Novo conceito? Centeno já anda às voltas com a carga fiscal desde 2016

O Ministério das Finanças usa um novo conceito de carga fiscal para refutar a ideia de que esta está a subir. Desde o início da legislatura que Centeno tem alimentado este debate.

O Ministério das Finanças lançou esta quarta-feira para o debate público um novo conceito de carga fiscal que mostra uma descida entre 2015 e 2018. A iniciativa pretende responder aos que acusam o Executivo de conseguir o défice mais baixo da democracia com a carga fiscal ao nível mais alto de sempre e acontece quando faltam um mês para as europeias e meio ano para as legislativas. Mas a guerra de Mário Centeno com a carga fiscal não é de agora.

Foi na apresentação do Orçamento do Estado para 2016 que estoirou a primeira polémica em torno da carga fiscal. O Governo começou por defender que o Orçamento aliviava a carga fiscal entre 2015 e 2016 – a mesma ideia constava do texto do relatório do Orçamento – mas as contas apresentadas nos quadros do relatório não indicavam o mesmo.

Mais tarde, o Ministério das Finanças fez uma errata ao Orçamento e um esclarecimento onde clarificava os conceitos que estavam por trás desta confusão. “O peso da receita de impostos no PIB diminui 0,2 p.p. É nesse sentido que o ministro das Finanças tem referido que há uma redução da carga fiscal em 2016”, justificava o ministério através do seu gabinete de imprensa.

No entanto, este conceito deixava de fora as contribuições para a Segurança Social habitualmente usado nas estatísticas oficiais produzidas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) e que resulta do total das receitas de impostos e contribuições sociais das Administrações Públicas e da União Europeia excluindo contribuições sociais imputadas, em percentagem do PIB.

No mesmo esclarecimento, o Ministério das Finanças acrescentava que “o conceito da carga fiscal pode também entender-se como o peso do conjunto dos impostos mais as contribuições para a segurança social no PIB”, assinalando que “é este conceito de carga fiscal que a errata refere, como resulta da nota de rodapé”.

O relatório foi corrigido e onde se lia redução da carga fiscal passou a ler-se manutenção, mas não houve uma correção completa do documento, já que no capítulo referente ao Ministério das Finanças volta a ser referida a ideia de redução da carga fiscal.

Durante este debate, os técnicos do Parlamento estimaram que a carga fiscal (incluídas as medidas geradoras de receitas temporárias) mostrava um aumento de uma décima na carga fiscal e o na altura deputado do PS Paulo Trigo Pereira (agora deputado independente), admitiu esse aumento numa audição com Mário Centeno, contrariando a linha do Governo e do partido que representava.

O debate foi intenso, mas a prova dos nove só chegou mais tarde. Os dados finais do INE para o ano de 2016 mostraram até que a carga fiscal medida em percentagem do PIB baixou.

Uns meses mais tarde, na discussão do Orçamento do Estado para 2017, ainda antes de serem conhecidos os dados finais do INE para 2016, Mário Centeno voltou a insistir que a carga fiscal iria descer em 2016 e projetava uma nova descida em 2017. A UTAO voltou a contrariar o Governo, dizendo que a carga fiscal iria manter-se inalterada, e a direita aproveitou para atacar o Governo e o acusar de aumentar os impostos, especialmente os impostos indiretos.

Desta vez, o resultado final foi diferente. Centeno previa uma descida, a UTAO a manutenção, mas o INE revelou que a carga fiscal acabou mesmo por aumentar.

Em 2018, o discurso político mudou. O relatório do Orçamento do Estado para 2018 tinha apenas duas referências à carga fiscal. Uma para dizer que a política orçamental levada a cabo desde 2016 tinha permitido reduzir a carga fiscal sem comprometer os objetivos — sendo que o único ano em que tinha efetivamente diminuído foi em 2016 — e outra para dizer que o Governo estava a privilegiar uma recomposição dos impostos, descendo os impostos diretos e aumentando os impostos indiretos.

Mário Centeno passou a usar uma defesa diferente em público. Quando confrontado com o aumento da carga fiscal dado a conhecer pelo INE, Mário Centeno defendeu-se perante os deputados dizendo que a carga fiscal estava a aumentar, mas o indicador estava desatualizado e não refletia o “esforço fiscal” dos portugueses, que tinha diminuído. O ministro das Finanças não desenvolveu o conceito, mas defendeu-se sempre dizendo que a receita estava a aumentar porque a economia estava a criar mais empregos, que geravam mais receitas de impostos e contribuições para a Segurança Social.

O debate foi tão aceso, em particular com o PSD, que Mário Centeno chegou a acusar o vice-presidente da bancada parlamentar dos sociais-democratas, António Leitão Amaro de sofrer de uma “quase iliteracia financeira e numérica”. Depois de o ano terminar, o INE revelou que a carga fiscal aumentou para 35,4% do PIB.

Para 2019, o debate durante o OE o tema não foi tão marcante, mas agora depois de conhecidos os dados sobre a carga fiscal, o Ministério das Finanças avançou com um novo conceito que incorpora o défice, para mostrar que esta carga fiscal – a mais alta desde 1995 – não representa um peso para as gerações futuras.

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