Retirada gradual das medidas Covid poupa três mil milhões em 2022, estima a UTAO
A melhoria do défice orçamental entre 2021 e 2022 resulta da retirada gradual dos apoios Covid-19, assim como do crescimento da economia. A UTAO alerta, porém, para três riscos no OE2022.
O Governo tem dado garantias de que no próximo ano manterá alguns dos apoios criados por causa da pandemia, mas não revelou na proposta do Orçamento do Estado para 2022 (OE 2022) o seu potencial impacto orçamental. Uma vez que a retirada gradual destas medidas “abrirá espaço orçamental”, a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) estimou o impacto e chegou à conclusão de que há uma poupança de 2.996 milhões de euros entre 2021 e 2022.
“A variação estimada do impacto orçamental das medidas transitórias Covid-19 em 2022, face a 2021, melhora o saldo orçamental em 2.996 milhões de euros (1,32% do PIB)“, calculam os técnicos do Parlamento no relatório a que o ECO teve acesso que analisa a proposta do OE 2022. Este cálculo foi realizado “na medida do possível” dado que o Ministério das Finanças “não prestou qualquer esclarecimento adicional sobre medidas de política orçamental transitórias Covid-19”, o que é criticado diversas vezes no relatório por parte da UTAO, ainda que se note uma melhoria na prestação de informação face a 2021.
O efeito temporário das medidas Covid-19 assume “particular relevância em 2022”, reconhecem os técnicos, uma vez que será determinante para a redução do défice de 4,3% do PIB em 2021 para 3,2% do PIB em 2022, daí ser necessário avaliá-lo. O impacto mais relevante é o que acontece à despesa, sendo expectável uma redução expressiva dos gastos com subsídios e prestações sociais, até porque mesmo com os apoios ativos haverá cada vez menos pessoas e empresas a cumprir as condições para os receber.
“Do lado da receita, sobressai a diminuição na transferência de verbas europeias, mas esta quebra é mitigada pela recuperação de receita de impostos e contribuições sociais”, diz, por um lado, a UTAO, complementando que “no que diz respeito à despesa, assiste-se à variação negativa de todas as rubricas, ou seja, um volume de despesa comparativamente inferior, na qual avulta a redução dos encargos com subsídios e prestações sociais“.
A UTAO assume que o Estado apenas pagará em 2022 cerca de 200 milhões de euros em subsídios relativos a apoios Covid-19 já existentes, em comparação com os dois mil milhões de euros que se prevê que gaste em 2021, e que o consumo intermédio (como é o caso de vacinas e testes Covid-19) relacionado com a pandemia baixe para 400 milhões de euros. No caso de prestações sociais adicionais, os técnicos assumem que não haverá zero de gastos.
A melhoria do saldo proveniente das medidas transitórias Covid-19 mais do que compensará o impacto negativo das medidas de políticas antigas que são permanentes, como é o caso das despesas com pessoal e pensões, cujo efeito negativo era de dois mil milhões de euros, de acordo com o quadro de políticas invariantes entregue pelo Ministério das Finanças ao Parlamento em setembro. Assim, conjugando os dois efeitos, há um contributo positivo para o saldo orçamental de 2022 de 993,2 milhões de euros (0,44% do PIB).
Porém, este não é suficiente para amparar o impacto total das novas medidas de política — que têm em 2022 o maior impacto negativo dos últimos sete anos –, de um desfasamento temporal no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e das medidas temporárias ou não-recorrentes. No caso destas últimas, o Ministério das Finanças não refere quais são no relatório do OE nem prestou esclarecimentos à UTAO.
Assim, para chegar ao défice de 3,2% do PIB, o ministro das Finanças conta ainda com a recuperação do PIB (que deverá crescer 5,5% no próximo ano), desde logo o “dividendo” desse crescimento que é ter um numerador maior no cálculo do rácio. Acresce a isso um impacto ainda maior, classificado no gráfico em cima como “resto”, que passa pelo aumento de receita (maior receita fiscal, por exemplo) e a diminuição da despesa (menos subsídios de desemprego para pagar, por exemplo) devido à expansão económica.
UTAO avisa para três riscos no Orçamento para 2022
Apesar da conjuntura favorável dada pelo crescimento económico e a retirada gradual das medidas Covid-19, o exercício orçamental para 2022 não está isento de riscos. São três: um crescimento económico menos forte do que o projetado no cenário macroeconómico, a inversão na orientação da política monetária da Área do Euro e o regresso das regras de disciplina orçamental em 2023.
No caso do crescimento económico, há dúvidas sobre o efetivo controlo da pandemia, principalmente perante o aparecimento de uma variante resistente às vacinas administradas, e depois há três crises com que o mundo se debate atualmente perante o aumento da procura pós-choque da Covid-19: a escassez de matérias-primas, os custos de transporte e os custos da transição energética. “Menor PIB nominal trará menos receita e maior despesa por ação dos estabilizadores automáticos“, avisam os técnicos.
Em relação à política monetária, a UTAO alerta para a “possível alteração nas expectativas de inflação por parte dos agentes económicos”. “Caso as autoridades monetárias percecionem subidas na inflação esperada, terão de subir as taxas de juro diretoras e restringir os programas de compra de ativos“, admite, notando que isso teria impacto sobre o custo da dívida portuguesa e, portanto, traria maiores encargos, o que teria impacto no saldo orçamental.
Já sobre o regresso das regras orçamentais europeias em 2023, os técnicos do Parlamento avisam que os Estados-membros “mais endividados”, como é o caso de Portugal, “enfrentarão condições mais difíceis de consolidação do que no contexto atual sem regras de cumprimento obrigatório”. Esta semana a Comissão Europeia reabriu a discussão sobre o futuro das regras, mas se não houver mudanças até ao final de 2022, quando a suspensão acabar, é possível que haja “menos graus de liberdade em 2023 e anos seguintes” na consolidação orçamental. Porém, é de relembrar que o executivo comunitário tem prometido que irá utilizar toda a flexibilidade dentro das regras atuais após a reativação das regras.
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