Comissões renderam seis milhões por dia à banca

As comissões tornaram-se numa fonte de receitas de peso para os bancos, um encargo que tem pesado cada vez mais no bolso dos portugueses. E a tendência é para aumentar o peso desse tipo de encargos.

O tema das comissões bancárias está ao rubro. Desde o início do ano, vários bancos anunciaram revisões em alta dos valores que cobram aos seus clientes pela prestação de um conjunto diversificado de serviços, subidas que têm suscitado a crítica dos consumidores, nomeadamente através da Deco, mas que também já chegaram à discussão dos responsáveis políticos. A ameaça de Bruxelas de que poderá avançar com uma ação contra Portugal por falhas na transposição de uma diretiva comunitária é a mais recente novidade em torno das comissões bancárias. Um tipo de receitas cada vez mais relevantes para a rentabilidade dos bancos: renderam seis milhões por dia no último ano. E tende a pesar cada vez mais no bolso dos portugueses.

O cálculo tem por base os mais de 1.500 milhões de euros arrecadados em comissões pela Caixa Geral de Depósitos, BCP, Santander Totta e BPI, conjuntamente, em 2016. De acordo com os resultados anuais recentemente divulgados, no ano passado, os quatro bancos considerados arrecadaram um total de 1.559 milhões de euros com comissões. Ou seja, cerca de 1% acima dos 1.546 milhões que tinham sido amealhados no ano anterior. Neste conjunto de custos incluem-se não só as comissões cobradas aos clientes particulares pelos serviços associados à gestão das suas contas e produtos bancários, mas também os custos de intermediação noutro tipo de operações como ordens de bolsa, subscrição de dívida privada ou pública (OTRV), e ainda os valores cobrados às empresas.

Evolução global das comissões

Fonte: Preçários dos bancos

Do total de comissões captados pelas instituições financeiras consideradas, a maior parcela coube ao BCP: quase metade do total. A instituição financeira liderada por Nuno Amado amealhou 643,8 milhões de euros em comissões ao longo de todo o ano, o que corresponde a 41% do total e a um valor diário próximo dos 2,5 milhões de euros, em média. Seguiu-lhe a CGD, com 259,7 milhões de euros cobradas no ano e mais de 1,3 milhões, em média, por dia. Já ao Santander Totta e ao BPI coube a terceira e quarta posição, respetivamente, com 305,7 milhões e 259,7 milhões de euros cobrados em comissões no ano, a que corresponde uma média diária em torno de um milhão de euros.

Estes dois últimos bancos foram, contudo, os únicos a apresentar uma subida do total cobrado com este tipo de comissões. Em 2016, o banco liderado por Fernando Ulrich registou uma subida de 1,5% das comissões captadas, enquanto a instituição financeira liderada por António Vieira Monteiro viu estas receitas crescerem mais de 16%. Parte desta subida poderá estar relacionada com a incorporação do Banif no banco espanhol, o que aconteceu em dezembro de 2015.

Comparativo das comissões entre os bancos

Fonte: Preçários dos bancos

Apesar de à CGD e ao BCP caber grande parte da fatia das comissões cobradas — o que se deve também ao facto de serem os bancos mais representativos na economia portuguesa, concentrando mais de metade de quota de mercado — estes dois bancos registaram uma quebra nos valores captados com comissões no ano passado. No primeiro caso tratou-se de uma descida de 4,6% e no segundo de uma diminuição de 2,5%. Uma tendência que no entanto deve mudar este ano.

Mais subidas à vista

Tanto a CGD como o BCP fazem parte do conjunto de instituições financeiras que se preparam para aumentar um grande conjunto de comissões bancárias cobradas aos seus clientes, já entre os meses de abril e maio. O mesmo acontecerá com o Novo Banco e o Montepio Geral — ambos não considerados nesta análise.

Nos últimos anos, a banca nacional está a tornar o comissionamento na sua principal fonte de receitas, atingindo já valores acima dos 40% do total, existindo assim uma verdadeira alteração de paradigma na atividade bancária, em prejuízo dos clientes.

Nuno Rico

Deco

O aumento das comissões bancárias tem suscitado vozes muito críticas. A Deco é um desses exemplos. Recentemente em declarações ao ECO, e no seguimento de várias mexidas nas comissões bancárias, a associação de consumidores classificou-as como “injustificadas“, criticando a atuação da banca nesse âmbito. “Nos últimos anos, a banca nacional está a tornar o comissionamento na sua principal fonte de receitas, atingindo já valores acima dos 40% do total, existindo assim uma verdadeira alteração de paradigma na atividade bancária, em prejuízo dos clientes”, afirmou Nuno Rico, economista da Deco.

Num ambiente de juros historicamente baixos, os bancos têm-se virado para as comissões como forma de aumentar a rentabilidade da sua atividade. A própria associação que representa os bancos assume a relevância do valor angariado em comissões para a rentabilidade da sua atividade. Numa audição na Comissão de Orçamento e Finanças realizada no ano passado, a Associação Portuguesa de Bancos, representada por Faria de Oliveira, defendia que “não existe nenhuma razão económica ou jurídica para que estes serviços [bancários] não sejam adequadamente remunerados pelos que deles beneficiam, de modo a cobrir os respetivos custos, mas também para permitir uma adequada remuneração do capital que é absolutamente vital para os bancos”.

Falta um travão

Confrontado perante as vozes críticas relativamente à escalada das comissões, o Banco de Portugal diz nada poder fazer. “De acordo com a normas em vigor, as instituições de crédito são livres para fixar o preço dos seus produtos e serviços”, bem como para “introduzir alterações aos valores das comissões, desde que essa possibilidade esteja prevista contratualmente e cumpram os demais requisitos previstos na lei” disse a entidade liderada por Carlos Costa recentemente ao ECO.

"A restrição a esta liberdade é uma competência reservada ao legislador, a qual tem sido exercida tanto a nível nacional como comunitário, através da imposição de limites ou da proibição de cobrança de determinadas comissões.”

Banco de Portugal

O regulador do sistema financeiro remete para o governo a responsabilidade de travar ou não a subida desses custos. “A restrição a esta liberdade é uma competência reservada ao legislador, a qual tem sido exercida tanto a nível nacional como comunitário, através da imposição de limites ou da proibição de cobrança de determinadas comissões”, esclareceu na ocasião o Banco de Portugal.

Os primeiros sinais que apontam para uma maior consciência das autoridades portuguesas e europeias em torno do tema das comissões bancárias parecem começar agora a surgir. Ainda no final de fevereiro, o primeiro-ministro António Costa admitiu interceder no sentido de rever as comissões que estão a ser cobradas pelos bancos, visando proteger os clientes das instituições financeiras. Uma declaração que surgiu ainda poucos dias depois de ser conhecido que o Parlamento Europeu pretende acabar com as comissões para abrir e manter contas bancárias. Agora chega a vez de Bruxelas também acenar com uma ação contra Portugal por não ter transposto novas normas comunitárias sobre comissões bancárias, que visam melhorar a transparência e comparação de serviços dos bancos e das comissões associadas.

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