Banco de Portugal tem almofada de quase 4 mil milhões para absorver perdas nos próximos anos

Subida dos juros pressiona resultados dos bancos centrais. Banco de Portugal tem quase quatro mil milhões de euros guardados para absorver prejuízos que espera ter nos próximos anos.

A subida das taxas de juro está a colocar os bancos centrais sob pressão. Alguns já apresentaram prejuízos de milhões e outros precisaram de capital do Estado para equilibrar a sua situação financeira. No caso do Banco de Portugal, ambos cenários estão afastados.

O governador Mário Centeno está “deitado” sobre uma almofada de quase quatro mil milhões de euros de provisões que serão usados para absorver os prejuízos nos próximos anos, tal como acabou de anunciar o Banco Central Europeu (BCE). Nestas circunstâncias, quem deverá “dormir pior” é mesmo o Estado, que deixará de receber dividendos durante algum tempo depois de um período de bonança.

Como o ECO revelou em fevereiro, o supervisor português terá obtido resultados operacionais superiores a 600 milhões de euros relativos ao exercício do ano passado. Um resultado que abre a porta à distribuição de dividendos – o Governo conta com um cheque de 240 milhões – como também permitiu um reforço das provisões para riscos gerais, com o banco central a apostar numa política de prudência face aos tempos de aperto que se avizinham.

Em 2021, estas provisões ascenderam a 3,68 mil milhões de euros, valor que se mantém há quatro anos. Esta almofada foi agora reforçada e está maior – duplicou em relação a 2007, como mostra o gráfico em baixo –, e será utilizada para anular os resultados negativos que se antecipam.

Almofada quase duplicou desde 2007

Fonte: Banco de Portugal

O mecanismo é relativamente simples: se o banco central tiver um resultado negativo de 100, utilizará 100 das provisões acumuladas para levar o resultado a zero, evitando assim um cenário de prejuízos. Por exemplo, foi o que o BCE acabou de fazer: libertou imparidades de 1,6 mil milhões para ter um resultado líquido nulo no ano passado. Caso contrário, teria registado prejuízos daquela grandeza.

Nestas circunstâncias, embora sem ter perdas, o Banco de Portugal deixa também de ter resultados distribuíveis, ou seja, não vai poder entregar dividendos ao acionista Estado nos próximos tempos. Na última década, seguiram do regulador da banca para os cofres públicos quase quatro mil milhões de euros em dividendos em função dos resultados muito positivos que registou. O ministro das Finanças, Fernando Medina, deixará de contar com esta receita para compor o seu orçamento.

O Banco de Portugal não está sozinho nestas dificuldades. Os outros bancos centrais estão na mesma situação de aperto. O Bundesbank teve prejuízos de 172 milhões de euros em 2022, registando o primeiro resultado negativo em quatro décadas. O Tesouro britânico transferiu 11 mil milhões de libras para o Banco de Inglaterra no passado para cobertura de perdas relacionadas com o programa de compra de títulos de dívida.

Fonte: Banco de Portugal

Se esta situação emergiu agora por causa da subida abrupta das taxas de juro para controlar a escalada da inflação, a verdade é que se apresenta como efeito de segunda ordem decorrente das políticas monetárias adotadas pelas autoridades monetárias nos últimos anos para animar a economia, incluindo no período da pandemia, em que foi preciso manter liquidez na economia para assegurar postos de trabalho e empresas, enquanto a economia esteve fechada.

No âmbito destas políticas não convencionais, os bancos centrais acumularam massivamente títulos de dívida pública com juros baixos. Isto permitiu aos governos financiarem-se nos mercados a custos baixos e terem dividendos generosos dos bancos centrais, que lucravam com a carteira de títulos.

O balanço do Banco de Portugal multiplicou por cinco entre 2007 e o ano passado, atingindo os 200 mil milhões de euros. Porém, o cenário de juros baixos inverteu-se no ano passado com a escalada da inflação. O disparo das taxas levaram os bancos centrais a pagarem juros mais elevados pelos depósitos de curto prazo dos bancos comerciais, e isto enquanto continuam a receber juros baixos dos títulos de dívida (de longo prazo) que adquiriram.

O chamado mismatch das taxas, que no passado funcionou a favor dos bancos centrais, está agora a passar uma pesada fatura, que está para durar. O Banco de Portugal vai continuar a sofrer com a disparidade das taxas de juro: enquanto os ativos renderão apenas cerca de 1%, o seu passivo vai-lhe custar mais de 3%. Traduzido em dinheiro, são muitos milhões de prejuízos em perspetiva.

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