacidade poderia passar para 40 milhões de passageiros.

Já falaram com a ANA sobre a ideia de usar o mesmo espaço do terminal da Portela, reconfigurando-o para aumentar a capacidade?

Com certeza. Eles dizem que não é possível fazer isso, porque querem aumentar as taxas. Não querem aumentar a capacidade. Se aumentassem a capacidade, teriam de baixar as taxas, mas conseguiriam mais volume e mais tráfego, como acontece num supermercado. E essa seria a nossa solução preferida. Mas a ANA diz: “Não nos interessa. Só queremos aumentar os preços todos os anos.” E é isso que fazem os monopólios aeroportuários.

O verdadeiro problema é que, uma vez pertencendo a uma destas grandes multinacionais, a TAP não vai crescer. Não vão investir em mais aviões na Portela, nem no aumento do tráfego.

A TAP deve ser privatizada este ano?

Acho que sim.

Qual é o melhor comprador?

Não nos cabe a nós decidir. No final, é uma decisão do Governo português. Claramente, a Lufthansa, a Air France e a IAG já manifestaram interesse em comprar a TAP. Mas não achamos que isso faça grande diferença. O verdadeiro problema é que, uma vez pertencendo a uma destas grandes multinacionais, a TAP não vai crescer. Não vão investir em mais aviões na Portela, nem no aumento do tráfego. E isso já se viu com todas as outras companhias aéreas que compraram. A Lufthansa comprou a Sabena, que agora é a Brussels Airlines, comprou a Austrian, comprou a Swiss. Nenhuma delas cresceu.

Mas a Aer Lingus, que foi comprada pela IAG, está a crescer. A Iberia também está a crescer.

A Aer Lingus não está a crescer. A Aer Lingus não cresce há cerca de cinco anos. Agora, fazem um ótimo trabalho na gestão. No passado, a empresa dava prejuízo todos os anos e o Governo e os contribuintes irlandeses tinham de a resgatar. Agora já não dá prejuízo, mas também não cresce significativamente.

Então qual seria a alternativa?

Não creio que haja alternativa. A consolidação está a acontecer em toda a Europa. Os contribuintes italianos já não querem resgatar a Alitalia a cada quatro ou cinco anos. Os contribuintes portugueses também não querem resgatar a TAP a cada quatro ou cinco anos. É inevitável que venha a ser propriedade de uma das grandes companhias aéreas, o que significa tarifas mais caras e provavelmente nenhum crescimento. Mas, neste momento, a TAP já tem tarifas altas e não cresce, e os contribuintes portugueses têm de pagar milhares de milhões de euros a cada quatro ou cinco anos. Portanto, será um desfecho melhor. A verdadeira questão é: como é que Portugal pode continuar a crescer no turismo e na economia nos próximos cinco ou dez anos? A resposta passa por trabalhar com a Ryanair. Somos a maior companhia aérea em Portugal e temos um plano para duplicar o nosso tráfego.

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