A poupança tradicional é o maior engano financeiro

Quem não investe, empobrece. E a escolha é simples: Continua a ser um espectador passivo da erosão do seu património, ou assume o papel de protagonista financeiro da sua vida.

Há uma diferença abissal e, para muitos, dolorosa entre guardar dinheiro e criar riqueza. Em Portugal, a cultura financeira dominante continua presa ao primeiro conceito. Somos um país de aforradores conservadores, confortáveis com a ilusão da segurança nominal, enquanto ignoramos quase com orgulho a destruição real e contínua do nosso poder de compra. A matemática não mente: quem estacionou as poupanças nos instrumentos tradicionais das últimas duas décadas não enriqueceu, empobreceu e de forma significativa.

Basta olhar para os dados do INE e da Pordata relativos aos últimos 25 anos de 1999 a 2024. Assistimos à estabilidade inicial do euro, ao período de deflação técnica durante a intervenção da Troika e mais recentemente ao choque inflacionista de 2022 e 2023, com valores próximos de 8 por cento e 4 por cento. A média deste quarto de século situa se entre 2,3 por cento e 2,5 por cento ao ano.

Este número aparentemente modesto é devastador quando aplicado ao tempo. A inflação acumulada não se limita a comer um bocadinho todos os anos. Corrói de forma exponencial. Uma inflação média de 2,5 por cento durante 25 anos não resulta em 62 por cento de aumento dos preços. Resulta em muito mais, dependendo do consumo, e significa que 10.000 euros parados desde 1999 valem hoje uma fração do seu valor inicial. A inflação é na prática um imposto sobre a inércia. E os portugueses pagam-no religiosamente.

O retrato piora quando observamos onde o capital nacional costuma repousar: Certificados de Aforro e Depósitos a Prazo.

Os Certificados de Aforro foram durante décadas o porto seguro do aforrador. A antiga Série E indexada à Euribor chegou a oferecer taxas brutas de cerca de 3,5 por cento. Mas com o fim desta série e a introdução da Série F, o retorno base desce para 2,5 por cento brutos. Depois dos impostos, o rendimento líquido cai para valores inferiores a 2 por cento. Com uma inflação semelhante ou superior, o aforrador não está a ganhar nada. Está apenas a evitar afogar-se sem nunca avançar.

Já os Depósitos a Prazo são o expoente máximo do desrespeito pela poupança. Durante anos pagaram quase zero e, em 2025, pouco mudou: a taxa média dos novos depósitos caiu para cerca de 1,34 % (agosto de 2025), apesar das taxas diretoras do BCE se manterem nos 2%. Mesmo os depósitos promocionais raramente ultrapassam 2 % a 2,5 % brutos. Na prática, colocar dinheiro num depósito a prazo não é investir. É aceitar um empobrecimento lento enquanto a banca preserva margens confortáveis.

E depois vem o mito dourado dos Planos Poupança Reforma, os PPR. Muitos portugueses acreditam que estão a preparar a reforma. Na realidade, estão a sustentar produtos com comissões excessivas e rentabilidades anémicas. Grande parte dos PPR tradicionais, sobretudo os associados a seguros de capital garantido, entrega rendibilidades de 1 por cento a 2 por cento ao ano. Entre comissões de 1 por cento a 2 por cento e carteiras subjacentes extremamente conservadoras, o investidor fica com quase nada. O benefício fiscal é pequeno e quando comparado com o custo de oportunidade de perder ganhos de 7 por cento ou 8 por cento ao ano noutros ativos torna se praticamente irrelevante. Salvas algumas exceções de fundos bem geridos e com exposição acionista, a maioria dos PPR serve sobretudo para enriquecer bancos e seguradoras, não os futuros reformados.

Perante este cenário, a pergunta impõe se: o que fazer? A resposta exige informação e coragem: apostar em ativos que protegem o poder de compra e criam riqueza real, como o investimento em ações e no imobiliário.

O mercado acionista global tem sido historicamente uma das formas mais poderosas de combater a inflação. Índices como o S&P500 ou o MSCI World apresentam retornos anualizados na casa dos 7 por cento a 10 por cento ao longo de várias décadas. Investir em ações não é jogar na bolsa. É tornar-se sócio de empresas que aumentam preços, protegem margens e capitalizam crescimento económico. Hoje, graças aos ETF de baixo custo, o investidor português pode aceder facilmente a estes mercados com transparência, liquidez e custos mínimos.

No imobiliário as rendas, atualizadas anualmente pelo coeficiente de inflação, garantem um fluxo de rendimento que acompanha o custo de vida para além de permitirem a valorização do ativo se numa boa localização. Mas há outra via que os portugueses continuam a ignorar: os fundos imobiliários e os REIT, que permitem investir em ativos imobiliários diversificados com entradas mínimas reduzidas, liquidez muito superior e rendibilidades historicamente atrativas. Estes fundos expõem o investidor a centros comerciais, logística, escritórios ou habitação sem a necessidade de endividamento nem da gestão direta do imóvel. Quer através de imóveis físicos, quer através de REIT, o imobiliário continua a ser um ativo real por excelência, capaz de preservar valor, gerar rendimento e funcionar como uma das defesas mais eficazes contra a erosão inflacionista.

E agora o ponto crucial, a mudança de mentalidade.

A passividade financeira deixou de ser apenas um erro. Tornou se uma ameaça direta ao bem-estar futuro. O velho mantra português de que poupar é seguro e investir é arriscado pertence a um país que já não existe. Hoje, o risco maior é ficar parado. Se continuar a alimentar depósitos miseráveis, Certificados de Aforro de rendimento insuficiente e PPR tóxicos, então não está a ser prudente. Está a ser cúmplice da sua própria perda de riqueza.

A verdade é brutal, mas libertadora: quem não investe, empobrece. E a escolha é simples: Continua a ser um espectador passivo da erosão do seu património, ou assume o papel de protagonista financeiro da sua vida. O futuro não recompensa quem guarda (isso só na história do Tio Patinhas), antes recompensa quem investe.

  • Colunista convidado. Economista e professor na FEP e na PBS

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

A poupança tradicional é o maior engano financeiro

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião