Bruxelas quer compras conjuntas de pelo menos 15% do gás

A Comissão Europeia vai propôr aos Estados-membros a compra conjunta de gás, à semelhança do que aconteceu com as vacinas durante a pandemia. Energéticas vão poder operar enquanto consórcio.

A Comissão Europeia vai propor a compra conjunta de gás entre os 27 Estados-membros, à semelhança do que aconteceu durante a pandemia em que foram compradas vacinas anti-Covid. A medida foi apresentada esta terça-feira, por Ursula von der Leyen, durante uma conferência de imprensa que ocorreu depois de uma reunião do colégio de comissários, à margem da sessão plenária do Parlamento Europeu, em Estrasburgo.

Dessa reunião, saiu um documento no qual são apresentadas um conjunto de medidas para enfrentar a crise energética e a informação de Bruxelas vai permitir que os Estados-membros recorram à utilização de até 10% da dotação nacional total do Fundo de Coesão para 2014-2020, no valor total de cerca de 40 mil milhões de euros, para fazer frente à crise energética.

Segundo a presidente da Comissão Europeia, será proposta aos Estados-membros “uma participação obrigatória das empresas europeias na agregação da procura europeia para cumprir pelo menos 15% das respetivas metas de enchimento de armazenamento de gás”, indica Bruxelas, acrescentando que “as empresas seriam autorizadas a formar um consórcio europeu de compra de gás, em conformidade com as regras de concorrência da UE“, esclareceu a responsável. “Somos mais fortes quando agimos juntos”.

Segundo Kadri Simson, comissária da Energia, também presente na conferência de imprensa, os 15% são equivalentes ao consumo de gás de Portugal, Irlanda e da Finlândia, cerca de 13 milhões de metros cúbicos de gás. “É uma quantidade considerável”, frisou a responsável.

A decisão acontece numa altura em que o bloco europeu reforçou o fornecimento de gás oriundo de outros destinos, como Noruega, e reduziu o consumo de gás russo para menos de 9%. As reservas de gás do bloco para o inverno já ultrapassaram a margem de segurança de 90% relativamente às reservas de gás necessárias para este inverno, encontrando-se atualmente nos 92%.

Além das compras conjuntas de gás, será reforçada a cooperação entre os 27 Estados-membros, que, segundo von der Leyen, ainda estão longe do ideal. “Devíamos ter 40 acordos de solidariedade entre Estados-membros, e temos apenas seis”, revelou a líder do executivo comunitário.

Assim, em caso de escassez ou de “disrupção total no abastecimento de gás e eletricidade”, serão postos em prática novos acordos de solidariedade, com objetivos comuns a todos os Estados-membros e respetivas regiões, isto é, “desde de que não existam já acordos bilaterais de solidariedade”, esclareceu, e que têm como objetivo “partilhar gás com os países mais vulneráveis”.

Ainda no âmbito de garantir reservas suficientes de gás, a Comissão Europeia irá propor aos 27 Estados-membros que seja elaborado um “Alerta UE” caso as reservas de gás revelem ser insuficientes. Assim, e para reforçar a preparação para possíveis emergências, o executivo comunitário propõe também medidas que permitam aos Estados-Membros reduzir ainda mais o consumo não essencial para garantir o fornecimento de gás a serviços e indústrias essenciais.

Tal como a Comissária da Energia tinha já avançado na semana passada, será proposta a criação de um índice alternativo ao holandês TTF “por já não ser um reflexo do mercado europeu”. Durante a sua intervenção, von der Leyen explicou que o TTF foi criado para a transação de gás distribuído por gasoduto, “mas o mercado mudou, drasticamente, do gasoduto para GNL [gás natural liquefeito, tipicamente transportado por navios]”, explicou von der Leyen. Este novo índice deverá ser apresentado pela Agência de Cooperação dos Reguladores da Energia (ACER, na sigla em inglês) em março de 2023.

Até lá, a Comissão Europeia propõe a criação de um “corredor dinâmico e temporário” no TTF, isto é, a criação de um intervalo abaixo do valor de mercado dentro do qual oscilariam os preços do gás a serem negociados naquele dia. Este mecanismo temporário seria acionado “apenas quando necessário” e não iria permitir “transações com preço superior ao limite dinâmico”.

“[O limite] deve ser alto o suficiente para que o mercado funcione. E, abrangente o suficiente para cobrir os restantes índices a nível europeu”, explicou Ursula von der Leyen, acrescentando que os detalhes serão debatidos no próximo Conselho Europeu.

As medidas foram apresentadas esta terça-feira como parte de um segundo pacote de intervenção de emergência no setor energético, numa altura em que o mercado europeu assiste a uma grande volatilidade nos preços e a Rússia já não envia gás para a Europa. Apresentadas as propostas, segue-se agora o debate que acontecerá a 20 e 21 de outubro, dia em que os líderes dos 27 Estados-membros se reúnem em Conselho Europeu. Mais tarde, na próxima terça-feira, 25 de outubro, os ministros da Energia do bloco europeu voltam a reunir-se para uma discussão técnica.

Mecanismo ibérico vai ser avaliado a nível europeu

Como forma de mitigar os preços da eletricidade, que se contagiam pelo preço do gás, a Comissão Europeia vai propor aos Estados-membros que seja considerado a adoção do mecanismo ibérico para o resto do bloco europeu.

“É um mecanismo que está em vigor em Espanha e Portugal e acreditamos que deve ser considerado ao nível europeu”, afirmou Ursula von der Leyen, acrescentando que a estratégia merece “mérito”.

Segundo a presidente da Comissão Europeia, para já, ainda não é definitivo que a medida será adotada pelos restantes Estados-membros dado que “ainda estão por responder duas questões” essenciais para tornar o mecanismo operacional. Sendo que a primeira “significa que é necessário compensar entre o preço real e o preço máximo e esta compensação tem lugar através dos consumidores que utilizam o gás, o que funciona no ambiente nacional, mas se colocarmos isso num ambiente europeu teremos um apoio muito pouco equilibrado por parte dos consumidores de gás”, precisou.

Por outro lado, “o segundo tópico é basicamente o mesmo mecanismo pois uma vez que estamos bem interligados com os nossos amigos e vizinhos — Reino Unido, Noruega, Suíça, Balcãs Ocidentais, por exemplo — esta eletricidade barata também fluiria para lá e temos de ver como é que vamos resolver estas questões que ocorrem no seguimento disso”, adiantou Ursula von der Leyen.

Ressalvando que “os Estados-membros são diversos quando se trata dos seus cabazes energéticos e das ligações e sistemas de energia”, a Comissão Europeia defende, no âmbito deste novo pacote de medidas dada a atual crise energética, ser “necessário conceber uma solução que funcione para todos eles e que esteja de acordo com os objetivos mais amplos”, como os de “não aumentar o consumo de gás e gerir os fluxos para além das fronteiras da UE”.

Recorde-se que, desde meados de junho, que está em vigor um mecanismo temporário para limitar o preço de gás na produção de eletricidade na Península Ibérica até 2023. O mecanismo serve para colocar limites ao preço médio do gás na produção de eletricidade, a cerca de 50 euros por megawatt-hora, que foi solicitado por Portugal e Espanha em março passado devido à crise energética e à guerra da Ucrânia, que pressionou ainda mais o mercado energético.

(Notícia atualizada pela última vez 16h58)

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