Com a crise, mais ricos travam no consumo e aumentam as poupanças
Crise pandémica levou a uma maior queda do consumo por parte dos mais ricos e a um aumento da poupança deste grupo. Facto é explicado pelo maior recurso ao teletrabalho e pela estrutura de despesa.
O vírus pode afetar todos, mas a crise não tem o mesmo impacto. No boletim económico de dezembro divulgado esta segunda-feira, o Banco de Portugal fez uma análise à evolução do consumo de diferentes grupos de consumidores e conclui que os gastos dos mais ricos registaram uma queda maior e a poupança uma subida superior à das camadas mais pobres.
“A redução da despesa foi mais acentuada no grupo de consumo mais alto e a recuperação subsequente mais lenta (variações de -35,9% e -0,4%, respetivamente, em abril e setembro)”, afirmam os economistas do banco central com base nos dados da SIBS sobre a despesa realizada com cartões bancários. Já no grupo de consumo mais baixo, a despesa caiu 21,8% e 8,8%, respetivamente, em abril e setembro.
O que justifica esta diferença? Não, o rendimento não terá caído mais entre os mais ricos. De acordo com a análise do Banco de Portugal, tal poderá estar associado ao teletrabalho mais frequente nas profissões de quem é mais rico, evitando gastos fora de casa com cartões. Além disso, a estrutura de consumo deste grupo e as restrições da pandemia explicam o resto: os bens essenciais pesam menos no orçamento destes cidadãos, ao contrário dos bens duradouros (e mais caros) cuja aquisição acabou por estar mais limitada pelas restrições.
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Assim, este grupo de consumo mais alto registou um aumento “significativo” da poupança agregada no segundo trimestre, o que explica a maior parte do aumento da taxa de poupança na economia portuguesa dado que este grupo “tradicionalmente concentra a maior parte da poupança das famílias”. “Tal sugere que as razões associadas à perda de rendimento não serão as mais relevantes para explicar a redução do consumo agregado”, escrevem os economistas, comparando com crise anteriores onde a relação entre rendimento e consumo foi mais forte.
Entre os mais pobres, o peso dos bens essenciais no orçamento familiar é maior, o que explica a menor redução da despesa dado que estes são bens de que não podem prescindir. A análise do banco central revela ainda que houve “uma evolução mais favorável da despesa deste grupo, em particular em bens duradouros” na retoma do verão. “Tal aponta para a eficácia das medidas de proteção do rendimento e de apoio às famílias mais vulneráveis no período recente”, sugerem.
Os economistas argumentam que o apoio aos grupos mais expostos à crise pandémica tem de continuar e deve ser focado. “As perspetivas setoriais e regionais para a atividade deverão permanecer diferenciadas até a pandemia estar controlada, o que aconselha uma abordagem direcionada nas políticas de apoio às empresas e às famílias”, aconselham. Só com essa ajuda, em conjunto com a vacina, é que haverá uma “recuperação sustentada do consumo privado”.
Além da diferença entre grupos sociais, o Banco de Portugal analisa também as diferenças regionais. O impacto da pandemia no consumo foi superior na Área Metropolitana de Lisboa, registando-se uma maior queda (-41,7% face à média nacional de -33,4%) face a outras regiões e posteriormente uma menor recuperação.
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“Recorde-se que as medidas de contenção se mantiveram mais restritivas por um período mais longo nesta região e que o peso do setor de serviços é superior ao das restantes regiões”, explicam os economistas, acrescentando que “a evidência mostra também que os municípios de maior rendimento apresentaram uma evolução mais desfavorável do que os restantes“.
O estudo confirma ainda o que já tinha sido antecipado por vários números, inclusive os do PIB: a pandemia teve efeitos no cabaz de bens e serviços “consumidos” pelos portugueses, com o consumo de bens alimentares a crescer 26,1% entre março e maio. Já “os bens duradouros – que pela sua natureza permitem que a sua aquisição possa ser mais facilmente adiada – registaram uma redução acentuada mas também uma recuperação marcada”.
“Nos setores de serviços, que requerem interação social e para os quais é difícil a substituição intertemporal do consumo, a despesa caiu fortemente e a recuperação tem sido lenta (quedas de 59% em abril e 8,6% em setembro)“, concluem.
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