A escola que está a ajudar PME do interior a darem o salto tecnológico
Reformulação da unidade de investigação levou à candidatura a projetos específicos de investigação e inovação. E a prestação de serviços a empresa. E isso mudou a história do Politécnico da Guarda.
Não foi há muito tempo que a Escola Superior de Tecnologia e Gestão (ESTG) do Politécnico da Guarda perdeu a acreditação da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) para financiamento de projetos de investigação. Estávamos em 2014 e a Unidade de Investigação chefiada pela professora Teresa Paiva desde o ano letivo 2010/2011 tinha vindo a passar por uma mudança multidisciplinar, que viu muitas iniciativas deixarem de estar apenas concentradas na área da investigação científica. Vai daí, explica Paiva ao ECO, os responsáveis da ESTG decidiram “reformular a unidade de investigação, para começar a trabalhar mais a vertente empresarial”, procurando financiamento através de candidaturas aos programas 2020 com projetos específicos e apostando, a par disso, no vale-inovação e na prestação de serviços a empresas.
Esta podia ser uma história sem final feliz mas não foi esse o caso e hoje é à ESTG que muitas empresas do Interior pedem ajuda quando precisam de desenvolver soluções para problemas específicos relacionados com tecnologia, computação e transferência de conhecimento na área do digital.
O nosso tecido empresarial tem características muito particulares que, por vezes, não são facilitadoras de grandes parcerias, porque são empresas muito pequenas, com pouca capacidade, não só financeira como operacional.
Também por isso, o que a Unidade de Investigação decidiu fazer em termos de políticas de fomento e de relação com empresas foi “desenvolver uma plataforma de comunicação para mostrar projetos de investigação em curso ou já concluídos mas, fundamentalmente, para comunicar os laboratórios que temos e as competências que estes têm”, explica Paiva — um site que, no fundo, funciona como um catálogo. “As empresas vão lá pesquisar e assim podem ver que temos muitas valências e que fazemos quase tudo”, conta bem-humorada.
Não é um exagero dizer que assim é, e que a aposta da ESTG não passa apenas por trabalhar de perto com empresas nascidas na Guarda e arredores ou que decidiram instalar-se na região por saberem que existem bons cérebros a sair todos os anos do IPG. Paiva dá como exemplo de “uma melhoria regional significativa” um projeto desenvolvido recentemente para o agrupamento de escolas do município de Almeida, para combater a taxa de abandono escolar.
“Pediram-nos que criássemos um curso relacionado com os recursos endógenos da região para motivar os alunos que, à partida, querem abandonar os estudos, para lhes darmos formação específica e para que, no futuro, possam criar as suas empresas ou trabalhar para empresas já existentes.” Nesse curso, “aprendem a comercializar, a produzir e a gerir esses bens, quer sejam queijos ou produtos mais naturais como os cogumelos, e ficam capacitados para terem uma vida profissional melhor do que se abandonassem o secundário precocemente. O nosso interesse também é motivá-los a entrarem no ensino superior e a continuarem a sua formação.” Muitos acabam por seguir a sugestão.
Transformar o interior
Nos últimos anos, grandes empresas como a Altran, com sede no Fundão, ou a PT, que criou o seu Data Center inovador na Covilhã, participaram na construção e definição de cursos técnicos especializados de dois anos na ESTG do Politécnico da Guarda, uma parceria que nasceu para “colmatar as necessidades das próprias empresas”, que procuram naquela escola do interior, tal como na Universidade da Beira Interior, alunos com valências em áreas tecnológicas que possam vir a ser integrados nos seus quadros.
Graças a unidades curriculares do curso de Engenharia Informática como a de Programação e Segurança, sob o pelouro do professor José Fonseca, há cada vez mais alunos interessados em seguir estudos nestas áreas. “Passam a ter mais consciência desta problemática e acabam a estagiar e a trabalhar em empresas ligadas à segurança informática, como foi o caso de dois alunos que no ano passado estagiaram numa empresa sediada em Coimbra”, revela.
“Tem sido nossa política aqui no Politécnico convidar os docentes que terminam doutoramentos em informática a criar disciplinas opcionais relacionadas com a sua área de especialização. No que toca à segurança informática, notei que houve um impulso no final do meu doutoramento em 2011, tal como aconteceu agora que um outro docente concluiu a sua especialização em segurança em rede de dados.”
O mesmo tipo de sinergias são criadas ao nível das pequenas e médias empresas da região. “Embora a segurança de sistemas esteja na ordem do dia, ainda vejo estas empresas de menor dimensão mais preocupadas em desenvolver software e não tão preocupadas com segurança, mas estou claramente a ver as empresas cada vez mais preocupadas com esta temática, mesmo em regiões do interior como é aqui a Guarda”, confessa Fonseca.
Este ano, a ESTG já foi palco de uma conferência de cibersegurança e “todos os anos temos as jornadas de engenharia informática, com workshops também na área da segurança, para as quais convidamos as empresas a participar, o que faz com que haja mais contactos entre alunos, docentes e as empresas, potenciando uma aprendizagem dos dois lados; nós ficamos a saber mais sobre as necessidades das empresas e elas acerca do que os nossos alunos podem oferecer. Temos a sorte de haver mais propostas de emprego nestas áreas do que noutras, vêm até empresas de Lisboa e do Porto à procura de alunos porque o mercado está ávido por especialistas da área.”
