O que interessa é o todo e não o somatório das partes

  • Maria da Glória Ribeiro e Inês Alves Ribeiro
  • 30 Julho 2025

O perfil ideal é aquele que influencia positivamente a organização, e não um postulado aditivo de particularidades (mesmo que excecionáveis).

Colecionava restos de mortos e, com um cuidado meticuloso, procurava as partes dos vários corpos que considerava mais adequadas para a sua criação: as mais jovens e mais saudáveis. Juntou-as com grande esforço e, por fim, deu vida a uma criatura com uma eletricidade que ele mesmo produziu. Mas, quando esta abriu os olhos, soube que havia cometido um erro fatal.

Esta é nada mais do que a história de “Frankenstein”, escrita por Mary Shelley, onde Victor Frankenstein, um jovem cientista suíço, criou uma criatura a partir de partes de cadáveres, escolhendo meticulosamente os melhores órgãos: os melhores olhos, o melhor coração, o melhor estômago, com a esperança de dar vida a um ser perfeito. No entanto, ao invés de criar algo perfeito, criou uma criatura monstruosa.

A analogia entre a história de “Frankenstein” e o mundo corporativo, em especial no campo do executive search, é bastante pertinente. Apesar de já começar a ser desmistificado, existem muitas organizações que idealizam de forma pormenorizada o perfil e características de candidatos que querem contratar. Excluindo fatores de discriminação, que hoje em dia já não são tema, quem está a contratar fantasia, muitas vezes, com um candidato com características padrão, como uma formação académica na melhor universidade, um percurso em grandes empresas e a conclusão de um MBA, por exemplo. Existe um pré-conceito curricular, uma pressão para que o candidato tenha cumprido uma trajetória linear, o que muitas vezes leva à exclusão de pessoas que, apesar de não se encaixarem nesse perfil predefinido, podem trazer um enorme valor à organização e sobejamente cumprirem e ultrapassarem os objetivos.

Esta ideia de um perfil pré-definido tem as suas raízes na Revolução Industrial, particularmente com o surgimento do Taylorismo. Este modelo de trabalho, focado na maximização da produtividade, visava alcançar a maior quantidade de produção no menor tempo possível. Surgiu, desta forma, a conceção de que todos os trabalhadores deviam seguir padrão com características específicas, priorizando a eficiência à individualidade.

Mas isto passou-se há mais de um século. Nos dias de hoje, existem cada vez menos perfis padrão. As pessoas são cada vez mais diversificadas e flexíveis. Possivelmente o candidato que mais valor poderá aportar vem de um background inesperado ou mudou de área durante o seu percurso. As pessoas deixaram de ter cada vez menos percursos profissionais padronizados e, consequentemente, os perfis dentro das organizações serão cada vez mais divergentes.

Isto faz com que job descriptions pré-definidos de C-levels deixem de fazer sentido. As funções terão de ser customizadas a cada candidato, sendo as valências de cada um a ditar a forma e contornos das suas responsabilidades. Um executivo com responsabilidade da área comercial poderá agregar a área de facilities, ou gerir atividades offsite para colaboradores, caso tenha esse leque de competências e motivação, por exemplo.

Isto não significa que o processo de seleção se tornará menos rigoroso ou criterioso. Ao contrário, exigirá um olhar mais inteligente, estratégico e em uníssono com o decisor. Será necessário analisar cada candidato com mais conhecimento do negócio e da organização e, enfim, com a mente mais aberta, estudando como as experiências que teve até ao momento moldaram a sua visão, bem como o valor que pode acrescentar à organização. Análises padronizadas e homogeneizadas poderão ser realizadas por qualquer Inteligência Artificial. É para a evolução do “heterogéneo” que o “humano” virá a ser fundamental.

Esta mudança de paradigma tem um impacto direto na procura de talento, tornando mais complexa a identificação, atração e contratação de perfis de liderança. Processos de executive search apresentam-se como a solução para este desafio que se coloca. Através de uma pesquisa e análise detalhada é possível encontrar a combinação ideal entre candidatos com competências únicas e organizações com necessidades específicas. O executive search deve ser encarado como um parceiro estratégico, atuando como um verdadeiro conselheiro para a liderança C-suite, adaptando-se constantemente às mudanças rápidas do mercado e às necessidades individuais de cada organização.

  • Maria da Glória Ribeiro
  • Managing partner da Amrop Portugal
  • Inês Alves Ribeiro
  • Analista de mercado da Amrop Portugal

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

O que interessa é o todo e não o somatório das partes

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião