IA em Seguros: Governança Ética como Vantagem Competitiva
Patrícia Azevedo Lopes já está preocupada com as implicações éticas e de como deve ser governada a Inteligência Artificial nas empresas de seguros. E assinala que há legislação para cumprir.
Nos últimos anos, a inteligência artificial (IA) tem desempenhado um papel fundamental na transformação do setor segurador. As seguradoras estão a adotar soluções baseadas em IA para melhorar a eficiência operacional, otimizar processos de tomada de decisão e oferecer uma experiência personalizada aos clientes.
A implementação da IA nas seguradoras tem-se concentrado em processos internos de baixo risco, como a automatização de processos, análise de clientes, marketing e comunicação. Esta abordagem permite às empresas de seguros aproveitar a grande quantidade de dados que possuem para melhorar a sua eficiência e reduzir custos operacionais. Por exemplo, a IA está a ser utilizada para análise e resumo de documentação, análise de grandes quantidades de dados e atendimento automatizado a clientes através de chatbots.
No entanto, a adoção da IA não está isenta de desafios. As empresas de seguros precisam de adotar um modelo de governança e um enfoque orientado à gestão de riscos para enfrentar ameaças relacionadas com a segurança dos dados, a privacidade dos utilizadores e as implicações legais sobre ética e imparcialidade.
O modelo de governação de sistemas de inteligência artificial (IA) numa empresa de seguros deve ser robusto, ético e centrado no ser humano. Esse modelo não só precisa garantir a eficiência operacional e competitividade da empresa de seguros, como também assegurar a proteção de direitos fundamentais, como a privacidade, a não discriminação e a segurança dos dados dos tomadores e segurados.
A IA deve ser desenvolvida e utilizada de acordo com valores éticos, o que significa que as decisões automatizadas precisam ser explicáveis e auditáveis. A transparência é fundamental para que tanto os gestores dos sistemas quanto os tomadores e segurados compreendam como e porquê um sistema toma certas decisões, especialmente em áreas críticas como a subscrição de riscos e a gestão de sinistros. Além disso, embora os sistemas de IA possam automatizar processos, eles devem estar sujeitos a uma adequada supervisão humana. Isso garante que decisões importantes, que afetam diretamente os direitos de tomadores e segurados, possam ser revistas por profissionais humanos e ajustadas, conforme necessário.
Para além disto, a IA tem o potencial de revolucionar o setor segurador ao prever tendências e responder de forma mais eficaz às necessidades dos clientes. Ferramentas “self-service” baseadas em IA podem melhorar a experiência dos clientes e colaboradores, enquanto a automatização de processos permite reduzir custos laborais e aumentar a eficiência e produtividade.
Como está a inteligência artificial a ser utilizada na prática pelas empresas de seguros?
- Atendimento ao Cliente: A IA está a transformar o atendimento ao cliente nas empresas de seguros. Chatbots inteligentes são utilizados para oferecer um atendimento contextualizado, entendendo as necessidades específicas dos tomadores e segurados em tempo real;
- Gestão de Sinistros: A IA simplifica o processo de sinistro, que pode ser um ponto de fricção no relacionamento entre seguradora e cliente. Com a IA, este processo pode ser agilizado, reduzindo a burocracia e os prazos de espera;
- Deteção de Fraudes: A IA ajuda na deteção de fraudes em seguros, identificando padrões suspeitos e prevenindo sinistros fraudulentos. Por exemplo, a IA pode ser utilizada para identificar identidades falsas, que tentam sinistros fraudulentos;
- Automatização de Processos: A IA automatiza tarefas repetitivas, como administração de apólices, entrada de dados e processamento de documentos. Isto permite que os colaboradores se concentrem em atividades mais estratégicas e de maior valor agregado.
É essencial que a empresa de seguros estabeleça uma estrutura de gestão de riscos que contemple a avaliação contínua da segurança técnica e operacional dos sistemas de IA. Esses sistemas podem introduzir riscos significativos, desde a criação de vieses em modelos de risco até a exposição de dados pessoais sensíveis. Para lidar com esses desafios, a proteção de dados e a privacidade devem ser prioridades. O tratamento de dados pessoais pelos sistemas de IA deve ser monitorizado e controlado rigorosamente, conforme previsto no Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD). Isto é especialmente importante em casos de análise preditiva, em que grandes volumes de dados são usados para prever comportamentos e riscos futuros.
A empresa de seguros também deve garantir que os sistemas de IA não introduzem discriminações ou preconceitos nas suas decisões automatizadas. É crucial implementar mecanismos para identificar e mitigar vieses, de forma a assegurar que todas as decisões são justas e imparciais. Isto é particularmente importante em áreas como a avaliação de risco e gestão de sinistros, onde decisões enviesadas podem prejudicar grupos vulneráveis, como minorias ou pessoas com deficiências.
Adicionalmente, é fundamental que a empresa de seguros implemente políticas para garantir que os sistemas de IA estão continuamente em conformidade com as regulamentações nacional e europeia.
No que tange à regulamentação europeia – o Regulamento (UE) 2024/1689, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de junho de 2024 (Regulamento da Inteligência Artificial), exige-se que todos os processos de IA sejam documentados e que os registos sejam mantidos para futuras revisões, seja por reguladores ou auditores externos. Ao mesmo tempo, o modelo de governação deve permitir a inovação, criando um ambiente que incentive o uso de tecnologias novas e mais eficientes, sempre dentro dos parâmetros éticos e regulamentares.
O modelo de governação de IA numa empresa de seguros não visa apenas cumprir normas regulatórias, mas antes construir um futuro sustentável e ético. Ao combinar inovação com responsabilidade, a empresa de seguros poderá utilizar a IA para aumentar a sua competitividade, enquanto protege os direitos dos tomadores e segurados e promove a confiança nesta nova tecnologia.
Somente através de uma governação ética e responsável da IA, poderemos garantir que esta tecnologia serve como um pilar de confiança e justiça no setor segurador, moldando um futuro onde a inovação e a proteção dos direitos fundamentais caminham lado a lado.
Em conclusão, a inteligência artificial está a transformar o setor segurador, trazendo benefícios significativos em termos de eficiência, personalização e inovação. No entanto, é crucial que as empresas adotem uma abordagem cuidadosa e responsável, garantindo a segurança dos dados e a equidade no uso da tecnologia. A IA representa uma oportunidade única para as seguradoras se destacarem num mercado cada vez mais competitivo, mas o seu sucesso dependerá da capacidade de gerir os riscos associados e de integrar a tecnologia de forma ética e eficaz.
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