Inteligência Artificial na Saúde: desafios legais
O que para já não será tão isento de dúvidas são os inúmeros desafios legais que as novas ferramentas de IA colocam a todos aqueles que, de alguma forma, fabricam, distribuem, utilizam ou consomem.
Já não restam dúvidas sobre o extraordinário impacto da Inteligência Artificial (IA), agora e no futuro, no sector da saúde. Existem já no mercado várias soluções de IA que têm um papel crucial no diagnóstico de doenças e na tomada de decisões médicas, na medicina personalizada, na monitorização de doenças, bem como no campo da robótica e outros sistemas de inteligência artificial em relação a cirurgias e procedimentos médicos. Sem esquecer também a atividade de investigação clínica que poderá em muito beneficiar das ferramentas de IA.
O que para já não será tão isento de dúvidas são os inúmeros desafios legais que as novas ferramentas de IA colocam a todos aqueles que, de alguma forma, fabricam, distribuem, utilizam ou consomem essas ferramentas. Não conseguiremos seguramente aqui enumerar todas as questões legais que a IA coloca no sector da saúde, mas gostaria de alertar para algumas que se destacam, sobretudo, junto dos principais players de produtos e serviços de saúde.
Classificação como dispositivo médico: Para aqueles que são fabricantes das novas tecnologias médicas, um dos primeiros desafios que se vai colocar é a sua classificação, ou não, como um dispositivo médico. De uma forma muito breve, e ao abrigo da legislação em vigor, qualquer software destinado pelo fabricante a ser utilizado, isolada ou conjuntamente, em seres humanos, para o diagnóstico, prevenção, monitorização, previsão, prognóstico, tratamento ou atenuação de uma doença, será qualificado como um dispositivo médico devendo cumprir as regras legais para o fabrico e comercialização. Na prática, este exercício de qualificação não é de todo evidente pela interpretação que se pode fazer destes conceitos, mas sendo de facto um dispositivo médico terá de cumprir com as regras de colocação no mercado.
Regulamento de IA e sistemas de alto risco: Muito recentemente, e com a entrada em vigor do Regulamento de IA, aqueles dispositivos médicos que incorporam ou que são eles próprios um sistema de inteligência artificial (ou seja, software classificado como dispositivo médico) provavelmente se enquadrarão também na categoria de sistemas de IA de alto risco previstos no referido regulamento. Ora, este exige que os sistemas de IA de risco elevado tenham marcação CE para indicar a respetiva conformidade com a legislação, para que possam ser colocados como dispositivos médicos no mercado, e tudo o que isso implicará em termos de desafios: requisitos de qualidade dos dados, transparência, gestão de riscos e supervisão humana, entre outros.
Dados de saúde e regulamentação: As ferramentas das novas tecnologias de IA assentam em dados, e no caso das tecnologias médicas, em dados de saúde. Aqui haverá que atentar à conjugação das regras resultantes dos regimes nacionais de dados de saúde, mas também do Regulamento Geral de Proteção de Dados e das regras aplicáveis à investigação clínica, nomeadamente ao desenvolvimento de estudos clínicos. A conjugar também muito em breve com o Regulamento do Espaço Europeu de Dados de Saúde.
Responsabilidade na prestação de cuidados de saúde: Por fim, mas não podemos deixar de referir a implicação que a IA traz na prestação dos cuidados de saúde, sobretudo no que respeita à responsabilidade: onde começa e acaba a responsabilidade médica, ou seja, do profissional de saúde? Até onde pode ir a responsabilidade do produtor, nomeadamente do fabricante das ferramentas de IA que estão a ser utilizadas na prestação de cuidados clínicos? E como se conjugam as duas: pode o profissional de saúde ser responsável por decisões tomadas com base em ferramentas de IA?
Estas são apenas algumas das questões que se colocam no contexto da utilização da IA na saúde, e que exigem uma análise cuidadosa e contínua à medida que a tecnologia e a legislação evoluem.
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