Direito à reparação não é só teoria

Atualmente, 65% dos consumidores europeus optam por substituir os produtos defeituosos em vez de os reparar, o que produz mais de sete milhões de toneladas de resíduos por ano.

Em 22 de março de 2023, a Comissão Europeia publicou uma proposta de diretiva sobre o direito à reparação, que se caracteriza por dois grandes méritos.

O primeiro mérito está no aspeto formal, pois demonstra o elevado grau de coerência da ação da Comissão Europeia nos últimos anos em questões relacionadas com o ambiente e a defesa do consumidor.

Essa coerência está presente em duas vertentes: em primeiro lugar, na cronologia, dado que as propostas estão perfeitamente alinhadas, começando pelo Pacto Ecológico, em dezembro de 2019, passando pelo Plano de Ação para a Economia Circular, em março de 2020, seguido da Nova Agenda do Consumidor, em novembro de 2020, o que revela uma dinâmica constante.

Em segundo lugar, essa coerência é ilustrada pelos temas abordados, que correspondem a todas as faces do problema. Assim, o tema da produção é tratado na Diretiva Conceção Ecológica, os aspetos relacionados com a venda são abordados na diretiva relativa à capacitação dos consumidores para a transição ecológica, de março de 2022, e na Diretiva Alegações Ecológicas, de março de 2023, e, por último, a questão do fim da vida útil do produto é abrangida pela Diretiva Direito à Reparação, de março de 2023.

O segundo mérito da diretiva em análise reside no facto de abordar uma questão importante que afeta todos os cidadãos da UE. Atualmente, 65% dos consumidores europeus optam por substituir os seus produtos defeituosos em vez de os reparar, o que produz mais de sete milhões de toneladas de resíduos por ano no setor dos equipamentos elétricos e eletrónicos. O impacto social é igualmente importante, uma vez que esta situação conduziu a um declínio acentuado das profissões de reparação na Europa.

A proposta da Comissão constitui um marco importante na implantação de uma economia circular na Europa. Entre as propostas principais, há que salientar a primazia da reparação em detrimento da substituição, a introdução de um formulário para informar os consumidores das condições do serviço de reparação e a criação de uma plataforma em cada Estado-membro para que todas as pessoas possam encontrar uma oficina de reparação perto de si.

Embora todas estas propostas sejam excelentes, para que o direito à reparação se concretize verdadeiramente, será necessário aumentar o nível de ambição. Há quatro fatores que ilustram essa necessidade:

  • Primeiro, a Comissão Europeia conta exclusivamente com um mecanismo de informação. Em vez de informar o consumidor sobre a irreparabilidade de determinados produtos, teria sido certamente mais eficaz proibir a venda de tais produtos no território europeu.
  • Além disso, poderiam prever-se formas bastante simples de incentivar a reparação. Por exemplo, a reparação de um produto durante o período de garantia legal poderia permitir uma prorrogação do período de garantia. A Comissão decidiu em contrário.
  • Será também necessário lançar um programa abrangente de formação em competências de reparação. A atividade neste domínio mudou profundamente e todas as reparações que anteriormente eram mecânicas, hoje em dia, baseiam-se sobretudo em conectores.
  • Por último, a Comissão excluiu a possibilidade de soluções mais inovadoras, como a impressão 3D ou o recondicionamento.

A Comissão está empenhada em seguir uma trajetória importante na via de um consumo mais sustentável. Não obstante, para que os consumidores sejam verdadeiros intervenientes na transição ecológica e na luta contra as alterações climáticas, terá de reforçar as suas ambições.

  • Relator do parecer do CESE sobre a iniciativa da Comissão Europeia "Direito à reparação". É representante da ONG francesa "Fondation pour la nature et l'homme" e colaborador científico da Universidade Católica de Leuven, na Bélgica.

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