Prova dos 9: Banca continua muito exposta à dívida nacional?

  • Rita Atalaia
  • 30 Junho 2018

Peter Praet, economista-chefe do BCE, considera que os "bancos continuam muito nacionais". E alerta que esta exposição pode ser um risco em caso de recessão. Será mesmo assim?

Peter Praet, um dos membros da comissão executiva do Banco Central Europeu (BCE), reconhece os progressos feitos no setor financeiro. A banca europeia está mais sólida e “muito mais capitalizada”, refere o economista-chefe. Contudo, o trabalho ainda não está terminado. Praet considera que é preciso fazer mais, uma vez que ainda há uma série de desafios que as instituições financeiras têm de enfrentar, e resolver, para regressarem à rentabilidade de forma sustentável.

Entre os problemas referidos por Peter Praet numa entrevista ao Expresso (acesso pago), é apontado o peso que o crédito malparado ainda tem no balanço dos bancos. O membro do BCE reconhece que o “esforço de redução [dos NPL] foi notável”, mas avisa que “a correção desta situação ainda não está completa” e que “continua a haver um legado considerável em termos de crédito malparado em alguns bancos”. De acordo com o FMI, o malparado em Portugal caiu mais de 13 mil milhões de euros desde meados de 2016.

Além dos créditos em incumprimento que continuam a limitar a rentabilidade dos bancos, o responsável pede mais consolidação no setor, nomeadamente que haja maior cruzamento de participações entre bancos de diferentes países. É também necessário que as instituições financeiras deixem de ser tão “nacionais”, refere Praet. Uma das formas que exemplifica esse nacionalismo dos bancos é na exposição à dívida pública. O responsável alerta que os bancos estão muito expostos às obrigações portuguesas, e que isso traz riscos.

A afirmação

“Os bancos continuam muito nacionais: expostos à dívida pública e muito centrados na economia do país.”

Os factos

Apesar de não ser possível analisar se os bancos cedem mais crédito a empresas e famílias portuguesas do que a estrangeiras para se concluir que estão “muito centrados na economia do país” — os dados das instituições financeiras não discriminam estes indicadores — há números que mostram que a exposição à dívida pública nacional é ainda elevada.

De acordo com os dados de 2017 da Autoridade Bancária Europeia, os bancos portugueses detinham cerca de 40 mil milhões de euros em dívida pública em abril, o que representa um aumento de 500 milhões de euros face ao mês anterior e 11% dos ativos totais das instituições. Deste montante, os três maiores bancos analisados pela entidade — Caixa Geral de Depósitos (CGD), Novo Banco e BCP — detêm quase 24 mil milhões de euros em dívida do Estado português.

Segundo o Parlamento Europeu, Portugal foi mesmo o único país da União Europeia onde os bancos aumentaram a exposição à dívida soberana nacional: cresceu 2,92% em comparação com o ano anterior. Um crescimento que reflete a maior aposta dos bancos portugueses neste tipo de ativo.

Entre os maiores bancos, a CGD destaca-se como sendo o banco que mais dívida nacional detém. De acordo com os números da EBA, o banco estatal tem em carteira 14 mil milhões de euros em obrigações portuguesas de um total de 21 mil milhões de euros da dívida de todos os países no seu portefólio — ou seja, mais de 66% corresponde a títulos nacionais.

Mais de metade da carteira dos bancos é dívida nacional

Fonte: EBA

No caso do BCP, o montante em obrigações do Tesouro ascende a cerca de seis mil milhões de euros. Isto num ‘bolo’ de 11 mil milhões investidos em dívida. O mesmo acontece no Novo Banco, outro dos bancos analisados pela EBA. Mais de metade da carteira da instituição financeira liderada por António Ramalho é composta por títulos nacionais: são praticamente quatro mil milhões num total de cerca de seis mil milhões de euros em títulos.

No total dos bancos portugueses, o ‘peso’ das obrigações nacionais em carteira é de cerca de 60% face à dívida total. Um valor que não é assim tão elevado quando comparado com outros países. Enquanto em Itália e Espanha se aproxima dos 70%, na Grécia sobe para 90%.

Dívida nacional pesa ainda mais em Itália, Espanha e Grécia

Fonte: EBA | Valores em percentagem

Prova dos 9

Embora os bancos nacionais tenham em carteira dívida de outros países — é o caso da Polónia, Itália, Espanha e EUA — é a dívida nacional que mais pesa no portefólio. De um total de 40 mil milhões de euros, os títulos nacionais correspondem a 24 mil milhões de euros. Ou seja, mais de metade dos títulos detidos pelas instituições financeiras são obrigações do Tesouro.

É com base nestes números que Peter Praet, responsável do BCE, afirma que “os bancos continuam muito nacionais”. Ou seja, muito “expostos à dívida pública e muito centrados na economia do país”. E pede que haja uma maior diversificação da carteira através da diminuição da exposição ao país. “Se a economia nacional cai numa recessão, se os défices orçamentais disparam e a dívida pública sobe, isso repercute-se imediatamente nos bancos”, nota o economista-chefe do banco liderado por Mario Draghi.

Contudo, e apesar de a percentagem dos títulos nacionais ser elevada em comparação com a dívida total nos portefólios dos bancos portugueses (cerca de 60%), há outros países onde as obrigações nacionais pesam ainda mais na carteira das instituições financeiras. É o caso de Itália e Espanha, mas sobretudo da Grécia — quase 90% da carteira dos bancos é composta por dívida nacional.

 

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