Entre a ciência e a incerteza: como bancar um futuro mais sustentável?
Na esfera nacional, o BCE estima que Portugal seja o país da zona euro com maior necessidade de investimento verde em % do PIB por ano (>7%).
A emergência climática e ecológica, cuja gravidade se multiplica ano após ano, tem acelerado o crescimento de riscos prementes para a resiliência, bem-estar e prosperidade das sociedades contemporâneas. De acordo com o mais recente relatório sobre o Estado Global do Clima, confirma-se que 2023 foi o ano mais quente de sempre, tendo batido recordes em todos os indicadores climáticos existentes. Já a Agência Europeia do Ambiente indica que a Europa é o continente com o aquecimento mais acelerado em todo o mundo, cujos impactos negativos têm um efeito multiplicador, predominante nos países do Sul, em 5 dimensões críticas do desenvolvimento: saúde dos ecossistemas; resiliência das infraestruturas; segurança alimentar; saúde pública; e estabilidade dos sistemas económicos e financeiros.
No campo das soluções, o setor financeiro reveste-se de enorme importância. Com um papel de influência sistémica nas apostas dos agentes económicos, tem a capacidade de (re)orientar recursos financeiros para empresas e projetos alinhados com a jornada do desenvolvimento sustentável.
Não obstante o aumento significativo dos fluxos anuais médios de financiamento climático, os quais duplicaram entre os últimos 2 anos analisados no Global Landscape of Climate Finance 2023, ainda estamos longe do essencial. Para assegurar o Acordo de Paris, o financiamento climático anual, a nível global, deverá aumentar 6 vezes face ao atual até 2030. Na esfera nacional, o BCE estima que Portugal seja o país da zona euro com maior necessidade de investimento verde em % do PIB por ano (>7%). A mesma entidade alerta que o custo da inação (ou ação tardia) é muito superior ao investimento necessário para uma transição atempada, enfatizando que o risco de crédito para os bancos será significativo na ausência de uma mudança efetiva, como consequência das perdas financeiras associadas a ativos expostos a impactos climáticos.
Se consideramos evidente que um capitalismo mais consciente e responsável é a pedra angular de uma economia sustentável e inclusiva, é fundamental compreender que o cerne da mudança ultrapassa a componente ética e moral, existindo uma relação direta entre riscos climáticos e sociais e a própria resiliência dos sistemas económicos e financeiros.
Havendo uma consciência crescente sobre esta relação, fomentada maioritariamente por uma pressão regulatória pesada, incluindo a adoção de mecanismos que orientem o fluxo de financiamento privado para atividades económicas sustentáveis, como é o caso da Taxonomia Ambiental da UE, uma transformação estrutural do sistema financeiro requer uma atitude mais proativa no que diz respeito aos processos que orientam a tomada decisão de financiadores e investidores.
Nesta frente, será fundamental saber gerir num contexto de incerteza e melhorar os modelos que permitam quantificar e, idealmente, monetizar, o impacto financeiro dos riscos climáticos no negócio. Mas, acima de tudo, irão liderar os que saibam reconhecer a enorme oportunidade económica associada à transição para uma economia mais verde e inclusiva. Tal só será possível para os que tenham a capacidade de interpretar o futuro, baseando-se nos cenários apontados pela comunidade científica e nas tendências de crescimento associadas a setores críticos para a transição, como o energético, os transportes, o imobiliário, a agricultura ou as (bio)tecnologias emergentes.
Existindo atualmente vários instrumentos de financiamento sustentável, tais como os empréstimos indexados à sustentabilidade ou os empréstimos verdes, com foco nas empresas de maior dimensão, uma mudança significativa está um passo à frente, exigindo uma restruturação da oferta bancária capaz de conduzir a um financiamento maciço da transição, dispondo à priori de um leque de produtos bancários que fomente a redução dos custos de contexto da transição climática, orientado a empresas de todas as dimensões e de setores estratégicos para o país, de forma a estimular a procura por investimentos sustentáveis.
Sendo este um processo de transformação estrutural da economia, deverá ser feito em parceria entre bancos, empresas, academia, 3º setor e administração pública. Para os bancos, a proximidade é um valor fundamental para apoiar a capacitação de micro e PME na sua jornada da sustentabilidade, reforçar a centralidade do setor financeiro na economia portuguesa, reposicionando o seu papel na sociedade e, em particular, fortalecendo a ligação com as gerações mais novas que anseiam por soluções e ação.
Com a certeza de que o caminho será turbulento, as boas lideranças exigem confiança na ciência, a sabedoria para gerir num ambiente de incerteza e uma visão de futuro que vá além dos business cases tradicionais.
Nota: esta é a coluna da iniciativa cívica Women in ESG Portugal para o ECO, e por meio deste canal pretendemos trazer conteúdos ligados ao ESG de forma descomplicada para a sociedade, na voz de mulheres, de gerações diferentes, que detêm expertise técnica na área.
Para mais informações, aceda ao site: www.winesgpt.com
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