Do turismo aos partidos, estas são as reações à decisão do novo aeroporto
A decisão do Governo de deixar cair o concurso de Avaliação Ambiental Estratégia e acelerar alternativas ao aeroporto de Lisboa apanhou o país de surpresa e as reações políticas não são as melhores.
O Governo vai deixar cair o concurso de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) ganho por um consórcio que tem uma empresa participada pelo Estado espanhol e decidiu avançar para a construção imediata do aeroporto complementar do Montijo, com uma pista apenas. Além disso, o Executivo decidiu ainda dar início aos trabalhos de um novo aeroporto em Alcochete que venha a substituir o Humberto Delgado em 2035.
Esta decisão apanhou o país de surpresa e, embora tenha agradado à autarquia de Alcochete e ao próprio turismo, deixou descontentes os partidos com assento parlamentar, que falam em “desrespeito” para com o Parlamento e pedem a presença de Pedro Nuno Santos na Assembleia da República.
Câmara diz que cidade aeroportuária em Alcochete é decisão acertada
O presidente da Câmara de Alcochete, Fernando Pinto, considerou acertada a decisão do Governo de escolher o concelho para a construção de uma cidade aeroportuária, lembrando que a autarquia sempre defendeu essa solução. “Parece acertada esta decisão de se olhar para Alcochete e de se olhar pelo ponto de vista da construção de uma cidade aeroportuária, que é aquilo que este executivo sempre defendeu”, disse Fernando Pinto (PS), em declarações à agência Lusa.
Fernando Pinto disse que esta é uma estratégia completamente diferente daquela que se esperava, mas que considerou acertada. “O Governo entendeu numa primeira instância que seria o Montijo, a base área nº 6, mas coloca no horizonte temporal a construção dessa cidade aeroportuária”.
O presidente da Câmara de Alcochete adiantou que a autarquia é defensora “acérrima” da preservação de dois aspetos essenciais: a segurança de pessoas e bens e a preservação dos recursos naturais valiosos que o concelho possui encostados à reserva natural do estuário do Tejo.
Fernando Pinto considerou ainda inteligente entregar ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), enquanto entidade isenta, a elaboração de uma estratégia ambiental e a verificação dos pressupostos no que diz respeito ao Campo de Tiro de Alcochete. “Hoje estou satisfeito porque o Governo está à beira de tomar uma decisão que há 50 anos perdura em ser tomada. Eu vejo este investimento como fundamental do ponto de vista nacional e com uma importância vital para a região onde o concelho de Alcochete está inserido”, frisou.
Confederação do Turismo congratula-se com solução aeroportuária
O presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), Francisco Calheiros, congratulou-se esta quarta-feira com a solução aeroportuária anunciada para a capital, considerando que o atual aeroporto de Lisboa limita o crescimento do turismo. “É uma ótima noticia, a construção de um aeroporto em Alcochete, e é uma longuíssima ambição do setor do turismo, que não pode crescer mais com o aeroporto de Lisboa”, disse Francisco Calheiros aos jornalistas, no final de uma reunião de Concertação Social.
O presidente da CTP manifestou satisfação face à decisão do Governo e lembrou que o aeroporto de Lisboa serve uma grande zona do país, desde a zona centro ao Alentejo, e já não serve as necessidades do setor do turismo e de outros setores económicos.
À saída da mesma reunião de Concertação Social, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, salientou a importância da nova solução aeroportuária. “Do ponto de vista estratégico, este investimento é fundamental para o país, é determinante para o nosso crescimento”, afirmou.
BE acusa Governo de estar “a brincar” e quer ministro no Parlamento
O BE pediu a audição no parlamento do ministro das Infraestruturas sobre as “notícias incompreensíveis” da construção de dois aeroportos a médio prazo, considerando que o Governo está “a brincar” com o país, o parlamento e o clima. “São muitas questões de notícias incompreensíveis que, a confirmarem-se, só nos levam a suspeitar de que o Governo está – e passo a expressão – a brincar com o país, a brincar com o parlamento com os compromissos que assumiu e a brincar com o clima”, disse aos jornalistas a deputada do BE, Joana Mortágua.
