Liberais e socialistas cozinham geringonça europeia ao almoço

Liberais e socialistas europeus tentam cozinhar uma 'geringonça europeia', mas as quedas de Michel na Bélgica, Tsipras na Grécia e Kurz na Áustria também complicam as contas no Conselho Europeu.

A liderança dos liberais e os socialistas no Conselho Europeu vão reunir-se esta terça-feira ao almoço para discutir os cargos de liderança da União Europeia, em especial a presidência da Comissão Europeia. Pedro Sanchéz, de Espanha, e António Costa, representam os socialistas. Emmanuel Macron junta-se aos até aqui líderes dos liberais, Mark Rutte, da Holanda, e Charles Michel da Bélgica, naquele que será o primeiro embate entre as forças políticas no Conselho Europeu sobre o futuro da União Europeia.

Cinco líderes, uma agenda: uma ‘geringonça à europeia’. O S&D, aliança política onde se integram os socialistas, mantiveram-se como segunda força política no Parlamento Europeu, mas foram o grupo que perderam mais eurodeputados face a 2014: menos 39.

Já os liberais foram o grupo que mais cresceu. Passaram de quarta a terceira família política com mais lugares (ganharam 40 deputados), em boa parte porque o En Marche de Emmanuel Macron se juntou ao grupo.

Juntos, estes dois partidos querem acabar com a hegemonia do PPE, a família política do centro-direita onde se integram PSD e CDS-PP, nos lugares de topo da União Europeia, e antes das eleições até levantavam a hipótese de juntar os Verdes (outro dos vencedores da noite eleitoral) e os partidos mais à esquerda, incluindo a esquerda unitária onde inclui o Syriza de Alexis Tsipras.

Mas as contas no Conselho Europeu, que é quem indica o candidato à Comissão Europeia, podem ser mais complicadas, tanto para este novo bloco – caso cheguem a um acordo –, como para o PPE.

O Conselho Europeu, grupo que reúne os líderes dos governos da União Europeia, reúne-se esta terça-feira num jantar informal para o primeiro ponto de situação e decidir se apoia um dos candidatos das famílias políticas do Parlamento Europeu, ou se avança com o seu próprio candidato.

Os próprios socialistas e liberais ainda têm de se acertar em torno de um candidato. António Costa tem defendido, e fez campanha por, Frans Timmermans, o primeiro vice-presidente da atual Comissão e candidato pelos socialistas. Mas os socialistas são apenas a terceira força no Conselho Europeu e foi por essa razão que a escolha do presidente do Eurogrupo acabou por recair sobre Mário Centeno, um socialista.

Nessa altura, os liberais já reclamavam um lugar de topo na Europa, que ainda não têm, até porque são a segunda força no Conselho Europeu, à frente dos socialistas. Mas há outros obstáculos a esta ‘geringonça europeia’ e às contas finais no Conselho Europeu:

Pelos liberais

  • Emmanuel Macron está a tentar ganhar na Europa a legitimidade que está a perder em França. Meses de protestos dos coletes amarelos e sucessivas mudanças de ministros pesaram no dia de votar para as europeias e a extrema-direita saiu na frente. O desalinhamento com Angela Merkel pode custar caro a Macron.
  • Mark Rutte, na Holanda, governa uma coligação fragmentada e conseguiu apenas o segundo lugar nas europeias. Rutte, que tem feito ele próprio uma campanha não oficial por um dos lugares, foi ultrapassado pelos trabalhistas (fora da coligação governamental nas europeias) e é agora ultrapassado por Emmanuel Macron na liderança dos liberais no Conselho Europeu.
  • Charles Michel, primeiro-ministro da Bélgica, está de saída do Governo e nas eleições conjuntas que se realizaram no domingo não só a extrema-direita cresceu, como os partidos da coligação que governava o país sofreram derrotas pesadas.

Pelos socialistas

  • Os socialistas de Pedro Sanchéz venceram as europeias em Espanha, mas perderam Madrid, a joia da coroa, para a direita, e tem um Governo minoritário. Pedro Sanchéz está a tentar deixar o Podemos longe do Governo e pediu ao PP para não governar com a extrema-direita em Madrid.
  • António Costa é o líder mais legitimado dentro deste grupo, mas também é o líder de um dos países mais pequenos e menos influentes deste grupo, e usou boa parte do seu capital político para reclamar para Mário Centeno o cargo de presidente do Eurogrupo.

Pela esquerda unitária

  • Alexis Tsipras teve uma derrota estrondosa na Grécia e vai para eleições antecipadas, possivelmente já a 7 de julho, com as sondagens a dar uma larga vitória ao centro-direita. Apesar de ter sido um dos líderes que Frans Timmermans disse que queria juntar a este grupo, não estará neste almoço entre liberais e socialistas, e surge com uma posição ainda mais enfraquecida no Conselho Europeu.

Mas entre o centro-direita, a situação já foi mais fácil. O PPE é o partido mais votado no Parlamento Europeu e aquele que tem mais líderes no Conselho Europeu, nove contra oito dos liberais. Com Emmanuel Macron a juntar-se aos liberais, estes dois grupos passam a estar em pé de igualdade, mas a matemática final até pode dar desvantagem ao PPE. A grande diferença, como sempre, poderá ser Angela Merkel.

  • Angela Merkel tentou distanciar-se da campanha, deu um apoio moderado a Manfred Weber, mas não seguiu o mesmo caminho que a sua sucessora na CDU. Merkel gosta de manter as suas opções em aberto, mas tradicionalmente tem um parceiro para conversar em Paris, algo que parece não ter desta vez. Ainda assim, é a líder mais experiente entre os presentes e tem o peso da maior economia da zona euro e da maior família política do seu lado.
  • Sebastian Kurtz até conseguiu um bom resultado nas europeias na Áustria, mas pela primeira vez desde 1955 o Parlamento austríaco aprovou uma moção de censura que o retirou do poder, devido ao escândalo que envolveu a extrema-direita com quem tinha uma coligação governamental. O Governo caiu e Kurtz também. Menos um líder do lado do PPE.
  • Victor Órban, na Hungria, venceu novamente as eleições e com uma longa margem, mas o seu partido está suspenso do PPE e o próprio já disse que Manfred Weber é um candidato fraco à Comissão Europeia. Não se sabe de que lado votará, mas o desalinhamento com o PPE é cada vez mais evidente.

Os independentes

  • Dalia Grybauskaitė, da Lituânia, está há dez anos como presidente da Lituânia e até é apontada como uma das potenciais candidatas à presidência do Conselho Europeu. Apesar de ter concorrido como independente, teve o apoio do centro-direita e pode alinhar do lado do PPE.
  • Giuseppe Conte, de Itália, é um dos ‘patinhos feitos’ do Conselho Europeu. É o líder independente de um Governo de coligação entre duas forças eurocéticas, o Movimento Cinco Estrelas e a Lega Nord, que lidera a terceira maior economia da zona euro. Salvini, líder da Liga, teve uma vitória robusta nas eleições europeias e pede uma mudança na Europa. Deverá ter mais força no Parlamento Europeu, mas não a suficiente para influenciar as negociações na Europa.

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