Editorial

O assalto ao poder do PSD e CDS

Há uma nova geringonça, uma que junta o PSD e o CDS ao BE e ao PCP, ainda mais precária, e contraditória do que a primeira, a que suportou o Governo. Tudo à procura dos votos.

Portugal tem uma geringonça política desde 2015, mas descobriu esta quinta-feira que tem, afinal, mais uma geringonça no Parlamento, negativa e que envolve literalmente todos os partidos da oposição à esquerda e à direita, e que quer governar em vez do governo. O PSD e o CDS juntaram-se ao BE e o PCP – e a Mário Nogueira – para garantir que os professores vão recuperar todo o tempo de serviço que esteve congelado – os nove anos, quatro meses e dois dias. Sem olhar a contas, à justiça e à equidade, Rio e Cristas venderam-se politicamente pelos votos dos professores.

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Esta é que é a verdadeira geringonça, no sentido estrito do termo. Uma construção precária, sem qualquer tipo de coerência ou solidez, momentânea e que pode cair a qualquer momento. Foi neste projeto que o PSD e o CDS embarcaram, para se juntarem à esquerda radical que estão sempre a criticar.

Sim, sabemos como o Governo, em determinado momento, criou expectativas aos professores, e à própria Geringonça, para conseguir passar o orçamento de 2018. Mas… A decisão do PSD e do CDS é politicamente inaceitável e não é “apenas” pela possível inconstitucionalidade por violação da chamada lei-travão, que impede despesa adicional no exercício orçamental em curso aprovada no Parlamento. Esse é em primeiro lugar um problema jurídico. O problema verdadeiro é o problema político. Qualquer que seja o modelo de faseamento da devolução destes nove anos, quatro meses e dois dias, Rui Rio e Assunção Cristas têm de dizer aos portugueses duas coisas:

  1. O País tem condições para acomodar mais 675 milhões de euros de despesa anual (todos os anos, leu bem) em ordenados dos professores?
  2. A devolução do tempo integral de serviço é justa em relação a outros profissionais da Função Pública e em relação aos portugueses que, no privado, foram para o desemprego e viram os seus salários recuarem? No fundo, a todos os outros que viram as suas vidas igualmente “congeladas”?

Podemos ensaiar aqui uma resposta: Não e não. É fácil perceber que se escrevo aqui – dia sim, dia não – que a austeridade ainda anda por cá, uma despesa adicional de quase 700 milhões de euros obriga a cortar num outro sítio qualquer, ou a aumentar ainda mais a carga fiscal. E é obviamente injusta esta descriminação positiva de uma classe profissional por razões puramente eleitoralistas face a todas as outras no Estado, nomeadamente as outras carreiras especiais. Mas também em relação aos trabalhadores do setor privado que tanto perderam nos últimos nove anos.

Particularmente Rui Rio – sempre claro na defesa da consolidação orçamental – tem a obrigação de (nos) dizer como financia esta medida. Discordei, e discordo, do caminho feito para chegar ao défice zero, com carga fiscal recorde e investimento mínimo, a dívida pública já deveria ter descido mais do que o que desceu, continuámos expostos e vulneráveis, mais do que o que o governo nos diz. Mas esta coligação negativa vai mais longe no dano que pode trazer ao país, e um dano irrecuperável.

Claro, pode sempre dar-se o caso de estarmos aqui perante uma enorme encenação política de Rui Rio e Assunção Cristas (a encenação de Catarina Martins e Jerónimo de Sousa não é de hoje, como se sabe). Mas isso não torna esta iniciativa política melhor. Ou menos má.

O Governo está a dramatizar as consequências políticas desta coligação negativa. E bem, porque a situação é mesmo dramática. Veremos nas próximas horas se António Costa leva a ameaça de demissão até ao fim – um desfecho que torna a vida política imprevisível, desde logo para o próprio Costa e o PS -, mas o que fica para já é uma espécie de assalto ao poder por parte do PSD e do CDS. Será a pior forma de o recuperarem, reféns de uma classe e de um dirigente sindical.

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