Bruxelas ataca Banco de Portugal: supervisor foi pouco exigente durante a troika

  • Margarida Peixoto
  • 21 Novembro 2016

Relatório de um grupo de economistas da Comissão Europeia sobre o programa da troika em Portugal defende que o problema da banca foi bem identificado, mas reconhece que foi subestimado.

O Banco de Portugal foi pouco exigente durante a aplicação do programa de ajustamento da troika e daí resultaram insuficiências que continuam a travar a recuperação da economia portuguesa. A conclusão é de um grupo de economistas da Comissão Europeia e consta de um relatório de avaliação ao programa português, publicado esta segunda-feira.

Tal como já aconteceu com o FMI, também Bruxelas realizou uma avaliação ao programa de resgate português aplicado entre 2011 e 2014. O estudo foi liderado pelo economista Daniel Daco e beneficiou do apoio de um grupo de trabalho conduzido por Matthias Mors, da direção-geral dos Assuntos Económicos e Financeiros (DG ECFIN). O objetivo foi verificar o que correu bem e o que poderia ter corrido melhor, tendo em conta os resultados alcançados e daí retirar conclusões que sejam úteis para futuros programas de ajustamento.

As ações de supervisão da banca também deveriam ter sido mais exigentes no que diz respeito ao provisionamento das imparidades, nomeadamente quando os problemas relacionados com o abrandamento da atividade económica se tornaram mais evidentes.

Ex Post Evaluation of the Economic Adjustment Programme

Grupo de economistas da Comissão Europeia

No documento, são reconhecidas algumas falhas e retiradas lições, mas a crítica mais dura vai direta para a instituição liderada por Carlos Costa: “Com o Banco de Portugal responsável pelo desenho e implementação da recapitalização dos bancos, o programa poderia ter enfatizado melhor a importância das diferentes estratégias, promovendo orientações mais detalhadas e colocando mais pressão na sua implementação”, lê-se no relatório.

Mas não é tudo. “A autoridade de supervisão não exigiu uma recapitalização/reestruturação dos bancos mais robusta“, frisa o relatório. “As ações de supervisão da banca também deveriam ter sido mais exigentes no que diz respeito ao provisionamento das imparidades, nomeadamente quando os problemas relacionados com o abrandamento da atividade económica se tornaram mais evidentes”, continuam os peritos. “Teria ajudado” a implementar políticas mais efetivas se tivesse sido feita uma análise pública sobre as diferentes abordagens possíveis ao problema do malparado, acrescentam.

Os economistas da Comissão Europeia avaliam ainda o que aconteceu com o Banif, com BES e a necessidade de recapitalizar a Caixa Geral de Depósitos para concluir que uma “supervisão mais robusta” poderia ter ajudado, sobretudo no caso do Banif. Quanto ao BES, reconhecem que os sinais de dificuldades emergiram apenas lentamente. E sobre a Caixa a crítica pode ser entendida como dirigida também ao Governo, já que se não foram dados os passos necessários para a sua privatização. Seja como for, havia margem para uma supervisão mais robusta ou para a resolução (também no caso da CGD) porque o envelope financeiro para apoiar a banca não foi todo utilizado – sobraram 6,4 mil milhões de euros, lembram.

Esta não é a primeira vez que a atuação do Banco de Portugal durante os anos mais duros do ajustamento é colocada em causa. Num exercício semelhante a este, feito por um grupo de economistas para o FMI, a avaliação resultou também em duras críticas à atuação de Carlos Costa.

Privatização da Caixa podia ter evitado custos para o Estado

Especificamente sobre o dossiê da Caixa, o relatório dos economistas da Comissão nota que uma reestruturação mais profunda do banco, “provavelmente acompanhada de passos concretos para a sua privatização completa, poderia ter ajudado a reduzir os riscos contingentes para o Estado, bem como a promover a concorrência entre os bancos”.

Neste momento, o Governo prepara-se para injetar até 2,7 mil milhões de euros na CGD, no âmbito de uma recapitalização. Esta operação, que chegou a estar planeada para 2016, mas que entretanto foi adiada para o próximo ano, apresenta riscos para o défice orçamental que só poderão ser dissipados depois de uma análise do Eurostat.

Governo relativiza críticas ao banco central

Na resposta à avaliação dos economistas de Bruxelas, as autoridades portuguesas relativizam as críticas. Lembram que não é justo que a avaliação seja feita à luz do que já se sabe hoje, nomeadamente tendo em conta que a crise de dívidas soberanas atingiu níveis inesperados.

Além disso, notam que a supervisão e a regulação evoluíram muito nos últimos anos e que “a ação de supervisão durante o programa refletiu corretamente estes desenvolvimentos a nível global, tornando-se mais intrusiva, proativa e antecipando melhor tendo em conta o perfil de risco dos bancos”, lê-se na resposta portuguesa.

Até ao momento ainda não foi possível obter uma reação do Banco de Portugal.

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