O kind reminder do Dia da Mulher

  • Inês Palma Ramalho
  • 8 Março 2023

Mais de 100 anos depois do aparecimento do original Dia da Mulher, continuamos lamentavelmente a registar inúmeros motivos para manter o combate pelos direitos das mulheres, um pouco por toda a parte.

Corria o ano de 1909, em Nova Iorque, quando um grupo de mulheres – de muitas mulheres – decidiu organizar o Dia das Mulheres, antecessor do atual dia que hoje se comemora, como símbolo representativo da luta pela igualdade e pelo voto feminino. E foi no ano seguinte, já em Copenhaga, que um grupo de outras mulheres decidiu que o dia tinha de ser celebrado todos os anos, porque afinal o problema não tinha ficado resolvido no ano anterior e era preciso manter a chama acesa da luta pelos direitos femininos e continuar a assinalar a efeméride.

Nos anos seguintes as comemorações foram mudando de lugar no calendário até que, em 1975, a ONU lá selecionou o dia 8 de março como data oficial. Inicialmente focadas em manifestações, greves e marchas várias, as formas de protesto e de vivência do dia foram também evoluindo, havendo hoje quem se manifesta – e ainda marcha – como dantes e quem não ligue rigorosamente nada ao Dia Internacional da Mulher.

Seja pela eficácia ou não da efeméride, o voto feminino foi conquistado, entretanto, e já não consta da atual lista de reivindicações das mulheres. E podemos destacar outras melhorias – bem mais tímidas – na saga da luta feminina, mas cuja luta teve nitidamente inferior grau de sucesso. Hoje, mais de 100 anos depois do aparecimento do original Dia da Mulher, continuamos lamentavelmente a registar inúmeros motivos para manter o combate pelos direitos das mulheres, um pouco por toda a parte e muitas vezes com intensificado vigor.

Apesar de Portugal contar com uma força de trabalho composta por mais mulheres que homens (52%), no mercado de trabalho nacional continuamos a ter notícia de trabalhadoras despedidas por conta de gravidezes (ou que nem chegam a ser contratadas por estarem em “idade fértil”), de direitos de parentalidade flagrantemente desrespeitados ou cuja cumprimento não é eficazmente fiscalizado, de falhas sistemáticas na área da conciliação que resultam no aumento da carga de trabalho não pago que corresponde a horas gratuitas de cuidado aos filhos ou a tarefas domésticas, e das desigualdades salariais que se verificam mesmo perante cenários em que trabalhadores e trabalhadoras desempenham as mesmas funções.

Um pouco por todo o lado e ano após ano, surgem notícias novas, mas que não surpreendem ninguém porque a história teima em repetir-se, de mulheres assassinadas às mãos dos seus parceiros e no (des)conforto do seu lar, de números gigantescos de queixas e ocorrências de violência de género, de comportamentos preocupantes nas camadas mais jovens e que indiciam uma escalada da violência no namoro, de assédios e outras histórias até em contextos que se queriam seguros como a faculdade ou os confessionários.

Um pouco por esse mundo fora, multiplicam-se os relatos de meninas impedidas de continuar a estudar, mulheres banidas de profissões que antes desempenhavam e que nós damos como garantidas, mulheres e jovens meninas sem qualquer autonomia sobre o seu corpo e quem lhe acede, e outros tantos exercícios de (abuso profundo de) poder masculino motivados pelo simples facto de que as mulheres mais facilmente se subjugam aos homens.

Ao contrário da temática do voto feminino, estes problemas – a par de tantos outros que um limite de carateres não me permite enumerar – não ficaram resolvidos e, em muitos casos, estão hoje pior do que estavam em 1975. E muitas vezes continuam a ser tratados como se de um nicho se tratassem, como se as mulheres vivessem exiladas numa redoma e os seus problemas não se comunicassem aos filhos, aos parceiros, às famílias, às empresas e à sociedade.

Nunca fui uma grande fã do Dia Internacional da Mulher. Não tenho particular memória para datas e, quando era miúda, o 8 de março parecia-me só uma desculpa elaborada para vender flores. Mas, 100 anos depois, ainda estamos demasiado longe de um desfecho feliz para a luta por estes direitos humanos e enquanto esse combate não alcançar os seus objetivos, o Dia Internacional da Mulher é importante para nos lembrar a todos – mulheres e, sobretudo, homens – que há direitos que as mulheres ainda não têm. Nesse momento poderemos dizer, com alegria, que a efeméride cumpriu o seu propósito e deixou de ser necessária.

  • Inês Palma Ramalho
  • Advogada e vice-presidente do PSD

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