Atualmente, há alunos saídos do curso a trabalhar em empresas como a Sonae, a Nokia Siemens, em câmaras municipais e em diversos bancos, como o Santander, que tem em marcha uma parceria multifacetada com a ESTG. “Nomeadamente oferecem formação em desenvolvimento de planos de negócios a alunos”, explica Teresa Paiva. “O Santander é muito proativo e tem não só uma componente de financiamento global como outra que vai sendo integrada em diferentes atividades e ações específicas desenvolvidas na escola.”
A isso juntam-se as candidaturas ao projeto PoliEmpreende, um concurso nacional desenhado à medida dos Politécnicos do país em que bancos e outras entidades externas financiam prémios para projetos de negócio. Aqui, a ESTG só tem a ganhar também graças à solução encontrada pela Unidade de Investigação dirigida por Paiva, batizada PoliCasulos — uma incubadora composta por “espaços abertos e partilhados onde temos alunos, ex-alunos e docentes a desenvolverem os seus planos de negócio”, explica a especialista em marketing.
Isto numa altura em que, no âmbito do Portugal 2020, o IPG está acreditado para a Indústria 4.0 e também para marketing digital, a vertente de comunicação ligada a essa indústria. “Imagine que temos alunos de engenharia informática que não percebem de gestão”, exemplifica. “O que fazemos é integrá-los nas disciplinas da área que achamos necessárias e eles fazem-nas de forma gratuita para adquirirem conhecimentos e poderem trabalhar melhor nas suas áreas de especialização.”
Também a fomentar o desenvolvimento do Interior surge a plataforma pplware.com, que “reúne todo o tipo de conteúdos sobre tecnologia e que é também um forte motor de divulgação de projetos académicos e de investigação nacionais”, explica o administrador Pedro Pinto. Para o docente e administrador de sistemas do Centro de Informática do IPG, “as boas infraestruturas digitais existentes permitem, a partir do Interior, responder aos mais diversos desafios tecnológicos” e atrair outros projetos — caso da GoContact, pertencente ao grupo Wavecom, que em setembro vai instalar-se na ESTG através da criação de um Centro de Desenvolvimento.
Soluções à medida
Assim têm surgido startups de valor acrescentado que respondem às necessidades específicas de PME e das próprias populações da região da Guarda e arredores. Veja-se o caso da MagicKey, que desenvolve soluções tecnológicas para pessoas portadoras de deficiência e que á uma das startups que está incubada no IPG. “Há testemunhos no site que sensibilizam muito, é de facto um trabalho notável”, confidencia José Fonseca.
“No fundo o que a empresa faz é desenvolver ou adaptar software às necessidades de mobilidade, por exemplo, adaptam triciclos elétricos para pessoas de mais idade, porque esses triciclos que as pessoas compram viram muito rapidamente, podem tombar, então eles aplicam sensores para detetar escadas ou degraus… Melhoram tablets para as pessoas com dificuldade em falar, para que possam dizer se têm fome ou sede, e para pessoas acamadas criaram uma cama articulada que é controlada através de comandos de voz.”
Outro exemplo de sucesso, de importância redobrada num país que acabou de viver mais uma tragédia com os fogos de verão em Pedrógrão Grande, é o Robô Bombeiro, um concurso nacional de robótica dinamizado pelo diretor do mestrado em Computação Móvel da ESTG. “É organizado anualmente desde 2003 por docentes da unidade técnico-científica de Informática do IPG”, explica Carlos Carreto ao ECO. “O desafio proposto consiste em pôr à prova pequenos robôs móveis e autónomos, com a missão de encontrar e extinguir um incêndio, simulado pela chama de uma vela, dentro de uma arena que serve de modelo de uma casa, formada por corredores e quartos.”
O objetivo, adianta o investigador, é “promover a robótica, que será sem dúvida uma das tecnologias-chave do século XXI” e que já tem levado a outras parcerias da ESTG com grandes empresas (caso da fábrica Peugeot-Citroën de Mangualde). A par disso, o concurso passa por “proporcionar um evento educativo, também aberto ao público em geral, que seja estimulante e divertido, promovendo o conhecimento científico através da chamada abordagem STEM — Science, Technology, Engineering and Mathetmatics, com resultados comprovados”. A edição deste ano, a 15.ª desde que foi lançado, vai acontecer a 8 de julho no Pavilhão Desportivo de São Miguel, no centro da Guarda. Mais de 50 equipas de várias cidades do país estão inscritas. Não é um exagero dizer que assim é, e que a aposta da ESTG não passa apenas por trabalhar de perto com empresas nascidas na Guarda e arredores ou que decidiram instalar-se na região por saberem que existem bons cérebros a sair todos os anos do IPG. Paiva dá como exemplo de “uma melhoria regional significativa” um projeto desenvolvido recentemente para o agrupamento de escolas do município de Almeida, para combater a taxa de abandono escolar.
“Pediram-nos que criássemos um curso relacionado com os recursos endógenos da região para motivar os alunos que, à partida, querem abandonar os estudos, para lhes darmos formação específica e para que, no futuro, possam criar as suas empresas ou trabalhar para empresas já existentes. Aprendem a comercializar, a produzir e a gerir esses bens, quer sejam queijos ou produtos mais naturais como os cogumelos, e ficam capacitados para terem uma vida profissional melhor do que se abandonassem o secundário precocemente. E nosso interesse também é motivá-los a entrarem no ensino superior e a continuarem a sua formação.” Muitos acabam por seguir a sugestão.
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