A hora do regime fiscal do Hidrogénio Verde – Primeiras Reflexões
A Economia do Hidrogénio veio para ficar, com um papel de destaque a ser agora ocupado pelo Hidrogénio Verde, particularmente atendendo ao seu inequívoco potencial de proliferação nas próximas décadas
1. A inevitabilidade da Economia do Hidrogénio Verde
Nos termos do Acordo de Paris, o objetivo principal dos Estados que ao mesmo se vincularam versa sobre a limitação ao aumento da temperatura média à escala global abaixo dos 2ºC em relação aos níveis pré-industriais, encetando ainda esforços para limitar o referido aumento em torno de valores de 1,5ºC.
No essencial, esta meta será alcançada através da implementação de um conjunto amplo e diversificado de medidas que limitem ou reduzam muito significativamente a emissão global de Gases com Efeito de Estufa (GEE), tais como o Dióxido de Carbono (CO2), o Metano (CH4), o Óxido Nitroso (N2O) ou ainda os próprios Perfluorcarbonetos (PFC’s).
É justamente neste contexto que surge o papel do Hidrogénio – em especial, o Hidrogénio Verde (obtido através da eletrólise aquosa) –, não apenas no contributo geral para a transição energética nacional, como, de modo ainda mais particular, para a progressiva redução das componentes (integrais ou residuais) de Dióxido de Carbono nos diversos segmentos da atividade económica nacional, com destaque para os transportes e a indústria.
Nessa medida, pode já dizer-se, sem particulares reservas, que a Economia do Hidrogénio (expressão originalmente atribuída ao célebre relatório de Lawrence W. Jones, de 1970) veio para ficar, com um papel de destaque a ser agora ocupado pelo Hidrogénio Verde, particularmente atendendo ao seu inequívoco potencial de proliferação nas próximas décadas.
Nesse contexto, urge convocar uma das mais importantes dimensões que qualquer novo vetor energético comporta: o seu regime fiscal, ou, na sua ausência, alguns dos princípios ou elementos que o poderão nortear, com base em critérios de eficiência e adequação seletiva.
2. O papel da política fiscal na Estratégia Nacional para o Hidrogénio (EN-H2)
A política fiscal é objeto de enfoque por parte da Estratégia Nacional para o Hidrogénio (EN-H2), pese embora em termos necessariamente breves e seguindo uma base ainda programática.
Deste modo, podem resumir-se as perspetivas de orientação do que virá a ser (e em parte já é) o regime fiscal do Hidrogénio Verde nos seguintes moldes:
- Em primeiro lugar, a implementação de benefícios fiscais, como normalmente sucede em relação a novos vetores energéticos, especialmente de base renovável;
- Em segundo lugar, a implementação de discriminações positivas (em prol do Hidrogénio Verde); e
- Em terceiro e último lugar, alterações à Fiscalidade Verde, antecipando-se o consequente reforço da tributação do Carbono e a respetiva consignação de receitas, presumivelmente ao Fundo Ambiental – sobretudo num momento em que, nos termos da Lei do Orçamento do Estado para 2021, o Governo procede à incorporação, neste último, do Fundo Florestal Permanente, do Fundo de Apoio à Inovação, do Fundo de Eficiência Energética e do Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético.
3. O especial enfoque na tributação do consumo e nos créditos fiscais
Pela nossa parte, tendo dedicado algum estudo e reflexão à temática do Hidrogénio Verde nos últimos anos, incluindo no que concerne à sua dimensão fiscal, entendemos que as orientações programáticas da EN-H2 em matéria de política fiscal poderão levar à implementação de medidas a três níveis essenciais, uma primeira no plano micro e duas outras no mais lato plano macro:
- No plano micro, antecipamos a proliferação de isenções na ótica dos Impostos Especiais sobre o Consumo (neste caso, avançando na direção já trilhada pela Lei do Orçamento do Estado de 2021) e do próprio IVA – sendo de destacar que, no contexto comparado, a Estratégia Nacional do Hidrogénio da Noruega já prevê expressamente a implementação de isenções de IVA para a aquisição de veículos movidos a Hidrogénio.
- No plano macro, antecipamos igualmente a aplicação generalizada de mecanismos de crédito fiscal ao investimento (produtivo), com eventual especificação de aplicações relevantes para os projetos relativos ao Hidrogénio Verde, sobretudo com conexão (ainda que indireta) aos custos avultados dos eletrolisadores.
Nessa medida, até pela modesta receita fiscal associada, parece-nos particularmente dificultada uma orientação que passe pela criação de isenções de grande amplitude ao nível de um imposto como o IRC, antecipando-se, ao invés, o aproveitamento e/ou melhoramento de regimes já existentes de apoio a despesas relevantes e com indissociável relação à atividade operacional, de que poderá servir como exemplo o Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento II (CFEI II). - Ainda no plano macro, salientamos ainda o potencial relevo atribuído a:
- Subsídios ao abate, sobretudo em relação a projetos de reconversão (ex: reconversão ferroviária dos equipamentos a Diesel para Hidrogénio Verde ou reconversão de ativos de Gás Natural para Hidrogénio), sobretudo nos casos em que a reconversão se reflete numa perda de valor de uso de determinados ativos ainda por depreciar/amortizar;
- Regimes de depreciações/amortizações aceleradas no caso de projetos híbridos (produção de Hidrogénio associada a centrais solares e eólicas já existentes), sobretudo caso tal implique um mecanismo de substituição de tarifas feed-in).
4. As tarifas como parte do regime fiscal do Hidrogénio Verde
Uma última nota para referir que a componente tarifária é, pela sua própria natureza, parte do regime fiscal do Hidrogénio. Como tal, sobretudo no segmento do Power-to-Gas, será sobremaneira relevante atentar à implementação de isenções particularmente relevantes, como a anunciada, na EN-H2, ao nível de uma isenção total ou parcial de Tarifas de Acesso às Redes para a injeção de Hidrogénio nas redes de Gás Natural (transporte e distribuição).
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