Petróleo aprendeu a lição. Desta vez, barril não irá ao fundo

Contrato de junho chega ao fim ainda na sombra do efeito do mês passado, que levou o preço do crude WTI a negociar pela primeira vez na história em terreno negativo.

O preço do petróleo caiu, pela primeira vez na história, para valores negativos quando os contratos de maio chegaram ao fim. O prazo dos novos contratos, de junho, chega ao fim esta terça-feira, mas o efeito não deverá ser o mesmo. Apesar de o mercado ainda estar sob forte pressão, o setor aprendeu a lição.

“A queda do contrato de futuro mais próximo sobre o WTI até valores negativos foi provocada por uma série de acontecimentos de mercado, mas também resultou da falha em impor regras que garantissem a transação ordenada deste ativo”, explica Carlos Jesus, diretor adjunto do Caixa BI, ao ECO.

"Toda esta situação foi informativa para os mercados e reguladores. Os ETF sobre crude estão agora a distribuir o capital ao longo da curva e não somente no lado curto, os níveis de armazenagem em Cushing são agora uma matéria mais clara para todos os intervenientes de mercado. Diria que, nesta conjuntura, seria difícil a ocorrência de uma queda de preços tão abrupta quanto a última.”

Carlos Jesus

Diretor adjunto do Caixa BI

Ao contrário dos futuros sobre o Brent (a referência do mercado europeu), a entrega física na maturidade do contrato de futuro sobre o WTI é feita no sistema de armazenagem de Cushing, Oklahoma. A queda da procura causada pela pandemia levou a capacidade de armazenamento a esgotar. Os investidores que negoceiam contratos, mas não têm interesse em ficar com a matéria-prima física, ficaram sem comprador para os contratos. E foi assim que o preço por barril de WTI chegou a tocar -40 dólares.

Toda a situação foi informativa para os mercados e reguladores“, refere Jesus, explicando que os ETF sobre crude estão agora a distribuir o capital ao longo dos vários prazos e que os níveis de armazenagem são mais claros. “Diria que, nesta conjuntura, seria difícil a ocorrência de uma queda de preços tão abrupta quanto a última“.

Também João Calado, CFA do BiG – Banco de Investimento Global, considera que “dificilmente” a situação irá repetir-se até porque os EUA disponibilizaram parte do espaço para reservas estratégicas. “Ainda que possa haver alguma pressão vendedora na maturidade, não é provável que os preços voltem a atingir níveis negativos ou perto de zero”, diz.

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Os preços recuperaram e o crude WTI negoceia próximo de 33 dólares, enquanto o Brent está nos 35 dólares. Apesar de o setor ter aprendido a lição, a recuperação será mais difícil. As empresas de petróleo sofreram impactos diferentes consoante a exposição que têm a diferentes níveis da cadeia de fornecimento, sendo que a empresas de exploração foram as primeiras a sofrerem diretamente a queda do preço no momento da venda às refinarias.

As refinarias, apesar de terem beneficiado da compra da matéria-prima a um custo mais baixo, sofreram uma perda de procura. Tanto empresas integradas (presentes nos diferentes níveis da cadeia de fornecimento) como as de gás liquefeito LNG (cujos contratos estão indexados ao petróleo) ainda não vão sofrer o maior impacto nos próximos meses.

“As empresas integradas, apesar de no primeiro trimestre do ano terem compensado em parte o impacto, vão neste trimestre ser prejudicadas na maioria do negócio, com o segmento de exploração ainda a ser impactado pelos reduzidos preços, as refinarias pela queda na procura e consequente margem e com os contratos de LNG a começarem a incorporar a queda do petróleo no preço de venda”, explica Calado.

"No futuro será determinante a recuperação da atividade económica que determinará a procura por produtos refinados de petróleo, nomeadamente gasolina e diesel. O nível de inventários encontra-se a níveis bastante elevados o que poderá atrasar a recuperação do preço para níveis de final de 2019, apesar dos cortes já anunciados da OPEP+ e outros produtores.”

João Calado

CFA do BiG

Para tentar travar o agravamento do problema, os principais produtores de petróleo do mundo (da OPEP+) acordaram cortar a produção em 9,7 milhões de barris por dia. A estratégia entrou em vigor no início do mês, dando fôlego ao mercado e juntando-se ao entusiasmo gerado pelas primeiras medidas de desconfinamento. No entanto, os analistas concordam que ainda há dúvidas sobre o futuro dos preços.

No futuro será determinante a recuperação da atividade económica que determinará a procura por produtos refinados de petróleo, nomeadamente gasolina e diesel“, diz Calado. Já Jesus sublinha que o “elefante na sala continua a ser o Covid-19 e o impacto da procura mundial de combustível”, acrescentando que “o principal risco é de uma segunda vaga da pandemia poder fazer retroceder o processo de reabertura”.

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