Comissões: Deco critica, Costa não pode fazer nada

A associação de consumidores considera o recente anúncio de subida das comissões bancárias por alguns bancos injustificado e penalizador dos clientes. O Banco de Portugal diz que não pode fazer nada.

Injustificados“. É esta a expressão utilizada pela Deco para classificar os aumentos das comissões bancárias recentemente comunicados aos clientes por alguns dos maiores bancos nacionais. Ao ECO, a associação de consumidores salientou que o único propósito destes aumentos é a obtenção de receitas adicionais, que os bancos “não estão a conseguir obter através daquela que deveria ser a sua principal atividade económica, a intermediação financeira”, e que tal acontece em prejuízo dos clientes.

A preocupação da Deco foi manifestada poucos dias depois de o Novo Banco ter comunicado aos seus clientes que vai aumentar o valor cobrado num conjunto de comissões bancárias, a partir de 16 de abril. Encargos que em algumas situações chegam a duplicar. O banco liderado por António Ramalho vai subir as comissões em 18 contas de depósitos à ordem, sendo por exemplo na conta Novo Banco 100% (com bonificação) esta passa de 1 euro para 2,5 euros por mês. Já quem tenha a conta Novo Banco 360º (com bonificação) passará a pagar 3,75 euros, em vez de 1,5 euros.

Mas as alterações ao preçário do Novo Banco estendem-se a muitos outros serviços, como ao crédito à habitação onde, por exemplo, a comissão de liquidação de prestação passa de 2,15 para 3,50 euros por mês, já a partir de 18 de março. Alguns dos valores cobrados nas transferências para contas de outros bancos também sofrem agravamentos: as transferências periódicas não urgentes passam de 3,75 para 5 euros no caso do plano fixo, e de 3,90 para 5,50 euros no plano variável, em ambos os casos em montante inferior a 50.000 euros.

Já em meados de janeiro, a Caixa Geral de Depósitos também tinha informado os seus clientes que também iria subir o custo de diversas comissões, em abril e maio, alterações que surgem ao abrigo do plano de reestruturação do banco público. Pedir cheques pelo telefone sem operador e Internet, através da app ou por SMS vai ficar mais caro já em abril, sendo que em maio também sobem os custos associados a depósitos à ordem, às anuidades nos cartões de crédito e de débito, bem como aos levantamentos em “cash advance”, ou transferências.

"Nos últimos anos, a banca nacional está a tornar o comissionamento na sua principal fonte de receitas, atingindo já valores acima dos 40% do total, existindo assim uma verdadeira alteração de paradigma na atividade bancária, em prejuízo dos clientes.”

Nuno Rico

Deco

Desde sempre temos vindo a denunciar estes aumentos injustificados, muito acima da inflação, cujo único propósito consiste na obtenção de receitas adicionais, por parte dos bancos, que não estão a conseguir obter através daquela que deveria ser a sua principal atividade económica, a intermediação financeira, devido às baixas taxas de juro”, explica Nuno Rico, economista da Deco. O técnico da associação de consumidores salienta ainda que “nos últimos anos, a banca nacional está a tornar o comissionamento na sua principal fonte de receitas, atingindo já valores acima dos 40% do total, existindo assim uma verdadeira alteração de paradigma na atividade bancária, em prejuízo dos clientes”.

A própria associação que representa os bancos assume a relevância do valor angariado em comissões para a rentabilidade da sua atividade. Numa audição na Comissão de Orçamento e Finanças realizada no ano passado, a Associação Portuguesa de Bancos, representada por Faria de Oliveira, defendeu que “não existe nenhuma razão económica ou jurídica para que estes serviços [bancários] não sejam adequadamente remunerados pelos que deles beneficiam, de modo a cobrir os respetivos custos, mas também para permitir uma adequada remuneração do capital que é absolutamente vital para os bancos”.

O encarecimento das comissões bancárias intensificou-se no seguimento da crise financeira, com os bancos a identificarem aí uma via para aumentarem as receitas para compensar a quebra de proveitos resultante da descida acentuada das taxas de juro, que em muitos casos se encontram negativas, pesando nas suas margens financeiras. De acordo com uma análise recente da Deco, entre 2009 e 2015, as comissões cobradas pelos bancos subiram cerca de 10% ao ano.

Números que vão ao encontro dos cálculos do próprio Banco de Portugal. De acordo com análises da entidade liderada por Carlos Costa, num período de cinco anos, desde 2011, os encargos com a manutenção das contas bancárias subiram 42,9%, enquanto a inflação aumentou 7% no mesmo período.

"A não clarificação, por parte do legislador, do conceito de produto/serviço bancário permite que se continuem a cobrar, por exemplo, comissões de manutenção por uma conta bancária, algo que consideramos não constituir um serviço bancário em si, mas sim a única forma de aceder a todo e qualquer produto ou serviço comercializado por um banco.”

Nuno Rico

Deco

Nuno Rico, lembra que o Banco de Portugal, tal como o governo e os grupos parlamentares, têm sido alertados pela Deco, através do envio de cartas com as conclusões dos estudos que realiza, para o aumento das comissões bancárias. “Para além de considerarmos que estes aumentos não têm qualquer tipo de justificação, apenas penalizando o consumidor e encarecendo a utilização daquilo que hoje em dia é um produto essencial, qualquer comissão deve ser cobrada se existir um serviço efetivamente associado, tal como já prevê a legislação nacional desde outubro de 2015”, diz Nuno Rico.

Contudo, o especialista da Deco lança uma crítica ao legislador. “A não clarificação, por parte do legislador, do conceito de produto/serviço bancário permite que se continuem a cobrar, por exemplo, comissões de manutenção por uma conta bancária, algo que consideramos não constituir um serviço bancário em si, mas sim a única forma de aceder a todo e qualquer produto ou serviço comercializado por um banco. Temos vindo, igualmente, a exigir a introdução de limites para estes aumentos que ocorrem assim de forma arbitrária”.

Bancos livres para fixar o preço

Já o Banco de Portugal diz nada poder fazer em relação à subida dos valores das comissões bancárias. “De acordo com a normas em vigor, as instituições de crédito são livres para fixar o preço dos seus produtos e serviços“, bem como para “introduzir alterações aos valores das comissões, desde que essa possibilidade esteja prevista contratualmente e cumpram os demais requisitos previstos na lei” disse a entidade liderada por Carlos Costa ao ECO, remetendo para o governo a responsabilidade de travar ou não a subida desses custos. “A restrição a esta liberdade é uma competência reservada ao legislador, a qual tem sido exercida tanto a nível nacional como comunitário, através da imposição de limites ou da proibição de cobrança de determinadas comissões”, esclareceu o Banco de Portugal em declarações disponibilizadas ao ECO.

"De acordo com a normas em vigor, as instituições de crédito são livres para fixar o preço dos seus produtos e serviços.”

Banco de Portugal

O regulador do sistema financeiro português esclarece que dentro das suas funções está, sim, “fiscalizar o cumprimento das normas legais”, sendo que quando deteta anormalidades “exige a correção dos incumprimentos e sanciona faltas graves“. Uma das obrigações dos bancos é informar os seus clientes sobre alterações nos seus preçários, com um pré-aviso mínimo de dois meses, bem como sobre o direito que estes têm de denunciar o respetivo contrato, imediatamente e de forma gratuita, caso não concordem com essa proposta.

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