Oportunidades e desafios da nova ministra da Justiça

  • Eduardo Castro Marques
  • 8 Maio 2024

Do Ministério da Justiça espera-se sensatez e vontade de cooperar na construção de soluções que permitam recuperar a necessária harmonia, celeridade e credibilidade do sistema.

Com a nomeação de Rita Júdice para Ministra da Justiça, espera-se o advento de profundas (e necessárias) reformas naquela que foi uma das pastas mais agitadas do anterior Governo.

Num percurso que se antecipa desafiante, vários são os temas candidatos a encabeçar a lista de prioridades do novo Executivo.

Pensamos, de imediato, na (há muito) mandatória simplificação e agilização dos processos judiciais. O Governo anterior optou, erradamente, pela estratégia de cortar recursos. Imperativo seria, antes, que se olhasse para as várias fases processuais e se refletisse sobre os mecanismos necessários a imprimir-lhes celeridade. O que se afigura especialmente válido se refletirmos sobre a instrução em processo penal, cujos prazos, além de frequentemente desrespeitados, são, por si, incompreensivelmente morosos para a generalidade dos crimes que ocorrem em Portugal.

Acresce que, naturalmente, o desinvestimento no setor da justiça só beneficia aqueles que defendem e vivem da sua privatização. A ligação – tal qual vasos comunicantes – entre a significativa proliferação da arbitragem e o depauperamento das condições da Justiça (pública) está à vista de todos. Será por isso, uma das principais opções programáticas que irá definir o sentido político da actuação deste Governo. Irá apostar na Justiça (pública) ou continuar a assistir ao avanço da Arbitragem?

Numa outra perspetiva, há que repensar a estratégia definida contra a corrupção. Urge realizar uma reforma institucional das entidades públicas especializadas na transparência e na prevenção da corrupção, como é o caso da Entidade da Transparência, a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos e o Mecanismo Nacional Anti-Corrupção (MENAC). Ressalve-se que este último organismo foi criado em dezembro de 2021 e somente em junho de 2023 foi “instalado definitivamente”, através de portaria. Além desta demora injustificada, o organismo não dispõe ainda de uma plataforma de denúncias externas. Até então, o combate à corrupção tem sido profundamente ineficaz. É imperativo um reforço sério das regras de transparência, do controlo dos conflitos de interesses, das incompatibilidades e dos impedimentos dos titulares de cargos políticos. E não só num plano transversal se exigem tais mudanças. É no próprio seio político que estas medidas de anticorrupção devem ser adotadas. Os graves e sucessivos casos de corrupção que foram objeto de investigação por parte do Ministério Público e que envolveram diversos ministros do anterior governo reclamam uma mudança estrutural na estratégia de anticorrupção.

Especialmente merecedoras de reparo cremos serem também as recentes alterações introduzidas ao Estatuto da Ordem dos Advogados, que em nada dignificaram a profissão. Sem um estágio devidamente estruturado, árdua nos parece a tarefa de garantir a necessária preparação dos nossos jovens advogados. Temos, de facto, dificuldade em perspetivar de que forma se poderá salvaguardar o exercício responsável da advocacia com tão escassas garantias de competência técnica e conhecimento deontológico.

A revisão do sistema de acesso ao direito e do sistema de previdência dos advogados deve também estar em cima da mesa.

Não se ignorando, ainda, os milhares de funcionários que, no último ano, protagonizaram sucessivos cenários de greve e a crónica insuficiência de recursos e meios do sistema de justiça. É urgente pacificar a disputa que tem vindo a paralisar os Tribunais, exigindo-se rápidas respostas à insatisfação generalizada do setor.

Neste longo caminho a percorrer, do Ministério da Justiça espera-se sensatez e vontade de cooperar na construção de soluções que permitam recuperar a necessária harmonia, celeridade e credibilidade do sistema.

  • Eduardo Castro Marques
  • Sócio fundador da Dower Law Firm

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