Conselho Nacional de Educação com “reservas” sobre substituição de estágio por relatório
Governo quer que docentes com habilitação própria com, pelo menos, 4 anos de experiência possam substituir o estágio por um relatório. CNE avisa: prática de ensino supervisionada é "elemento-chave".
O Conselho Nacional de Educação (CNE) aprovou, ainda que sem unanimidade, a proposta de alteração do regime jurídico da habilitação profissional para a docência na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário, que está a ser negociada com os sindicatos do setor e que tem sido alvo de críticas. No entanto, o órgão consultivo do Ministério da Educação é bastante crítico da medida que visa que os docentes com habilitação própria com, pelo menos, quatro anos de experiência possam substituir o estágio pela defesa pública de um relatório individual.
Para combater a falta de professores, o Governo tem vindo a abrir a porta à contratação de professores com habilitação própria — isto é, com formação científica ainda não completada com a formação didática e pedagógica –, mas com este diploma, a tutela quer criar o regime definitivo para que estes docentes possam entrar na carreira.
Com este diploma continua a ser necessário ter, pelo menos, o grau académico de mestre para dar aulas no ensino pré-escolar, básico e secundário. Contudo, as condições mudam, nomeadamente no que respeita aos estudantes que terminaram a licenciatura nas áreas abrangidas pelo respetivo grupo de recrutamento (que corresponde à habilitação específica dar aulas a determinado nível de ensino e disciplina), bem como para quem tenha mestrado ou doutoramento nas aéreas também abrangidas pelo respetivo grupo de recrutamento.
O diploma prevê ainda que para os docentes com habilitação própria e que tenham, pelo menos, quatro anos de experiência de ensino no respetivo grupo de recrutamento, vão poder fazer a defesa pública de um relatório individual que abranja o período em que deram aulas ao invés de serem obrigados a fazer um estágio para entrarem na carreira.
Apesar de o parecer favorável, esta é aliás, uma das medidas mais criticadas pelo CNE, que avisa que um relatório “não substitui” a prática de ensino supervisionada. “Todavia, tendo em consideração que esta componente constitui um elemento-chave no desenvolvimento pessoal e profissional do professor, fundamental para a construção de um saber profissional, considera-se que um relatório sobre a prática docente não a substitui, pelo que o CNE vê com reservas a aplicação desta proposta”, aponta o organismo liderado por Domingos Fernandes, no preâmbulo do parecer publicado em Diário da República.
O órgão consultivo do Ministério da Educação realça ainda que o “Estatuto da Carreira Docente prevê como requisito para progressão a observação de aulas, reiterando a sua importância para o desenvolvimento profissional dos professores”.
Outra das novidades da proposta do Ministério da Educação é, por exemplo, o regresso dos estágios remunerados, sendo que os futuros professores vão passar a ser pagos em função do horário letivo que lhes for atribuído no estágio, com um mínimo de 12 horas letivas semanais. Neste caso, a remuneração mínima é de cerca de 800 euros brutos e pode chegar a 1.604,90 euros brutos.
De acordo com o preâmbulo do parecer publicado esta terça-feira em Diário da República, “o CNE reconhece a urgência e a importância das medidas previstas”, considerando que estas podem “contribuir para mitigar a falta de profissionais no sistema educativo”, dado que “apontam para uma maior flexibilidade no acesso aos cursos que conferem habilitação profissional para a docência, contemplam a remuneração no contexto do estágio e configuram o papel do orientador cooperante”.
Por outro lado, o órgão consultivo do Ministério da Educação “reconhece como positiva a reintrodução da prática de ensino supervisionada por professores mais experientes e qualificados, em articulação com as instituições de ensino superior”, bem como “regista com agrado” o aumento do número mínimo de créditos na componente de formação supervisionada, mas avisa que “o número de créditos da formação na área educacional geral é reduzido tendo em conta a latitude dos conteúdos que esta área integra e a sua relevância para a formação docente”.
Parecer aprovado sem unanimidade
Neste contexto, o CNE defende que as medidas propostas “podem contribuir para colmatar a falta de professores”, mas avisa que devem “salvaguardar-se as questões da quantidade e da qualidade, que são essenciais para o bom funcionamento do sistema educativo”. Ainda assim, o parecer não mereceu a aprovação de todos os conselheiros.
Maria Deolinda Marques Dias Martin, designada pelo grupo parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) votou contra, considerando “inaceitável” a possibilidade de admissão de professores “em qualificação profissional, apesar de após 4 anos, ser criado um mecanismo de reconhecimento dessa competência, um exame, como forma de se ultrapassar esta limitação”, lê-se. É “inaceitável porque seria impensável noutras áreas isto ser admissível: um médico nunca poderá exercer sem ter a formação adequada para o fazer, o mesmo acontece com enfermeiros, engenheiros, poderia citar imensas outras formações. Para a profissão docente é fundamental a formação científica, mas a pedagógica é que permite o trabalho diário de ensinar e aprender”, justifica.
Ao mesmo tempo, a antiga vereada do BE para a Câmara Municipal da Amadora alega que “houve milhares professores que ficaram no desemprego porque só tinham Habilitação Suficiente para a docência”, pelo que considera que a solução proposta “representa o retomar de algo que no passado criou muitos prejuízos quer aos docentes em causa, quer aos seus discentes”.
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