Que sustentabilidade desejar num ano de novidades regulatórias?

  • Maria Folque, Angela Lucas e Rita Rendeiro
  • 8 Fevereiro 2024

Porque não então, em vez de grandes vitórias, desejar a 2024 muita consolidação e estabilidade? Um desejo quiçá ajustado ao estado a que parecem estar a chegar os grandes blocos legislativos da UE.

Passou o início do ano. Já não se deseja um 2024 cheio de saúde, de sucesso. Mas desejaremos um 2024 cheio de Sustentabilidade?

2024 será um ano de estreias. Quem acompanha estes temas habituou-se já à profusão legislativa que os caracteriza, e a alguma ansiedade resultante da complexidade, custo e timings de adoção das medidas. Quem acompanha estes temas habituou-se também a algumas manobras de marcha-atrás aqui e ali, que os media divulgam como mortes anunciadas de vontade política de transição, mas que com seriedade consideramos ser imprescindível enquadrar no contexto mais vasto da profundidade e magnitude das alterações económicas e sociais propostas.

Porque não então, em vez de grandes vitórias, desejar a 2024 muita consolidação e estabilidade? Um desejo quiçá ajustado ao estado a que parecem estar a chegar os grandes blocos legislativos da UE nesta matéria.

Assim, a Diretiva de Reporte de Sustentabilidade Corporativa (CSRD) aplica-se a partir de 2024 às grandes empresas de interesse público já obrigadas a reportar informação não financeira, marcando o início de um ciclo que verá nos anos seguintes a obrigação abranger cerca de 49 000 empresas (informação atualizada e completa em Corporate sustainability reporting – European Commission (europa.eu) e aqui). A CSRD vem exigir um verdadeiro relato de sustentabilidade, com a identificação de riscos e oportunidades, análise de materialidade e reporte em linha com as Normas Europeias de Relato de Sustentabilidade, o que será, entendemos, um desafio considerável para as empresas em prol da transparência. A partir de 2024, o Regulamento da Taxonomia exige ainda a estas empresas que divulguem os indicadores que traduzem o rácio dos seus ativos investimentos em atividades sustentáveis do ponto de vista ambiental.

Em paralelo, o Regulamento de Divulgação de Finanças Sustentáveis (SFDR), que obriga bancos, seguradoras ou gestores de ativos a divulgar os principais impactos das suas decisões de investimento em fatores de sustentabilidade, poderá conhecer transformações relevantes, impactando os KPIs divulgados e a classificação de produtos de investimento com objetivo sustentável, ou que promovem características ambientais / sociais. A CSRD e o SFDR, abrangendo sobretudo grandes empresas e entidades financeiras, impactam indiretamente, através da sua cadeia, grande parte do tecido empresarial europeu. Assim, o seu efeito conjugado será, esperamos, abrangente e transformador, induzindo, através de uma maior transparência e disponibilidade de dados, uma mudança de comportamentos e um redirecionamento do investimento para a sustentabilidade.

Com 2024 parece que chegará também a Diretiva sobre Diligência Devida e Sustentabilidade Empresarial (CSDDD ou CS3D), onde o legislador europeu irá além da imposição de obrigações de reporte em sustentabilidade, estreando-se na imposição de obrigações de diligência devida, exigindo a muitas empresas a mitigação dos efeitos negativos em matéria de direitos humanos e ambiente, decorrentes não só das suas operações mas também das de parceiros empresariais a montante da empresa e, em parte, de atividades a jusante, como a distribuição ou a reciclagem.

O incumprimento destas obrigações poderá resultar em sanções até 5% do volume de negócios, obrigar ao pagamento de compensações às vítimas que procurem o acesso à reparação e impedir a participação em concursos públicos e contratos de concessão com o Estado. Tendo em conta as potenciais implicações e a exigência das novas obrigações esperadas, será fundamental que as empresas comecem a preparar-se desde já para esta mudança de paradigma.

Incontornável neste ano de 2024 é, também, falar das (várias) eleições que se avizinham – desde logo as eleições europeias que podem impactar, e muito, a estratégia definida nos últimos anos em matéria de sustentabilidade. O objetivo assumido pela presidência Von der Leyen foi que a Europa liderasse no mundo – pelo exemplo – na sustentabilidade. Com a contestação dos agricultores nas ruas, nos dias que correm, resta saber se os europeus querem continuar a trilhar este caminho. Seria uma pena abandonar agora este percurso e desperdiçar as conquistas alcançadas e as oportunidades que toda a estratégia definida tem ainda por concretizar. Se a Europa conseguir assegurar a continuidade do European Green Deal, consolidando as peças legislativas existentes e estabilizando o panorama da sustentabilidade, será já, só por si, uma forte conquista nesta área, neste ano de 2024!

  • Maria Folque
  • Business and Human Rights. Social Economy Law. NOVA Knowledge Centre for Business, Human Rights and the Environment
  • Angela Lucas
  • Environmental Law. LAND Fund. Center for Responsible Business & Leadership da Universidade Católica de Lisboa.
  • Rita Rendeiro
  • Advogada na CCSL e Sustainable Finance

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