STJ fixa em seis meses o prazo de caducidade em venda de coisa defeituosa

  • Daniel Bessa de Melo
  • 23 Agosto 2023

Corrido o prazo de seis meses sem qualquer reação do comprador, os defeitos existentes como que se sanam, não sendo possível ao comprador obter a restituição do preço que haja pago.

Em recente decisão, esclareceu o Supremo Tribunal de Justiça que os direitos do comprador em venda de coisa defeituosa encontram-se submetidos a um prazo de caducidade de seis meses após a data da denúncia dos defeitos. A falta de dedução de ação judicial no referido prazo implica a automática perda de todos os direitos que, de outro modo, competiriam ao comprador, incluindo o direito à obtenção de uma indemnização.

Por intermédio do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 7/2023, no âmbito do processo n.º 3655/06.9TVLSB.L2.S1-A, o Supremo Tribunal de Justiça sumariou que: “A ação de indemnização fundada na venda de coisa indeterminada de certo género defeituosa está submetida ao prazo de caducidade previsto no artigo 917.º do Código Civil, a tanto não se opondo o disposto no artigo 918.º do mesmo Código”. O Supremo Tribunal de Justiça colocou termo a um existente conflito jurisprudencial e doutrinário, onde se discutia acesamente se a venda de coisa genérica defeituosa estaria ou não sujeita ao prazo de caducidade de seis meses previsto no art. 917.º do Código Civil.

Para se compreender o sentido desta jurisprudência, deve-se primeiro salvaguardar que a mesma apenas diz respeito à compra e venda civil, excluindo do seu âmbito de aplicação as relações de consumo. Caso o adquirente do bem seja um consumidor, entendido como “aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios”, o prazo de caducidade dos seus direitos é de três anos a partir da comunicação da falta de conformidade. A presente jurisprudência incide apenas sobre a compra e venda civil, podendo-se entender esta, grosso modo, como a celebrada entre empresas ou entre particulares.

Uma vez verificado algum defeito na coisa entregue, o comprador deverá proceder à sua denúncia no prazo máximo de trinta dias (art. 916.º, n.º 2, do Código Civil). Realizada a denúncia, que por razões de prova deverá ser efetuada por escrito, caso o vendedor não aceder voluntariamente ao pedido do comprador, este deverá dar entrada da competente ação judicial no prazo de seis meses (art. 917.º do Código Civil). Inobservado qualquer um destes prazos, os direitos do comprador extinguem-se.

Quanto à venda de coisas genéricas, entendidas como aquelas cujo objeto é definido por referência a um determinado género ou qualidade (serão exemplos mais comuns: a compra de um automóvel de certa marca e gama; a compra de cinco quilogramas de arroz; a compra de sapatos de certo modelo) e não por referência a uma coisa individualizada (um quadro exposto numa montra de uma loja; uma peça artesanal; uma concreta peça de roupa em exposição num manequim), a jurisprudência debatia se o prazo de caducidade de seis meses era igualmente aplicável ou se, pelo contrário, vingaria o prazo geral de vinte anos (art. 309.º do Código Civil).

Por via desta decisão, veio o Supremo Tribunal de Justiça adotar a posição de que o prazo de caducidade de seis meses é aplicável igualmente à venda de coisa genérica. Por conseguinte, caso uma empresa haja adquirido de outra um conjunto de material de escritório ou um veículo, uma vez verificado um defeito e procedendo-se à sua denúncia, a eventual ação judicial deverá ser interposta no prazo máximo de seis meses sob pena de, não o fazendo, os direitos que lhe assistiriam caducarem.

Por fim, embora o sumário do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência aluda apenas à ação de indemnização, os argumentos expostos pelo Supremo Tribunal de Justiça são aplicáveis, por igualdade de razão, aos demais meios de reação que assistem ao comprador. Ou seja, não é apenas a ação de indemnização que está sujeita ao curto prazo de caducidade, mas também a ação a exigir a reparação da coisa, a sua substituição, a redução do preço da compra e venda ou a extinção do contrato por incumprimento contratual. Corrido o prazo de seis meses sem qualquer reação do comprador, os defeitos existentes como que se sanam, não sendo possível ao comprador obter a restituição do preço que haja pago.

  • Daniel Bessa de Melo
  • Associado da Cerejeira Namora, Marinho Falcão

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

STJ fixa em seis meses o prazo de caducidade em venda de coisa defeituosa

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião