Itália: “Os bancos são a parte frágil do referendo”

"Itália é o único país que está pior do que Portugal", garante Francesco Franco. Crescimento marginal, produtividade estagnada, desemprego alto levam os italianos a tornar o referendo num voto a Renzi

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“Os bancos são a parte frágil” do referendo deste domingo em Itália. A análise é do economista Francesco Franco que sublinha que, se na segunda-feira houver um ataque à dívida italiana “isso vai refletir-se nos balanços dos bancos italianos que já estão num nível de fragilidade extremo”.

Em entrevista ao ECO, o economista da Nova Business School defende que, em Itália há apenas “um ou dois bancos fortes, mas a maioria tem um nível de rácios de capital mesmo no limite”. Se o “Não” vencer no referendo — que é muito mais do que um plebiscito à alteração da Constituição e se transformou num voto de confiança ao Governo de Matteo Renzi –“isso pode ser muito negativo para o setor bancário”.

“É importante transmitir a ideia de que não é uma crise de insolvência, mas pode transformar-se numa se depois do referendo o cenário negativo se concretizar”, alerta Francesco Franco. Ou seja, “se as forças populistas ganharem as eleições e tomarem decisões relativamente à posição na Europa e no euro”. “Nesse caso sim, se o cenário negativo se concretizar”. Ainda assim, o economista coloca alguma água na fervura porque na sua opinião “mesmo que ganhe o Não é muito cedo para dizer que este cenário negativo se vai concretizar”.

Além disso, “a banca em Itália já teve crises graves que conseguiu recuperar”, lembra, embora frise que o seu desejo é que a situação não chegue a esse ponto e se assim for “alguma solução se irá encontrar”.

Desajustamento entre regiões italianas “é enorme”

Mas… a situação económica em Itália justifica o atual grau de insatisfação dos italianos? A ponto de votarem ‘Não’ e porem em causa a estabilidade governativa, uma vez que Renzi já anunciou que se demite caso o resultado seja esse?

“Sim, porque é uma situação muito heterogénea”, responde Francesco Franco. “Itália é uma espécie de espelho da União Europeia. Há regiões que têm uma taxa de desemprego muito alta e outras que têm uma taxa de desemprego mais baixa do que a alemã. O desajustamento entre as regiões é enorme”, defende. Em outubro o país registou uma taxa de desemprego de 11,6%, um valor inalterado face ao mês anterior. Mais grave é a situação do desemprego jovem, um dos mais elevados da União Europeia (36,4%).

Itália é um laboratório muito interessante. Até na parte política”, afirma o economista. E dá como exemplo Silvio Berlusconi: “Um pequeno Trump que antecipou em 20 anos o populismo” do agora Presidente dos Estados Unidos. “Berlusconi não tinha a violência verbal de Trump, mas os argumentos que utilizava há 20 anos eram altamente populistas”, frisa.

Mas o problema económico é ainda mais grave porque “não se trata apenas do nível, mas também da tendência”. “Itália é o único país que está pior do que Portugal”. E não só em termos de dívida. Pior mesmo é o crescimento. “Itália não cresce nos últimos 15 a 17 anos senão marginalmente e a produtividade não aumenta nos últimos 15 anos”, afirma Francesco Franco. Por exemplo, Itália cresceu em cadeia 0,3% no terceiro trimestre deste ano. “Isto cria uma falta de expectativa para o futuro. Há uma geração que está mais pobre do que estavam os pais. Numa sociedade isto é muito complicado de absorver”, conclui.

Não dramatizar o efeito do ‘Não’

Para Francesco Franco não há necessidade de dramatizar as consequências de uma eventual vitória do ‘Não’. Acima de tudo é cedo para prever o que irá acontecer. Mas mesmo que os mercados na segunda-feira ataquem a dívida pública italiana, esse movimento pode ser de curta duração e isso “não significa que as variáveis macroeconómicas mudaram”. Claro que um pânico nos mercados no dia a seguir será sempre um susto e um problema momentâneo de liquidez, mas o BCE tem instrumentos para estas circunstâncias, lembra o economista.

E em jeito de ironia lembra que tanto com o Brexit como nas presidenciais americanas os mercados não se comportaram da forma de que todos esperavam.

Perante os receios que Itália venha a sair da zona euro, o economista lembra que “não são coisas que aconteçam de um mês para o outro”. Seria necessário que “as forças populistas vençam as eleições e depois iniciem o percurso para o país sair do euro”. “Não são coisas que aconteçam ao ritmo dos mercados financeiros, não têm essa volatilidade”, conclui.

Um referendo que faz sentido

É um erro político da parte de Matteo Renzi sujeitar o seu futuro político ao resultado de um referendo? Tendo em conta que Renzi não foi eleito por voto popular, faz sentido submeter uma alteração constitucional desta envergadura a votos, defende Francesco Franco. Em causa está reduzir o poder do Senado e dar mais força e eficácia ao ramo Executivo. Uma lei votada por três vezes em cada uma das câmaras do Parlamento.

Para Francesco Franco “a estranheza da opção” reside em “fazer o referendo feito ex-post e não ex-ante”.

Quanto aos riscos políticos, Francesco Franco garante que “Itália está habituada à instabilidade política”. E sublinha que “o único ponto de contacto entre as várias frentes que defendem o ‘Não’ no referendo é mesmo o ‘Não'”.

Eleições na Áustria em simultâneo

Áustria também vai a votos este domingo, mas para eleger o próximo Chefe de Estado. Francesco Franco não acredita que “o eleitorado austríaco seja influenciado pelo referendo em Itália”, mas reconhece que na Europa se vive um problema de equilíbrio entre a razão e a vontade.

 

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