O partido pediu assim a audição do ministro da Habitação e das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, considerando que este governante “tem muitas explicações a dar” sobre estas notícia de hoje que “apanharam toda a gente de surpresa”. “Se é aquilo que se confirma, construir dois aeroportos a médio prazo é uma decisão que o país não pode compreender sobretudo quando estava em curso um estudo alargado sobre essa construção”, criticou, referindo-se à decisão de abandonar com a avaliação ambiental estratégica.
De acordo a deputada do BE, “vários órgãos de comunicação social divulgaram que o Governo teria decidido abandonar a avaliação ambiental estratégica que está em curso”, uma avaliação que resulta de “um compromisso do Governo com o parlamento e até de uma lei aprovada no parlamento” para “estudar e comparar várias localizações para o novo aeroporto”.
“As notícias dizem que a decisão seria começar de imediato a construção do aeroporto no Montijo, decisão em relação à qual o BE sempre se opôs por considerar que ela é um crime ambiental e também reconhecer que a futura localização do aeroporto da Portela, a longo prazo, é Alcochete. O Governo admitiria neste momento que a única solução para a estratégia aeroportuária do país a médio e longo prazo é Alcochete e ainda assim avançaria com o negócio da ANA no Montijo”, condenou.
PAN considera “inusitada e precipitada” nova estratégia para aeroporto
A porta-voz do PAN, Inês Sousa Real, considerou que a nova solução aeroportuária para Lisboa é “manifestamente inusitada e precipitada” e defendeu que a decisão deveria ser tomada “só após” a avaliação ambiental estratégica. “Parece-nos manifestamente inusitada e precipitada esta decisão do Governo”, afirmou Inês Sousa Real aos jornalistas na Assembleia da República, em Lisboa.
“Este é um claro exemplo daquele que era o receio em relação ao chamado rolo compressor da maioria absoluta, que claramente abriu aqui o caminho para uma opção que tem sido fortemente contestada pelas organizações não-governamentais do ambiente, pelos próprios órgãos reguladores, pelos municípios afetados e também pelos partidos da oposição”, defendeu Inês Sousa Real.
A líder do PAN acusou o Governo de “desrespeito pelos pareceres e a anunciada intenção de trazer um projeto de lei para reverter a possibilidade de as câmaras e de o parecer negativo das câmaras obstaculizarem a esta opção do aeroporto, neste caso com uma opção duplamente gravosa Montijo mais Alcochete”, mas também “pela resolução da Assembleia da República, pela decisão de recomendar ao Governo a realização de uma avaliação de impacto ambiental estratégico”.
“Para o PAN, era fundamental que esta avaliação fosse feita e que só após a avaliação de impacte ambiental estratégico fosse tomada uma decisão do Governo”, defendeu. Na ótica de Inês Sousa Real, “seria do mais elementar bom senso quando falamos tanto – ainda esta semana no âmbito da Conferência dos Oceanos – dos compromissos ambientais e o quão Portugal está comprometido em não penhorar o futuro das próximas gerações, aqui fica um exemplo claro do que não fazer”.
A deputada única disse que esta decisão é “passar por cima da avaliação ambiental estratégica e avançar para duas soluções” e alertou que o aeroporto no Montijo “tem espécies protegidas” e a pista poderá “ficar debaixo de água” com a subida do nível médio das águas.
PCP diz que nova estratégia do Governo “não é credível”
O PCP considerou hoje que a solução Montijo/Alcochete proposta pelo Governo para resolver a situação do aeroporto de Lisboa “não é credível” e insistiu na transferência faseada para o Campo de Tiro de Alcochete. “A confirmaram-se as notícias de que o Governo avançará com a construção do aeroporto no Montijo e posteriormente em Alcochete, gostaríamos de dizer, desde já, que não é credível e não é aquela que é a resposta necessária para o país”, sustentou a líder parlamentar comunista, Paula Santos, nos Passos Perdidos do parlamento.
A deputada comunista acrescentou que o investimento que vai ser feito para construir o aeroporto no Montijo implica a manutenção do da Portela durante mais tempo, o que significa “estar a perder mais tempo e a penalizar o país”. Na ótica do PCP, a única opção viável é a transferência faseada do Aeroporto Humberto Delgado para o Campo de Tiro de Alcochete e Paula Santos argumentou que esta ideia “ficou comprava nas audições realizadas na semana passada”.
“Houve um grande consenso [nas audições no parlamento], seja do Laboratório Nacional de Engenharia Civil [LNEC], da plataforma cívica, da Ordem dos Engenheiros, da Ordem dos Economistas na defesa da solução do novo aeroporto de Lisboa no Campo de Tiro de Alcochete”, completou.
