Editorial

Costa Silva, a Efacec e um dia (in)feliz

O desfecho da Efacec era previsível. Os contribuintes pagaram 400 milhões para um fundo fechar unidades de negócio e despedir trabalhadores. Merecia uma comissão de inquérito.

O Governo PS merecia perder as eleições legislativas por uma mão cheia de razões, e a Efacec é uma das mais graves. No dia 1 de novembro passado, seis dias antes da demissão de António Costa, o ministro da Economia anunciava ao país “um dia feliz”, uma venda da empresa ao fundo Mutares que custou pelo menos 400 milhões de euros aos contribuintes. Hoje, sabe-se que o novo acionista vai fechar negócios e despedir trabalhadores, como era previsível. Continua a ser “um dia feliz” senhor (ainda) ministro?

A notícia foi avançada pelo Expresso este fim de semana. “O fundo alemão Mutares (…) começou a fazer a lista dos trabalhadores a dispensar logo em novembro, quando entrou. Foi no final de fevereiro que o grosso das saídas, através de rescisões por mútuo acordo, aconteceu“. Fecham-se áreas de negócio, despedem-se trabalhadores, tudo pago pelos contribuintes. Tudo mais do que esperado, tudo previsível, tudo o que deveria ter sido feito pelos acionistas privados, sem dinheiro público, em julho de 2020, quando o ministro Pedro Siza Vieira decidiu nacionalizar a empresa por razões que, ainda hoje, a razão desconhece.

António Costa Silva chegou à Economia. Semana após semana, mês após mês, o ECO revelou o crescente buraco financeiro da Efacec, e o fardo pesado que recairia em cima dos contribuintes. Mas o Governo e o ministro em particular arranjaram sempre mil argumentos para tentarem desmentir o que as contas mostravam. Falharam operações de venda e, já nesta última, o ministro da Economia chegou a dizer, sem pudor, que o Estado poderia recuperar parte ou eventualmente a totalidade dos fundos públicos usados para manter a Efacec, uma dita empresa estratégica, ligada à máquina. Acumulou milhões de prejuízos e perda de negócio.

Com a crise política, o ministro Costa Silva conseguiu escapar-se a prestar os esclarecimentos que, em circunstâncias normais, seriam mais do que obrigatórias. O caso Efacec foi uma fraude política, a justificar uma comissão de inquérito. Pela nacionalização, pela forma como foi vendida, até porque havia outras propostas alternativas e nunca se soube as razões, as contas, que levaram o Governo a escolher a Mutares. E já agora seria também muito importante saber os custos associados com esta operação, entre assessores e comissões financeiras.

O fundo alemão está a fazer o que lhe interessa, só entrou neste negócio porque poderia tomar estas decisões e recebeu, ainda por cima, um enorme cheque dos contribuintes portugueses. O que é incompreensível é a posição do Governo, a falta de respeito pelo dinheiro dos contribuintes, o engano permanente. 400 milhões de euros é uma fortuna, daria para pagar a totalidade da recuperação do tempo de serviço aos professores, e ainda sobraria dinheiro. Escrevi aqui no Login em novembro:

  • António Costa Silva prestou-se a um triste papel, o de enganar os portugueses para justificar o injustificável. O que Costa Silva patrocinou foi uma ajuda de Estado, com dinheiro dos contribuintes, a um fundo alemão, para salvar o Governo do ponto de vista político. Não salvou a EFACEC, nem a tecnologia portuguesa, salvou o Governo com dinheiro público, deu um bilhete de lotaria ao fundo Mutares. Uma das perguntas a que tem de responder quando for ao Parlamento é mesmo se este negócio tem alguma coisa de parecido com a proposta que foi apresentada pela Mutares na chamada BAFO (Best and Final Offer), a última proposta vinculativa e que tinha como concorrente um consórcio industrial português que se propunha injetar 70 milhões na Efacec”.

O que se sabe hoje com a reestruturação da Efacec confirma cada uma destas linhas. Os contribuintes pagaram uma fatura elevada, o Governo usou fundos públicos para comprar a paz social em 2020 com o PCP e depois foi uma fuga para a frente, até ao dia de hoje. Um dia feliz!? Só se for pela constatação de que, depois de 10 de março, Costa Silva não voltará a ser ministro da Economia.

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