A importância da advocacia preventiva em Direito da Concorrência

  • Miguel Marques de Carvalho
  • 29 Novembro 2022

Parece-nos fortemente recomendável que as empresas procedam a uma avaliação jurídica atempada e cuidadosa das suas práticas de mercado, para prevenir situações que possam culminar em investigações.

Desde a criação da Autoridade da Concorrência (AdC) e sobretudo nos anos mais recentes, tem sido intensa a aplicação do regime de proteção da concorrência em Portugal. Curiosamente, não se tem valorizado devidamente o impacto que as regras de proteção da concorrência em geral, e a atuação da AdC em particular, podem ter na economia e na atividade das empresas.

Ao contrário do que sucede com a regulação setorial, o regime de concorrência é de largo espectro, estendendo-se a todas as áreas da economia. A AdC tem dois grandes domínios de intervenção: o controlo prévio de concentrações de empresas e o controlo de práticas restritivas da concorrência. São múltiplas as indústrias ou atividades que foram já alvo da intervenção da AdC. Pense-se, v.g., nos setores financeiro e energético, mas também no retalho alimentar, nas ordens profissionais e na contratação pública.

No domínio do controlo de concentrações, são conhecidos vários casos em que as transações notificadas não puderam avançar por oposição da AdC. São também cada vez mais frequentes os casos de aplicação de sanções pelo facto de as empresas terem implementado concentrações sujeitas a controlo prévio, antes de obterem a necessária autorização da AdC.

No plano do controlo de práticas restritivas da concorrência, as sanções por violação de regras de concorrência podem chegar a 10% do volume de negócios anual do grupo económico a que pertence a empresa infratora. Este ano, só até setembro, a AdC já tinha alocado um total de coimas superior a 470 milhões de euros. As empresas podem ainda ficar, em certas situações, sujeitas a sanções acessórias, como a proibição de participação em procedimentos de contratação pública. Administradores e diretores de empresas também estão sujeitos à aplicação de sanções.

Mas a exposição das empresas ao direito da concorrência em Portugal não se fica por aqui. Recentemente, foi transposta para o ordenamento jurídico português uma diretiva europeia que visa facilitar e agilizar as ações de responsabilidade civil por violação das regras de concorrência. Trata-se de um regime legal que tem contribuído para dinamizar em Portugal as ações de responsabilidade por infrações às regras de concorrência, muitas delas na forma de ações populares. Frequentemente, estas ações são intentadas na sequência de decisões condenatórias da AdC, ou de outras autoridades, como a Comissão Europeia.

Neste contexto, justifica-se valorizar a advocacia preventiva em direito da concorrência. Importa assinalar, a este propósito, que as regras de proteção da concorrência não são, na sua larga maioria, de interpretação fácil e imediata, implicando a mobilização de conceitos jurídicos e económicos que se revestem de alguma complexidade. Por outro lado, no que tange a práticas suscetíveis de restringir a concorrência, as empresas estão mesmo obrigadas fazer a sua própria análise de risco, uma vez que a AdC não faz avaliações prévias de práticas comerciais ou de acordos entre empresas.

Tendo tudo isto em conta, parece-nos fortemente recomendável que as empresas procedam a uma avaliação jurídica atempada e cuidadosa das suas práticas de mercado, para prevenir situações que possam culminar em investigações e eventuais punições, e ainda no pagamento de elevadas indemnizações. Com efeito, o risco de exposição financeira e reputacional, bem como a imprevisibilidade associada a processos longos e de desfecho incerto, podem ser acautelados com eficácia, se as empresas apostarem na prevenção, valendo-se do adequado apoio jurídico.

  • Miguel Marques de Carvalho
  • Sócio e coordenador do núcleo de Europeu e Concorrência da Miranda

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