Livre considera que decisão revela “desorientação”
O deputado único do Livre, Rui Tavares, considerou que a nova solução aeroportuária para Lisboa do Governo revela “uma certa desorientação”, defendendo que deve ser feita uma avaliação ambiental estratégica “sem localizações definidas”. “Parece-me que revela uma certa desorientação, é um voltar atrás em algumas garantias que tinham sido dadas da fidedignidade do processo”, afirmou Rui Tavares, em declarações aos jornalistas.
Para o Livre, deve ser feita “uma avaliação ambiental estratégica, sem localizações definidas, para fazer o que deveria ter sido feito em meio século de debate” e “que pode ser feito até 2023” de forma a manter “o prazo que tinha sido fixado”.
“É-nos dito que vamos para o Montijo no imediato, para depois poder ir para Alcochete. Isto numa altura em que até aqui na Assembleia da República, na comissão [parlamentar] de Economia têm ficado cada vez mais claros os impactos ambientais negativos da solução Montijo e os eventuais impactos ambientais positivos da solução Alcochete”, disse.
Segundo o deputado, “quando se diz que o aeroporto de Alcochete é muito caro, o próprio LNEC [Laboratório Nacional de Engenharia Civil] disse aqui na Assembleia da República que o que é caro é descontaminar os solos de Alcochete, coisa que provavelmente vamos ter que fazer se a diretiva quadro dos solos da União Europeia passar”. “Podemos ter os gastos à mesma e não ter o aeroporto”, acrescentou.
Para o deputado único do Livre, o Governo está “a trocar o certo pelo incerto” e a “avançar já com aquilo que do ponto de vista ambiental é negativo em troca de eventualmente, mais à frente, haver um aeroporto ambientalmente mais seguro”. “Ou seja, danificar já o ambiente para talvez no futuro fazer o aeroporto que seria a escolha ambiental mais certa”, disse.
“Não estamos a falar sobre aeroportos, estamos a falar em cogumelos porque agora aparentemente eles multiplicam-se com uma grande velocidade e é preciso sermos cautelosos, como aliás, com os próprios cogumelos, saber escolher bem”, ironizou ainda o deputado.
Decisão do Governo mostra “desrespeito ao Parlamento”, diz Chega
O presidente do partido Chega acusou o Governo de um “desrespeito muito grande” para com o Parlamento. Em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, em Lisboa, André Ventura afirmou que “havia um consenso com o parlamento” porque estava “um processo de avaliação ambiental em curso” que “foi acordado com o Parlamento”.
“É um desrespeito muito grande ao Parlamento que o Governo unilateralmente decida quebrar uma avaliação ambiental e decida simplesmente pelas suas próprias palavras e pelas suas próprias ações fazer o que acaba de acontecer”, criticou. Na ótica do líder do Chega, “a questão aqui não é qual a melhor localização, não é se podia ser o Montijo, se podia ser Alcochete, se podia ser Beja ou uma outra qualquer, a questão aqui é o desrespeito brutal que houve hoje pelo parlamento”.
André Ventura lamentou igualmente “que os partidos não tenham sido informados” e disse ter recebido pela comunicação social, e “com alguma surpresa”, esta notícia. “Desde logo porque tinha ouvido o senhor ministro das Infraestruturas em março do ano passado dizer que não era viável a opção de Alcochete e ouvi o senhor ministro no ano passado dizer que uma solução gradual para Alcochete não era viável”, sustentou.
Falando numa “aparente contradição”, Ventura disse que “das duas uma, ou Pedro Nuno Santos já não é o ministro das Infraestruturas ou então mudou de opinião a uma velocidade extraordinária para o novo aeroporto”.
“O Governo propõe na verdade dois aeroportos, um no Montijo primeiro e um em Alcochete depois, que era precisamente o que Pedro Nuno Santos tinha dito que não fazia sentido nenhum”, salientou, questionando “como é que um ano depois faz sentido” e se vai ser criada “uma terceira ponto sobre o Tejo para um aeroporto que é transitório para depois passarmos para Alcochete”.
E alertou que “provavelmente” o Estado terá de “pagar agora indemnizações” às “entidades que tinham vencido concursos internacionais na área da avaliação ambiental”.
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