O que levou o INE a deixar de antecipar dados aos Governos

Foi em 2014 que o Instituto Nacional de Estatística (INE) decidiu acabar com essa prática, após casos de fuga de informação com membros do Governo PSD/CDS. Afirmação de Costa voltou a lançar a dúvida.

Em conformidade com a política de difusão seguida e que consta no portal, o INE não antecipa resultados aos membros do Governo“. A garantia do Instituto Nacional de Estatística (INE) foi dada poucas horas depois de António Costa ter dito em plena campanha eleitoral que o PIB cresceu 4,6% em 2021, lançando a dúvida sobre se estaria a divulgar informação privilegiada uma vez que o valor oficial só será divulgado a 31 de janeiro, após a ida às urnas. Porém, a prática de adiantar informação sob embargo ao Governo em funções foi abandonada por causa de um episódio com Paulo Portas.

A polémica surgiu esta terça-feira, mas o primeiro-ministro viria a esclarecer que era um número do Governo e não do INE. Mas já era tarde demais e pouco depois Rui Rio criticava Costa por revelar dados que alegadamente teria tido acesso apenas pelo cargo que ocupa. E a Iniciativa Liberal, através de João Cotrim de Figueiredo, disse, segundo a Lusa, que esperava não haver fontes dentro do INE a “alimentar” o PS em mais um exemplo da “confusão entre o PS e o Estado”.

Se o desconforto com a declaração de Costa já era grande no INE – que diz que, na realidade, o valor ainda não foi apurado pelo que a variação média anual do PIB ainda não existe –, as declarações dos opositores de Costa agravaram ainda mais o ambiente. Tanto que esta quinta-feira a comissão de trabalhadores do INE decidiu lançar um comunicado para garantir que não houve fuga de informação por parte dos trabalhadores e para criticar o “ambiente de suspeição generalizada” sobre a alegada antecipação de dados ao Governo relativamente ao PIB de 2021.

É preciso recuar a 2014 para ir à raiz deste tema. A política de difusão do INE, datada de 2008, estabelece que “podem existir situações de concessão de acesso prévio à informação estatística oficial, sob embargo, que são tornadas públicas, no Portal do INE”, sendo que “as decisões neste domínio são da responsabilidade do Conselho Diretivo” do INE.

Nesse ano foi noticiado que a política de difusão que consta do site do INE tinha sido mudada, primeiro restringindo o acesso às 9h da manhã do dia de publicação e depois retirando totalmente esse privilégio ao Governo (foi o próprio Executivo que prescindiu disso) e ao Presidente da República. Com essa exceção ficaram apenas os diretores dos Serviços Regionais de Estatística das Regiões Autónomas que têm acesso prévio, sob embargo, às 9 horas do dia da divulgação, “quando estão em causa estatísticas de âmbito nacional com desagregação a nível de NUTS II“.

O que levou a esta mudança? Na altura, o Instituto apontava apenas para a atualização das normas à luz das regras europeias do Código de Conduta para as Estatísticas Europeias. Porém, mais tarde, já com o Governo da geringonça em funções, o Jornal de Negócios revela uma resposta do INE a uma pergunta do CDS — que suspeitava que o então Governo tinha pedido acesso antecipado — em que o Instituto assume que a alteração se deve a “uma violação do dever de embargo” por “um membro do Governo, evidenciada perante todo o país através das cadeias de televisão” pelo que a política de difusão foi mudada “a fim de minimizar a ocorrência de novas violações”.

Ironicamente, a violação do dever de embargo ocorreu com o então líder do CDS. “Aí pelas 11:00 da manhã sairão as estatísticas sobre o desemprego e vocês vão ver como essas estatísticas são boas para Portugal e surpreendem pela positiva alguns, possivelmente também algumas organizações internacionais”, disse Paulo Portas, citado pela Rádio Renascença, na madrugada de 5 de novembro de 2014, um dia antes de ser publicada a taxa de desemprego, dando a entender que esta ia descer. E assim aconteceu: a taxa atingiu um mínimo de três anos.

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